“O fim de uma relação amorosa deve estimular a independência de vidas e não, ao contrário, o ócio, pois não constitui garantia material perpétua. O dever de prestar alimentos entre ex-cônjuges ou companheiros é regra excepcional que desafia interpretação restritiva, ressalvadas as peculiaridades do caso concreto, tais como a impossibilidade de o beneficiário laborar ou eventual acometimento de doença invalidante.”
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial para exonerar o ex-marido de continuar pagando pensão alimentícia em dinheiro à ex-mulher.
Após o fim do relacionamento, ele foi condenado a arcar mensalmente com o valor de 4,7 salários mínimos a título de pensão alimentícia, sendo três salários em dinheiro e 1,7 salário mínimo correspondente à metade do valor do aluguel do imóvel comum, ainda não partilhado, que é utilizado exclusivamente pela ex-companheira.
Sentença e acórdão
Na ação de exoneração de alimentos, a alteração da condição financeira da mulher e o fato de ela já ter iniciado uma nova relação afetiva serviram como fundamentos para a interrupção da obrigação.
Em primeira instância, o juiz reconheceu o aumento das possibilidades financeiras da ex-companheira e dispensou o pagamento em dinheiro, mantendo a pensão em 1,7 salário mínimo, na forma de ocupação exclusiva do imóvel comum. No caso de desocupação do imóvel, a importância equivalente à metade do aluguel deveria ser paga em espécie.
O Tribunal de Justiça, no entanto, restabeleceu integralmente a obrigação alimentar por entender que não teria sido comprovada a constituição de união estável entre a mulher e seu novo namorado e que o aumento nos seus vencimentos visava garantir o poder aquisitivo e não representou ganho salarial.
Temporário
O relator do recurso especial, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que o entendimento do tribunal de origem destoa da jurisprudência do STJ sobre o caráter temporário da pensão alimentícia.
Citando julgado da ministra Nancy Andrighi, Villas Bôas Cueva afirmou que os alimentos devidos a ex-cônjuge devem apenas assegurar tempo hábil para sua “inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, que lhe possibilite manter, pelas próprias forças, status social similar ao período do relacionamento”.
“No caso dos autos, pode-se aferir a plena capacidade da recorrente para trabalhar, tanto que se encontra empregada, atual realidade da vida moderna. Assim, impõe-se a exoneração gradual da obrigação alimentar, independentemente da qualificação da nova relação amorosa da alimentanda, na forma posta na sentença”, acrescentou o ministro.
Exoneração
Villas Bôas Cueva lembrou ainda que, conforme estabelecido em precedente da Segunda Seção do STJ, o fato de a ex-mulher residir sozinha no imóvel – já que a partilha está sob pendência judicial – garante ao ex-marido o direito de receber aluguel pelo uso privado do bem comum.
Foi determinada, então, a exoneração do pagamento da pensão em dinheiro, em razão do uso privado da residência e das demais circunstâncias do caso, e especialmente porque, conforme destacou o relator, a ex-mulher já recebeu o auxílio por quase uma década.
Na hipótese de desocupação do imóvel, o pagamento do valor de 1,7 salário mínimo deverá ser feito em espécie, mas apenas até partilha, data em que o homem ficará definitivamente exonerado de qualquer obrigação alimentar.
Villas Bôas Cueva ressalvou a possibilidade de a recorrida, caso necessite, formular novo pedido de alimentos direcionado a seus familiares, uma vez que “o ordenamento pátrio prevê o dever de solidariedade alimentar decorrente do parentesco (artigos 1.694 e 1.695 do Código Civil)”.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.