PROCESSO Nº 2017/11316 – SÃO PAULO – CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO.
(42/2017-E)
NORMAS DE SERVIÇO DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA – Exclusão da obrigatoriedade de autorização judicial para expedição de certidão de nascimento de inteiro teor de pessoa adotada, desde que o pedido tenha sido formulado pelo próprio retratado no assento, que já tenha atingido a maioridade civil – Previsão de necessidade de autorização judicial para expedição de certidão de nascimento de inteiro teor, quando houver indício de concepção oriunda de relacionamento extraconjugal (art. 6º da Lei 8560/92), salvo se a pessoa retratada no assento de nascimento já faleceu e o pedido tiver sido formulado por um seu parente em linha reta – Itens 47.2.1 e 47.4 do Capítulo XVII, Tomo II, das NSCGJ.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,
Cuida-se de provocação oriunda do MM. Juiz Paulo Bernardi Baccarat, solicitando análise da conveniência de se dispensar autorização judicial para expedição de certidão de nascimento de pessoa adotada, quando ela própria, já maior, tiver formulado o pedido.
Nos autos em apenso, o MM. Juiz Assessor desta E. Corregedoria Geral da Justiça, Dr. Carlos Henrique André Lisboa, determinou abertura de expediente para análise da exclusão, no texto do item 47.4 do Capítulo XVII, Tomo II, das NSCGJ, da necessidade de autorização judicial para expedição de certidões de inteiro teor, quando houver indícios de que a concepção tenha sido resultado de relacionamento extraconjugal.
Vieram informações da ARPEN-SP e da Coordenadoria da Infância e da Juventude deste E. TJSP.
É o breve relato. Passo a opinar.
Dispõe o item 47.2.1 do Capítulo XVII, Tomo II, das NSCGJ:
“Nas hipóteses de adoção anterior ao Estatuto da Criança e do Adolescente, as certidões serão expedidas somente após autorização do Juiz Corregedor Permanente. E, nas situações de adoção disciplinada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, as certidões somente serão expedidas após autorização do Juiz da Vara da Infância e da Juventude.”
A norma guarda relação com o art. 95, parágrafo único, da Lei 6015/73:
“Serão registradas no registro de nascimentos as sentenças de legitimação adotiva, consignando-se nele os nomes dos pais adotivos como pais legítimos e os dos ascendentes dos mesmos se já falecidos, ou sendo vivos, se houverem, em qualquer tempo, manifestada por escrito sua adesão ao ato.”
“Parágrafo único. O mandado será arquivado, dele não podendo o oficial fornecer certidão, a não ser por determinação judicial e em segredo de justiça, para salvaguarda de direitos.”
Todavia, determina o artigo 48 do ECA:
“O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos.”
Há evidente descompasso entre as regras supramencionadas. Se a autorização judicial é prescindível para que o adotado, ao completar a maioridade, tenha irrestrito acesso aos autos da adoção e de seus incidentes, tampouco há de ser exigível para o menos, é dizer, para que obtenha apenas sua própria certidão de registro de nascimento.
Em comparação com o art. 95, parágrafo único, da Lei 6015/73, o art. 48 da Lei 8069/90 é mais específico e posterior.
Bastaria, pois, para que prevalecesse. Mas, ainda que assim não fosse, vige no Brasil a Convenção Internacional Sobre os Direitos da Criança, por força do Decreto 99.710/90. Diz o respectivo artigo 8º:
“1. Os Estados Partes se comprometem a respeitar o direito da criança de preservar sua identidade, inclusive a nacionalidade, o nome e as relações familiares, de acordo com a lei, sem interferências ilícitas.
2. Quando uma criança se vir privada ilegalmente de algum ou de todos os elementos que configuram sua identidade, os Estados Partes deverão prestar assistência e proteção adequadas com vistas a restabelecer rapidamente sua identidade.”
Obstar pronto acesso ao próprio registro de nascimento, mesmo que já adulto o postulante, significaria parcial privação de um dos elementos que configuram a identidade da pessoa, em detrimento do direito de conhecimento das próprias origens. Frisese que a Convenção recebe, no Brasil, força de norma constitucional, por conta do comando do artigo 5º, §3º, da Constituição Federal, como bem elucidado no substancioso parecer copiado a fls. 16/21, da lavra do Eminente Magistrado Eduardo Rezende Melo.
Desta feita, de rigor a alteração das NSCGJ, para que se faça despicienda a autorização judicial como condição para obtenção da própria certidão de nascimento de inteiro teor, ainda que haja qualquer alusão à origem da paternidade ou da maternidade registradas.
De outro bordo, dispõe o item 47.4 do Capítulo XVII, Tomo II, das NSCGJ:
“As certidões de registro civil em geral, requeridas por terceiros, ressalvados os dispostos nos artigos 45, 57, § 7º e 95 da Lei 6.015/73, serão expedidas independentemente de autorização do Juiz Corregedor Permanente.”
A atual redação do dispositivo em questão foi-lhe atribuída por ocasião do Provimento 41/12, que veiculou profunda alteração das NSCGJ. Pelo texto anterior, a menção a indícios de que a concepção adviesse de relação extraconjugal (art. 6º da Lei 8560/92) integrava o rol das hipóteses em que seguia sendo de rigor autorização judicial. O Provimento 41/12, porém, exclui do item aludido a referência à hipótese, criando dissenso acerca da necessidade da autorização judicial em casos tais.
É que o §2º do aludido artigo 6º da Lei 8560/92 segue prevendo a necessidade de ordem judicial para expedição de certidões de inteiro teor, sempre que, no registro, houver qualquer menção à origem extraconjugal da filiação.
“Art. 6° Das certidões de nascimento não constarão indícios de a concepção haver sido decorrente de relação extraconjugal.
§ 1° Não deverá constar, em qualquer caso, o estado civil dos pais e a natureza da filiação, bem como o lugar e cartório do casamento, proibida referência à presente lei.
§ 2º São ressalvadas autorizações ou requisições judiciais de certidões de inteiro teor, mediante decisão fundamentada, assegurados os direitos, as garantias e interesses relevantes do registrado.”
Por evidente, não terão as NSCGJ o condão de prevalecer sobre lei ordinária, de tal arte que, para obtenção de certidão de inteiro teor, quando configurada a hipótese do §2º do art. 6º da Lei 8560/92, segue sendo de rigor autorização judicial. Se assim é, igualmente razoável que a exceção volte a constar expressamente das NSCGJ, como forma de sepultar discussões acerca da matéria.
Apenas cabe ressalvar a prescindibilidade de autorização judicial para obtenção de certidão de inteiro teor de parente em linha reta, já falecido, ainda que existente alusão à origem extraconjugal da filiação. Deveras, morta a pessoa retratada no assento e tendo o pedido sido formulado por parente em linha reta, os interesses em conflito são a preservação da memória do falecido e o amplo acesso às origens familiares do postulante, ocasião em que aquela há de ceder passo a esta.
Propomos, desta feita, a alteração dos itens 47.2.1 e 47.4 do Capítulo XVII, Tomo II, das NSCGJ, conforme minuta que segue.
Sub censura.
São Paulo, 2 de março de 2017.
(a) Carlos Henrique André Lisboa
Juiz Assessor da Corregedoria
(a) Iberê de Castro Dias
Juiz Assessor da Corregedoria
(a) Swarai Cervone de Oliveira
Juiz Assessor da Corregedoria
(a) Tatiana Magosso
Juíza Assessora da Corregedoria
DECISÃO: Aprovo, pelas razões expostas, a edição do Provimento sugerido, conforme minuta apresentada, a ser publicado, juntamente com o parecer, por três vezes, em dias alternados, no DJE. Publique-se. São Paulo, 06 de março de 2017. MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS. Corregedor Geral da Justiça.
PROVIMENTO CGJ N.º 09/2017
Dispõe sobre a prescindibilidade de autorização judicial para expedição de certidão de inteiro teor de registro de nascimento de pessoa adotada, quando o pedido for formulado pela mesma pessoa descrita no assento, bem como sobre a necessidade de autorização judicial para expedição de certidão de inteiro teor de registro de nascimento de que constem indícios de a concepção resultar de relação extraconjugal – Altera os itens 47.2.1 e 47.4 do Capítulo XVII, Tomo II, das NSCGJ.
O DESEMBARGADOR MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, NO USO DE SUAS ATRIBUIÇÕES LEGAIS,
CONSIDERANDO a adesão do Brasil à Convenção Internacional Sobre os Direitos da Criança;
CONSIDERANDO a preocupação externada na aludida convenção acerca da preservação do histórico familiar de crianças adotadas, que têm direito de conhecer suas origens biológicas;
CONSIDERANDO a possibilidade de aquele que foi adotado na infância ou na juventude ter irrestrito acesso aos autos da adoção e do procedimento de destituição do poder familiar de seus genitores, independentemente de autorização judicial;
CONSIDERANDO o teor do artigo 6º, §1º, da Lei 8560/92, que prevê necessidade de autorização judicial para expedição de certidão de inteiro teor de assento de nascimento, sempre que houver indícios de a concepção ser resultado de relacionamento extraconjugal.
CONSIDERANDO o exposto e decidido nos autos do Processo nº 2017/00011316 – DICOGE 5.1;
RESOLVE:
Art. 1º – O item 47.2.1 do Capítulo XVII, Tomo II, das NSCGJ, passa a ter a seguinte redação:
“47.2.1. As certidões de nascimento de inteiro teor de pessoa adotada somente serão expedidas mediante autorização judicial, salvo se, já atingida a maioridade, o pedido tiver sido formulado pelo próprio adotado ou por seu representante legal. A competência para decidir acerca do pedido será do Juiz Corregedor Permanente ou do Juiz da Vara da Infância e da Juventude, conforme a adoção tenha sido, respectivamente, anterior ou posterior à vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente.”
Art. 2º – O item 47.4 do Capítulo XVII, Tomo II, das NSCGJ, passa a ter a seguinte redação:
“47.4. As certidões de registro civil em geral, requeridas por terceiros, ressalvados os dispostos nos artigos 45, 57, § 7º e 95 da Lei nº 6.015/73 e 6º da Lei nº 8560/92, serão expedidas independentemente de autorização do Juiz Corregedor Permanente. Nos casos do art. 6º da Lei nº 8560/92, prescindível autorização judicial sempre que o registro de nascimento for de pessoa já falecida e o pedido tiver sido formulado por um seu parente em linha reta.”
Art. 3º – Este Provimento entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as disposições em contrário.
São Paulo, 06 de março 2017.
MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS
Corregedor Geral da Justiça