Encontro evidenciou urgência de atualizar marco legal diante da crescente influência de plataformas na sociedade brasileira

Em audiência na manhã desta segunda-feira, 7, o CCS – Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional promoveu debate a respeito dos caminhos para a regulação das redes sociais no Brasil. No período da tarde, os trabalhos foram voltados à discussão sobre a regulamentação dos serviços de streaming.

A sessão também foi marcada pela despedida do presidente do Conselho, Miguel Matos. Ele ressaltou a importância do diálogo democrático como ferramenta fundamental para o fortalecimento das instituições e da liberdade de expressão.

Regulação das redes sociais

Miguel Matos abriu os trabalhos ressaltando que as redes sociais deixaram de ser simples ferramentas de lazer para ocupar papel central na reconfiguração das interações sociais. Segundo ele, plataformas digitais transformaram-se em arenas de disputas simbólicas, onde se travam batalhas pela atenção, pela verdade e, em última instância, pela realidade.

“As estruturas sólidas do passado já não sustentam as dinâmicas sociais contemporâneas”, observou, evocando o sociólogo Manuel Castells para destacar a centralidade da construção de significados no exercício do poder.

O presidente da Anatel, Carlos Baigorri, defendeu que o ambiente virtual passou a abrigar práticas nocivas como o bullying e o discurso de ódio, impulsionadas pela prevalência do anonimato. Para ele, essa realidade colide com o art. 5º da CF, que veda o anonimato justamente para garantir a responsabilização pelas manifestações.

Baigorri também criticou o art. 19 do Marco Civil da Internet, que limita a responsabilização dos provedores de conteúdo à exigência de ordem judicial. Segundo ele, isso cria um “ambiente de terra de ninguém”, onde a falta de obrigação de identificar os usuários alimenta a impunidade.

Na contramão da crítica, a coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil, Renata Mielli, defendeu a manutenção do art. 19, ainda que com distinções. Para ela, é preciso diferenciar os tipos de provedores: enquanto alguns apenas hospedam conteúdos, outros, como as redes sociais, atuam ativamente na modulação do alcance das postagens por meio de algoritmos opacos.

Mielli defendeu maior transparência das plataformas e alertou que os principais disseminadores de conteúdos nocivos geralmente não são anônimos – o que, para ela, revela falhas nos mecanismos de responsabilização vigentes.

Tulio Chiarini, pesquisador do Ipea, trouxe uma abordagem mais estrutural ao debate. Segundo ele, as redes sociais integram um fenômeno mais amplo de “plataformização”, no qual empresas privadas passam a controlar infraestruturas críticas como sistemas de pagamento, comunicação e inteligência artificial.

“Essas empresas impõem regras privadas com impacto direto na vida pública, sem qualquer transparência ou participação democrática”, alertou Chiarini, destacando o modelo de negócios baseado em vigilância e captação de atenção.

A audiência também abordou propostas para uma regulação mais eficaz e adaptável. Jamil Assis, diretor do Instituto Sivis, destacou o excesso de judicialização sobre o tema e defendeu uma abordagem legislativa baseada em microrreformas contínuas, com objetivos específicos – incluindo temas como responsabilidade civil e educação midiática.

Já a conselheira Maria José Braga reforçou a complexidade do desafio regulatório, que exige ações graduais e baseadas em consensos. Bia Barbosa, também do CCS, questionou os modelos propostos e a capacitação dos órgãos reguladores frente à magnitude das plataformas.

Despedida

A reunião também foi marcada pela despedida de Miguel Matos da presidência do CCS, em um discurso alinhado ao espírito do Dia do Jornalista.

Veja a fala:

O presidente evocou a memória de Líbero Badaró como símbolo da luta histórica pela liberdade de imprensa no Brasil e reforçou a importância de proteger os jornalistas como condição essencial para a democracia.

Miguel Matos destacou os principais temas debatidos nas 27 reuniões realizadas sob sua gestão, como remuneração de conteúdo jornalístico por plataformas, regulamentação de serviços de streaming, impactos da inteligência artificial no jornalismo e ações voltadas à saúde dos profissionais da comunicação.

Um relatório de gestão será publicado em formatos digital e impresso, consolidando os avanços do período. Ele também antecipou o envio de sugestões à presidência do Congresso Nacional para garantir a continuidade do trabalho do Conselho.

Criticando a radicalização do debate público e a polarização que substitui o argumento pelo ataque, defendeu a escuta e o respeito como fundamentos do entendimento coletivo. “Quem pensa diferente de nós não é, por definição, nosso inimigo”, afirmou.

Ao final, agradeceu aos conselheiros e reafirmou o papel do CCS como elo estratégico entre o Parlamento e a sociedade.

Fonte: Migalhas

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