Temos enfrentado, com frequência, aspectos relacionados com a formação, alteração e cancelamento, seja parcial ou total, do loteamento. Este breve estudo procurará destacar questões relevantes que, na maioria das vezes, já foram abordadas em precedentes normativos, de modo a tentar demonstrar os principais critérios utilizados e que decorrem do sistema adotado pela Lei nº 6.766, de 1979. Nem sempre é fácil resumir temas controversos, decorrentes de complexa legislação, mas a tentativa é válida para um norte mínimo ao operador do direito, que poderá alcançar conclusões mais profundas e, quiçá, mais adequadas.
1. O sistema da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979.
Para que se compreenda o sistema contido na Lei que regulou o parcelamento do solo urbano é preciso que dela se extraiam alguns princípios lógicos, notadamente quanto à formação, alteração e reversão do loteamento, já que o desmembramento apresenta aspectos diversos e que poderão ser analisados em outra oportunidade.
1.1 – A formação, a alteração e a reversão do loteamento.
A legislação que rege o parcelamento do solo urbano, além das diversas disposições urbanísticas, tratou explicitamente de sua formação, mediante o registro no cartório imobiliário, com a apresentação dos documentos exigidos e observância do procedimento a ser seguido, tudo com base nos artigos 18, 19, 20 e 21da Lei nº 6.766, de 1979.
No artigo 22, ficou explícito, em consonância com a disposição urbanística prevista no artigo 17, da mesma legislação, que as áreas públicas constantes do projeto e do memorial descritivo passam a integrar o domínio do Município.
A regra consagra o princípio da destinação, que pressupõe a oferta, pelo particular, e a aceitação, pelo Poder Público.
Todas essas disposições, porém, devem ser consideradas dentro de um contexto que inclui, também, o que se convencionou denominar de reversão do parcelamento e que prevê a possibilidade de seu cancelamento, conforme os termos previstos no artigo 23 e incisos da legislação.
Logo, dentro de um mesmo sistema normativo contemplou-se a forma de seu ingresso no mundo jurídico, com feição registrária, bem como as hipóteses de cancelamento.
Não se pode esquecer, também, a possibilidade do seu cancelamento parcial e a alteração do plano, dentro do mesmo contexto interpretativo, conforme explícita regulamentação prevista no artigo 28.
Esse regramento normativo trata de situações excepcionais que devem prevalecer sobre disposições gerais incidentes a respeito da aquisição e alienação de bens públicos.
1.2 – A Lei nº 6.766, de 1979, e a transitoriedade da incidência.
Um dos aspectos mais importantes para a exegese da complexa legislação sobre o parcelamento do solo urbano, especialmente quando trata de aspectos urbanísticos e registrários, diz respeito a transitoriedade da incidência.
A transitoriedade leva em consideração o período em que o loteamento está em formação, cessando quando se completa, por ter ocorrido sua implantação definitiva.
Como antes afirmado, o loteamento, após as aprovações urbanísticas, ingressa no registro para que se opere uma substancial transformação no imóvel. Este, único, objeto de uma matrícula, passa a ser parcelado, conforme o plano aprovado pela Municipalidade. Surgem os lotes e áreas públicas, que se constituirão em individualidades autônomas.
O loteamento nasce com as aprovações urbanísticas e com o formalismo registrário; implanta-se com a execução das obras de infraestrutura e venda dos lotes; e se exaure, em termos urbanísticos, quando as vias, praças e espaços livres, passam a integrar a cidade. Cumpre um ciclo, que termina quando ocorre essa integração. A partir daí, deixa de incidir a Lei nº 6.766, de 1979, quanto a determinados aspectos, principalmente o urbanístico, passando aquele núcleo a ser regido exclusivamente pelas normas que se aplicam à cidade.
Se assim não se entender, haverá inegável conflito entre as regras da lei do parcelamento e aquelas aplicáveis à cidade como um todo.
É por isso que temos defendido o entendimento de que a incidência da Lei nº 6.766, de 1979, é transitória.
O loteamento é um instrumento de urbanização. Embora as cidades possam surgir de outras maneiras, uma das principais decorre de parcelamento do solo urbano e, quando isso acontece, a legislação prevê as fases e o momento de sua integração à cidade.
Após as diretrizes iniciais e aprovações urbanísticas, o projeto submetido à Municipalidade deverá trazer, também, um cronograma anexo para a execução das obras mínimas de infraestrutura, a serem concluídas no prazo máximo de quatro (4) anos (artigo 9º).
Essa disposição precisa ser conjugada com o disposto no artigo 12, da mesma legislação, que trata da aprovação pela Municipalidade e, no seu parágrafo 1º, estabelece a pena de caducidade para os projetos não executados no prazo constante do cronograma.
Logo, esse é o prazo legal para a duração de um parcelamento durante a sua implantação.
Tanto isso é correto que as Normas de Serviço no item 187.1, Capítulo XX, exigem a fiscalização do Oficial para o prazo do cronograma e apresentação do termo de verificação da execução das obras – TVO.
Concluídas as obras e expedido o TVO, integra-se o loteamento à cidade. Até então, a responsabilidade pela execução e implantação definitiva das obras era apenas do loteador. Após a integração, passa ao Poder Público, podendo ser considerado o loteamento como finalizado em termos urbanísticos.
Logo, a conclusão é de que um loteamento não perdura indefinidamente. A conclusão das obras exigidas é o termo final de sua implantação urbanística. A partir daí, integra-se à cidade. Esta é governada por suas próprias leis, pelo plano diretor, onde houver, e pelas posturas locais.
É certo que as questões obrigacionais com os adquirentes têm parâmetros diversos quanto à incidência da Lei nº 6.766, de 1979, mas a parte urbanística se define com a entrega, pelo loteador, das obras que lhe cabiam, ao Poder Público Municipal.
A partir dessa interpretação fica bem mais lógico, fácil e razoável, entender os preceitos aplicáveis à formação, alteração e cancelamento, total ou parcial, de um loteamento.
1.3 – O cancelamento
O artigo 23 da Lei nº 6.766, de 1979, trata do cancelamento que poderá ocorrer por (I) decisão judicial; (II) a requerimento do loteador, com anuência da Prefeitura, “enquanto nenhum lote houver sido objeto de contrato”; e (III) a requerimento conjunto do loteador e de todos os adquirentes de lotes, com anuência da Prefeitura e do Estado.
O parágrafo 1º do mesmo artigo, estabelece que “a Prefeitura e o Estado só poderão se opor ao cancelamento se disto resultar inconveniente comprovado para o desenvolvimento urbano ou se já tiver realizado qualquer melhoramento na área loteada ou adjacências”.
Conforme a lição de Toshio Mukai, Alaor Caffé Alves e Paulo José Villela Lomar,
“… o § 1º atribuiu uma discricionariedade restrita à Prefeitura e ao Estado se opuserem ao cancelamento do registro do parcelamento. Poderão considerar inconveniente este cancelamento desde que o justifiquem e comprovem com base, unicamente, no prejuízo para o desenvolvimento urbano ou se já tiver sido realizado qualquer melhoramento na área loteada ou adjacências. Deverão fazê-lo com fundamento, seja na lei que tenha aprovado o plano de desenvolvimento integrado do município, seja em pareceres formulados por especialistas, tais como, urbanistas, sociólogos, economistas, sanitaristas, engenheiros e outros similares” (Loteamentos e Desmembramentos Urbanos – Sugestões Literárias – 1º edição – páginas 122/123).
Verifica-se, pois, que a legislação permitiu a desistência singela do loteador, enquanto nenhum lote tiver sido vendido ou, ainda, quando os adquirentes anuírem.
É fundamental, também, a anuência da Municipalidade ou, se for o caso, do Estado, que só poderão se opor mediante a comprovação de prejuízo a padrões urbanísticos, especialmente se obras já foram realizadas no local ou adjacências.
Como mencionado na lição doutrinária, trata-se de uma discricionariedade restrita, dependente de comprovação quanto aos eventuais prejuízos à cidade.
É interessante destacar que a legislação prevê um procedimento que culminará com a homologação pelo Juízo competente (parágrafos 2º e 3º).
Trata-se, pois, de regra excepcional e que se encerra com as exigências legais, sem necessidade de qualquer outra providência envolvendo o Poder Público, entre as quais pode-se mencionar a desafetação, exigida apenas para os casos que não envolvam parcelamentos em execução e, apenas, os já implantados.
Embora colocado em outro capítulo da Lei nº 6.766, de 1979, o artigo 28 trata, também, do cancelamento, agora parcial, mostrando uma similitude com a alteração do plano.
De qualquer modo, ao cancelamento parcial parecem aplicáveis as mesmas regras exigidas para o total, já que aquele é uma espécie do gênero.
1.4 – A alteração do plano de loteamento.
A alteração do plano em loteamento é disciplinada na Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, no artigo 28, cuja redação é a seguinte:
“Artigo 28 – Qualquer alteração ou cancelamento parcial do loteamento registrado dependerá de acordo entre o loteador e os adquirentes de lotes atingidos pela alteração, bem como da aprovação pela Prefeitura Municipal, ou do Distrito Federal quando for o caso, devendo ser depositada no registro de imóveis, em complemento ao projeto original com a devida averbação”.
Dois são os principais aspectos para a alteração do plano. Primeiro, a verificação sobre a existência de eventuais adquirentes de lotes, com contrato registrado, que tenham sido diretamente atingidos. Segundo, a natureza jurídica do ato que autoriza, em termos urbanísticos, essa modificação.
A alteração do plano deve seguir os mesmos trâmites do registro do parcelamento, ou seja, será objeto de requerimento do loteador, acompanhado do novo projeto aprovado pela Prefeitura, com as modificações pretendidas e das anuências dos adquirentes efetivamente atingidos.
O “caput” do artigo 18 da Lei nº 6.766, de 1979, exige que o projeto aprovado pela Prefeitura seja submetido ao registro imobiliário dentro de 180 dias (cento e oitenta dias), sob pena de caducidade da licença. Diz respeito à aprovação disciplinada no artigo 12.
A alteração do plano também deve ser aprovada pela Prefeitura, atendidos os requisitos das regras municipais incidentes. O Poder Executivo municipal expede o ato administrativo de aprovação com fulcro na legislação de regência, sem necessidade de participação do Poder Legislativo.
Essa conclusão decorre do mesmo raciocínio aplicado às demais hipóteses de reversão do parcelamento.
Se o cancelamento pode ser feito sem qualquer providência legislativa, com maior razão a mera alteração do plano já aprovado, ainda que se modifiquem o traçado e localização de áreas públicas.
Quem pode o mais pode o menos.
O que importa considerar é se incide, na espécie, o artigo 28 da Lei nº 6.766, de 1979, ou, ainda, se o loteamento está em execução.
Nesse caso, a anuência deverá ser apenas do Município quanto a eventual alteração de vias ou demais espaços públicos.
A análise desse aspecto tem provocado discussões, mas, “data vênia”, a melhor exegese está com aqueles que dispensam qualquer providência legislativa, como a desafetação, conforme passaremos a discorrer.
1.5 – A desafetação
Essa é uma questão tormentosa, mas que foi dirimida por diversos precedentes.
Se o loteamento já se exauriu em termos urbanísticos e se integrou à cidade, a alteração da destinação ou a alienação dos imóveis que passaram a ser públicos, como bens de uso especial ou uso comum, sempre dependerá de sua prévia desafetação.
Se, todavia, ainda não se completou o ciclo acima descrito, incidirá a lei especial. É dizer, se ainda não se completaram as obras de infraestrutura, estando em curso o cronograma previsto no art. 9º da Lei nº 6.766, de 1979, que é de 4 anos, as regras aplicáveis serão, justamente, as desta lei. E isto se dá principalmente em relação ao plano inicial do loteamento, para sua alteração e para a desistência, com o cancelamento do registro no Registro de Imóveis.
Se não fosse assim, as regras previstas nos artigos 23 e 28 seriam inócuas, pois, é sabido que o Poder Público sempre pode desafetar e alienar ou alterar a destinação de seus bens.
A lei não contém palavras inúteis e, por isso, a possibilidade de desistência do plano ou da sua alteração ainda ficam sob a regência da lei de parcelamento no período em que o loteamento não se completou e não se integrou à cidade. Dispensa desafetação e rege-se exclusivamente pelos dispositivos da Lei nº 6.766, de 1979.
Em artigo publicado na Revista de Direito Imobiliário nº 47, edição RT, no ano de 1999, já tivemos a oportunidade de abordar o tema. Nele defendemos que não existe “a necessidade de desafetação para a desistência, cancelamento ou alteração parcial do plano de loteamento. Não se pode esquecer que a Lei 6.766, de 1979, que contém normas de direito civil, registros públicos, urbanísticas e penais, foi editada com base na competência que a União Federal detém a respeito de tais matérias, sendo certo que poderia regulamentar, como efetivamente regulamentou, a possibilidade da passagem dos bens que relaciona ao domínio público e o retorno destes, total ou parcialmente, para o particular, nos casos de desistência, cancelamento ou alteração do plano de parcelamento”(pgs. 185/186).
Colacionamos trecho de parecer do saudoso jurista e professor Geraldo Ataliba, juntado ao processo nº 69/86, da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital, que, em recurso à Corregedoria Geral da Justiça, sob nº 86/86, deixou assentado que “pode-se, lógica e juridicamente, concluir: quem pode o mais pode o menos, ou, quem pode cancelar loteamento registrado e, conseqüentemente, desistir de sua implantação – sem autorização legislativa e prévia desafetação das áreas de uso comum do povo – pode, evidentemente, modificar loteamento registrado, sem autorização legislativa e prévia desafetação das áreas públicas de uso comum do povo. O menor (a modificação) está, necessariamente, contido no maior (o cancelamento)”.
Esse entendimento restou consagrado pela decisão do então Corregedor Geral, o saudoso Desembargador Sylvio do Amaral, em 20 de julho de 1987, e se constituiu, praticamente, no primeiro precedente específico sobre o tema.
Aliás, se, pelo artigo 22 da Lei nº 6.766, de 1979, as áreas públicas e vias de circulação só passam ao domínio público, formalmente, com o registro, do mesmo modo, a alteração de sua destinação será, igualmente, operada no Registro de Imóveis, por meio do procedimento previsto no artigo 23, que exige mera anuência da Municipalidade, sem necessidade de desafetação, apenas para os loteamentos ainda não implantados.
Os precedentes normativos não cessaram e colacionamos, por relevante, memorável parecer proferido no processo C.G. nº 945/95, pelo então Juiz Auxiliar da Corregedoria, atualmente Desembargador, Dr. Marcelo Martins Berthe, que tratou do tema e distinguiu entre o loteamento implantado e não implantado, reportando-se, ainda, a outro precedente, mais antigo (Proc. C.G. nº 925/94), que também abordou a questão concluindo que os artigos 23, III, e 28, que cuidam do cancelamento total e parcial, bem como da alteração do plano, só podem ser aplicados, sem desafetação, enquanto o parcelamento estiver em execução e ainda não implantado.
Em trecho elucidativo afirmou que:
“A desafetação, por ato do Poder Legislativo, como reclamada no recurso, só teria cabimento depois, ‘num segundo tempo’, quando implantado o loteamento. Nesse caso a simples concordância do loteador e proprietários que fossem atingidos, associada à aprovação da Prefeitura Municipal já não mais seria suficiente, porque ‘consumada aquisição do domínio público’ sobre aqueles bens, a partir de sua implantação e consequente ‘destinação dos bens ao uso comum do povo’. Na verdade, é lícito afirmar que a aquisição do domínio se dá com o registro, mas ‘tem eficácia pendente da implantação do loteamento’. Ou por outra, a esse evento está vinculada”.
Incursiona pelo magistério do sempre saudoso Hely Lopes Meirelles que distingue o ato administrativo consumado do pendente, incluído o de registro, concluindo, no exaustivo estudo contido no precedente que:
“Vê-se, pois, que se passível de cancelamento (total ou parcial), ou de modificação, enquanto não implantado o loteamento, será o registro um ‘ato administrativo pendente’, que só produzirá efeitos após a implantação, quando, então, efetivamente, os bens destinados ao uso público ingressarão no patrimônio municipal, quer porque já não mais possível modificar ou cancelar o loteamento, quer porque haverá a ‘destinação desses bens ao uso comum do povo” (Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça- 1995 – Ed. RT – Coordenador – Des. Antonio Carlos Alves Braga – páginas 134/135).
Aliás, o parágrafo único do artigo 22, da Lei nº 6.766, de 1979, acrescentado pela Lei 12.424, 16.6.2011, utilizou essa mesma terminologia quando se referiu ao parcelamento implantado e não registrado, conferindo, nesse caso, ao Município, o direito de providenciar a passagem das áreas públicas ao seu domínio.
Nítida, pois, a diferença entre loteamento em execução e aquele já implantado, bem como a incidência da Lei nº 6.766/79 ao primeiro, ao passo que a regra normal, com exigência de desafetação, ao segundo.
Destarte, tais precedentes, abonam, “data vênia”, as nossas conclusões a respeito do tema.
1.6 – Os adquirentes de lotes
A singela leitura do dispositivo legal pertinente permite concluir que a lei não exige anuência de todos os proprietários de lotes.
Claramente, a lei exige acordo entre o loteador e os adquirentes dos lotes atingidos pela alteração (art. 28).
A lei fala em adquirentes dos lotes diretamente atingidos pela alteração. Cuida de proteger os adquirentes das alterações materiais que os lotes possam sofrer, por iniciativa do loteador. Se o lote não sofre nenhuma modificação, isto é, se o lote não é atingido pela alteração, seu adquirente não tem interesse na alteração do plano.
Tratando desse assunto, obra recente sobre o parcelamento do solo mostra que a interpretação da lei deve seguir critérios razoáveis e de bom senso. Não pode, a pretexto de impedir ofensa a direitos, conduzir à imutabilidade do plano. A lógica do dispositivo demonstra que, se existe possibilidade de alteração, ela não pode depender de providências impossíveis ou de difícil realização.
Em “Como Lotear uma Gleba” (Editora Millennium, 2ª ed., Campinas, 2003), que escreveu junto com seu pai, Vicente Celeste Amadei (que se encarregou dos aspectos não jurídicos), o culto desembargador paulista Vicente de Abreu Amadei adota nosso antigo entendimento (RDI-47/183): “uma primeira distinção há que ser feita, vale dizer, entre a influência direta e o prejuízo potencial. Quando houver direta repercussão quanto ao lote, inegável a necessidade da anuência de seu proprietário, como, por exemplo, nos casos de se alterar o traçado de uma rua, tornando-a sem saída, a supressão de uma praça ou área verde que com ele confine etc. Dificuldade maior se apresenta quando a repercussão for indireta, ou seja, a modificação de ruas em outro extremo do loteamento, a diminuição das dimensões dos lotes etc. A expressão lotes atingidos pela alteração deve ser entendida de forma inteligente e não pode abranger, de maneira absoluta, toda e qualquer modificação, sob pena de inviabilizar o próprio permissivo legal”.
No parecer colacionado como precedente o tema também foi abordado, quando também se prestigiou nosso entendimento anterior:
“Parece claro que a lei condiciona a alteração à anuência de todos os adquirentes que por ela possam ser atingidos, dispensou, inegavelmente, o chamamento de outros interessados por editais. Assim, o adquirente que é atingido deve anuir; em caso contrário nenhum interesse terá’. E com essas premissas, conclui como segue: ’O cerne da questão está, justamente, em se aquilatar até que ponto a alteração ou cancelamento parcial interferem com os adquirentes. Essa análise será feita, em primeiro lugar, pelo Oficial Imobiliário e depois, se houver inconformismo, por seus superiores hierárquicos”(Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça- 1995 – Ed. RT – Coordenador – Des. Antonio Carlos Alves Braga – página 136).
Interpretar extensivamente o art. 28, de forma a dele extrair que todos os proprietários de lotes precisam dar anuência, é engessar o plano; é impedir o que o mesmo dispositivo quer permitir.
Há que se considerar que algum adquirente sempre poderá negar imotivadamente a anuência, ou poderá, simplesmente, não ser encontrado.
Ademais, conforme precedente da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, a expressão “concordância dos adquirentes atingidos”, prevista no art.28, abrange apenas aqueles que sofrem prejuízos patrimoniais ou não, imediatos e mediatos, presentes ou potenciais, desde que plausíveis e objetivos (Processo C.G. 713/97 – parecer do hoje desembargador Francisco Eduardo Loureiro – 4.6.97).
Assim, a anuência dos titulares de domínio das quadras diretamente atingidas atende à parte final do artigo 28, porque eles, e somente eles, são os diretamente atingidos.
E para saber quem são os adquirentes atingidos, bastará recorrer à matrícula em que registrado o loteamento, cuja certidão apontará os titulares dos contratos registrados. Apenas estes devem ser considerados.
2. CONCLUSÃO
Destarte, para o cancelamento, seja parcial ou total, ou, ainda, para a alteração do plano de loteamento, não há necessidade de desafetação, bastando a mera aprovação da Municipalidade ou do Estado, respeitados os eventuais direitos dos adquirentes diretamente atingidos, conforme o caso.
Aplicam-se aos loteamentos ainda em execução ou, melhor dizendo, ainda não implantados, as disposições específicas da Lei nº 6.766, de 1979.
A expedição do termo de verificação de obras – TVO servirá como parâmetro final à fase de execução.
Só depois da integração será exigível a prévia desafetação para alteração da destinação de espaços que se tornaram públicos com o registro do parcelamento, como bem distinguiram os precedentes normativos e lições doutrinárias colacionadas.