Questões Patrimoniais
 
No dia 16 de junho, o XXII Congresso Notarial Brasileiro, ocorrido em João Pessoa (PB), teve início com o painel sobre Questões Patrimoniais do Direito de Família. Para compor a mesa, foram convidados o presidente da Academia Notarial Brasileira (ANB), Ubiratan Pereira Guimarães; a juíza no estado do Rio de Janeiro, ex-conselheira do CNJ autora de “A vida não é justa” e “Segredo de Justiça”, adaptados para o seriado de televisão exibido no programa Fantástico da TV Globo, Andréa Pachá; o tabelião no estado do Pará (PA) e ex-assessor especial da comissão que redigiu a Constituição de 1988, Zeno Veloso; e a assessora jurídica do CNB/CF e vice-presidente da Comissão de Notários e Registradores do Ibdfam, Karin Regina Rick Rosa.
 
Em exposição sobre o tema, a juíza Andréa Pachá discutiu como a sociedade chegou ao ponto em que a administração das rupturas têm se tornado algo cada vez mais complexo. Para ela, a ritualização do casamento também deve ser respeitada quando chega ao seu fim. “É uma redução de danos: não há divórcio sem perdas”, afirmou. “Muito mais frustrante é perceber que o projeto coletivo não sobrevive individualmente”.
 
Ela ainda defende que o divórcio extrajudicial não deveria ter impedimento com a existência de filhos menores. “As pessoas são adultas e nós não podemos continuar tutelando ou infantilizando a sociedade da maneira como é feita”, argumentou. “Nós temos judicializado o humano e isso não é um modelo de sociedade e nem de justiça sustentável. Dificilmente suplantará a dor”.
 
Em seguida, o tabelião Zeno Veloso expôs os diversos casos que acompanha no dia a dia de sua serventia para ilustrar a falta de conhecimento da população sobre os regimes de bens existentes. “Hoje no Brasil é possível a alteração do regime de bens. No entanto, somente no âmbito judicial. Certamente isso deveria seguir em vias extrajudiciais”, opinou. Ele ainda ressaltou o atraso do País em relação à garantia dos direitos homoafetivos. “Nós somos um dos poucos Países ocidentais sem legislação sobre o assunto”.
 
Usucapião Extrajudicial
 
O segundo painel do Congresso, que contou com o presidente do CNB/CF, Paulo Roberto Gaiger Ferreira; com a tabeliã de notas do estado do Rio de Janeiro, Virginia Arrais; e com o acadêmico da ANB, Luiz Carlos Weizenmann; tratou do tema Usucapião Extrajudicial.
 
Com a palavra, Paulo Gaiger mostrou o passo a passo da realização de uma ata de usucapião extrajudicial realizada por um notário, exibindo como base um documento mais completo que o exigido por lei. “Se o tabelião tiver certeza de que aquela posse é mansa, pacífica e contínua, ele vai atestar”, defendeu. “Como a ata notarial é instrumento sacramental, se o tabelião não atestar o tempo de posse, o registrador não deve fazer o registro. Só assim é possível atribuir a qualidade possessória”.
 
Já Luiz Carlos Weizenmann tem uma percepção distinta sobre este ponto. “Eu tenho uma resistência muito grande em recepcionar isso como ‘atestar posse’ em razão de que a posse é um fato passado”, justificou. “A expressão ‘atestar a posse’ é muito forte pois passa a ideia de que o tabelião tem absoluta certeza de que aquela posse realmente existe há tanto tempo”.
 
Para ele, é fundamental a uniformização do serviço de usucapião extrajudicial pela classe. Por isso, sugeriu que o Colégio Notarial editasse um roteiro de procedimentos para todo o País. “Além disso, sentar com os dirigentes das entidades para que não ocorra nenhum tipo de absurdo no procedimento”.
 
Em seguida, a tabeliã Virginia Arrais frisou que o notariado precisa ter conhecimento das diversas espécies de usucapião existentes. “Eu gostaria de frisar que o notariado brasileiro é mais uma vez desafiado a conhecer profundamente o Direito Material, assim como fomos desafiados a conhecer o Direito Sucessório”, iniciou. Ela defende que a ata notarial deve atestar circunstâncias que se relacionem com os pressupostos da modalidade de usucapião requerida pela parte. “Se não conhecermos essas espécies, não teremos condição alguma de atestar e fazer essa ata”.
 
Além disso, a palestrante destacou que há inúmeras causas impeditivas da usucapião que devem ser observadas pelos notários no momento da lavratura do ato. “Eu acredito que devemos nos ater a isso. Pois se é uma causa impeditiva e eu tenho que atestar a posse, eu tenho que ver se não é impeditivo para eu atestar a minha posse”, reforçou.
 
Paulo Gaiger finalizou o painel se comprometendo, em nome do CNB/CF, a disponibilizar minutas da usucapião extrajudicial tão logo a lei seja sancionada. “A intenção é disponibilizar uma média de dez modelos por mês, até que tenhamos todas as opções. A utilização não será obrigatória, é apenas uma sugestão”, enfatizou.
 
Apostilamento
 
O último painel do XXII Congresso Notarial Brasileiro teve mesa formada pelo juiz auxiliar da Corregedoria Nacional da Justiça, Márcio Evangelista Ferreira da Silva; pelo presidente do CNB/DF, Hércules Alexandre da Costa Benício; pelo presidente do CNB/CF, Paulo Roberto Gaiger Ferreira; pela presidente do CNB/BA, Emanuelle Ourives Fontes Perrota; e pela diretora do CNB/SP, Jussara Modaneze.
 
Abrindo a discussão, o juiz Marcio Evangelista Ferreira, coordenador da equipe responsável por apostilamento na Corregedoria Nacional de Justiça, relatou que tem recebido uma média de 800 a 900 reclamações por mês do setor extrajudicial nos últimos três meses. “Tivemos problemas no cadastramento de 17 mil serventias, cada uma com uma média de 5 colaboradores. Foi uma dificuldade técnica mesmo, por isso a demora. Após 3 meses de problemas, publicamos o provimento [Provimento n° 58/2016 do CNJ]. Há erros mas vamos corrigindo. Provavelmente publicaremos um novo provimento, trazendo, entre outros tópicos, esclarecimentos sobre as atribuições de cada especialidade para o serviço”, explicou. “O apostilamento veio para trazer a desburocratização dos documentos e o acesso direto à população”.
 
Os apostilamentos foram facilitados pela adoção da Convenção sobre a Eliminação da Exigência de Legalização de Documentos Públicos Estrangeiros, conhecida como Convenção da Apostila da Haia, que passou a valer no dia 14 de agosto de 2016. Até agosto de 2017 já foram realizados 800 mil documentos do tipo no Brasil – motivo pelo qual o juiz considera o serviço como exitoso. “Enquanto os outros atos notariais refletem apenas internamente, o apostilamento tem reflexo internacional. Por isso, esse serviço deve ter credibilidade internacional. Temos que ter uma segurança muito boa em sua realização”, defendeu. “Se nós começarmos a apostilar todos os documentos que aparecerem cairemos em descrédito. Precisamos padronizar o apostilamento para que se crie credibilidade.
 
O presidente do CNB/DF, Hércules Alexandre da Costa Benício, questiona se em um mundo com tantas outras formas de aferição o papel físico é ainda necessário. “Já passou da hora de despapelizar! Temos que ter maior musculatura tecnológica”, sugeriu, vislumbrando como isso poderia ser feito por meio de tablets. Por fim, a diretora do CNB/SP e primeira notária a realizar o apostilamento extrajudicial no Brasil, Jussara Modaneze, destacou os passos a serem seguidos para a realização do serviço, além de sanar dúvidas sobre dificuldades envolvendo o tema. “O mais importante é verificar a autenticidade do documento em questão”, elucidou.