Considerando o recente fluxo de doações ao Rio Grande do Sul em resposta à situação de calamidade pública que afeta o Estado, é relevante tecer alguns comentários sobre o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

 

O artigo 155, inciso I, da Constituição, estabelece o sujeito ativo (“critério subjetivo”) desse imposto, ou seja, quem é competente para instituir o ITCMD. Nos termos do referido dispositivo, é dos estados e do Distrito Federal a competência para instituir o imposto e exigir o seu recolhimento.

 

Já o §1º, inciso II do mesmo dispositivo constitucional define o critério espacial, que corresponde ao local onde será devido o imposto. Conforme dispõe o §1º, inciso II, do artigo 155, o ITCMD é devido ao estado onde o doador tiver domicílio. Dessa forma, independentemente de onde se encontre o donatário, o imposto é devido ao estado de residência do doador.

 

A legislação de cada estado brasileiro determina quem é o contribuinte do imposto, seja o doador ou o donatário. No estado de São Paulo, a legislação define que o contribuinte é o donatário, se domiciliado em São Paulo, ou o doador, se o donatário residir fora do estado.

 

Antes de doar

 

Com efeito, é importante que, antes de realizar uma doação para o Rio Grande do Sul, o doador verifique a legislação do seu estado para determinar quem será o contribuinte do imposto, se ele próprio ou o donatário. Além disso, é importante verificar também as hipóteses de responsabilidade.

 

Em alguns estados, como São Paulo, o contribuinte é o donatário se este residir no estado, porém, se o donatário não cumprir a obrigação de pagar o imposto, o doador será responsável solidário. Já no Rio Grande do Sul, o contribuinte do imposto é o doador caso ele seja domiciliado no referido Estado, sendo atribuída responsabilidade solidária ao donatário.

 

A Constituição prevê a imunidade do ITCMD para doações feitas à União, estados, Distrito Federal e municípios, e a instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos.

 

Além disso, muitos estados adotam faixas de isenção para doação de dinheiro, bens ou direitos. O estado de São Paulo estabelece a isenção para qualquer tipo de bem (móvel ou imóvel), direitos ou valores de até R$ 88.400,04 por donatário (pessoa física ou jurídica) distinto. A legislação gaúcha, por sua vez, prevê isenção do valor de até R$ 3.454,676, bem como para doação de roupas, bens móveis e aparelhos de uso doméstico.

 

Por outro lado, alguns estados, como Rio Grande do Norte e Bahia, não possuem previsão legal de isenção para doações em dinheiro, bens ou direitos. Em relação a doações feitas por pessoas jurídicas brasileiras, para efeitos de apuração do lucro real, ressalta-se que são vedadas as deduções de despesas operacionais de doações em geral.

 

Há poucas exceções para a dedutibilidade de doações, sendo aplicáveis ao caso as doações efetuadas a entidades civis sem fins lucrativos que prestem serviços gratuitos em benefício de empregados da pessoa jurídica doadora ou em benefício da comunidade onde atuam, até o limite de 2% do lucro operacional.

 

Por fim, quando se trata de doações, ressalta-se que, em geral, o ITCMD deve ser pago no momento em que o ato ocorre ou contrato correspondente é celebrado.

 

Em tempos de calamidade pública no Rio Grande do Sul, a generosidade e a solidariedade são fundamentais. Diante do cenário atual, é essencial que os doadores compreendam as especificidades legais e tributárias do ITCMD e de suas obrigações acessórias, para garantir que suas doações sejam feitas conforme a lei, evitando surpresas tributárias indesejadas.

 

O que fazer

 

No Brasil, infelizmente, não há uma desoneração tributária abrangente para doações realizadas durante períodos de calamidade pública. Além disso, conforme mencionado, nem todos os estados brasileiros possuem previsões legais de isenção para doações de bens (móveis e imóveis), direitos e valores limitados até determinado limite.

 

Portanto, se o estado de domicílio do doador não prevê isenção para valores doados em dinheiro ou bens móveis, recomenda-se que essas doações, como dinheiro, roupas, calçados, alimentos e mantimentos, sejam direcionadas à União, estados, Distrito Federal, municípios, ou instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos, a fim de evitar a incidência do imposto.

 

Evidentemente que doações de pequeno valor, como roupas, calçados, alimentos e mantimentos são de difícil fiscalização pelos estados. Portanto, não se acredita que haverá esforço significativo nessa área, não apenas por questões humanitárias, mas também porque os custos de fiscalização superariam a própria arrecadação. O mesmo se aplica a doações monetárias de pequeno valor.

 

Cenário pós-reforma

 

É pertinente destacar que a reforma tributária, aprovada em dezembro de 2023, agora assegura uma não incidência mais abrangente do imposto. Nesse contexto, a Emenda Constitucional nº 132/2023 prevê a não incidência do ITCMD sobre as doações para instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos, observadas as condições a serem estabelecidas em lei complementar e não apenas para instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos. Com essa alteração legislativa, espera-se um incremento significativo nas doações, especialmente em situações de calamidade pública.

 

No entanto, a fim de estimular as doações em períodos de calamidade pública e proporcionar maior segurança jurídica aos doadores, entende-se ser de extrema importância a edição de uma Lei Complementar que estabeleça, em âmbito nacional, a não incidência do ITCMD sobre doações efetuadas em resposta a quaisquer calamidades públicas.

 

Fonte: Conjur

Deixe um comentário