O processo para regularizar propriedades por meio do usucapião foi alterado pela Lei 13.465/2017. Entre as principais mudanças está a previsão de que o silêncio do antigo proprietário da terra será interpretado como concordância ao pedido de posse do usuário da área.
 
Pela nova lei, se a planta ou a matrícula do imóvel não tiverem a assinatura do titular de direito, ele será notificado para manifestar consentimento expresso em até 15 dias. Se a pessoa não for encontrada, a notificação será feita por edital.
 
Se, depois de citado, o dono da terra não se manifestar, seu silêncio será entendido como anuência ao usucapião.
 
Caso não haja qualquer manifestação nesse período, o silêncio será considerado concordância e o imóvel ficará liberado para receber nova matrícula. Para Luis Rodrigo de Almeida, sócio do Viseu Advogados, essa mudança corrige uma falha existente na norma anterior.
 
“De acordo com o artigo original do Código de Processo Civil, que alterou a Lei de Registros Públicos, se fazia necessário citar os antigos proprietários do imóvel usucapiendo para concordância ou não com o pedido de usucapião. Até a promulgação da nova lei, caso esses antigos titulares não fossem localizados ou não se manifestassem, seria considerado como rejeição ou discordância ao pedido de usucapião”, afirma.
 
Segundo Leandro Mello, sócio do Braga Nascimento e Zilio Advogados e coordenador do Departamento Imobiliário da banca, esse é o meio mais rápido para obter usucapião em situações em que não há indício de disputa da área. Ele explica que antes dessa norma, a legislação previa que os “titulares de direitos reais” deveriam ser citados para se manifestarem e, mesmo no silêncio destes, a usucapião não era autorizada.
 
“Agora, uma vez notificado para se opor e sem que haja oposição expressa, o oficial do cartório de imóveis poderá prosseguir com o registro de aquisição do imóvel com as descrições apresentadas”, afirma o advogado.
 
Nathaly Veras, coordenadora de processos estratégicos do Nelson Wilians e Advogados Associados, pondera que, mesmo com a previsão em lei, eventuais nulidades de notificações podem ser questionadas no Judiciário. “Contudo, atualmente a regulamentação da usucapião extrajudicial torna-se muito mais eficaz do que estipulava a redação do anterior dispositivo legal.”
 
Bruno Palheta, também do Nelson Wilians e Advogados Associados, afirma que a anuência automática em caso de silêncio do proprietário do imóvel é controversa e pode desaguar em processos no Judiciário. “Porém, exigir a referida anuência vulnera, inclusive, o próprio instituto da usucapião, ao ponto de descaracterizá-lo”, pondera.
 
Condomínios e meio rural
 
A nova lei definiu, ainda, que, caso o imóvel a ser registrado, seja unidade autônoma de condomínio, bastará a notificação do síndico, sem a necessidade de notificar todos os demais condôminos. “Os cartórios do estado de São Paulo, com base nas normas da corregedoria [Provimento 58/2015], já vinham aceitando esse entendimento, mas o texto da nova lei resolve definitivamente a questão, simplificando e agilizando a regularização de propriedade através da usucapião extrajudicial”, conta Almeida
 
Especificamente sobre usucapião extrajudicial no campo, onde intimações são mais difíceis de serem feitas, Mello destaca que, apesar disso, cabe ao interessado na regularização fornecer todas as informações dos possíveis proprietários da área usucapida. “Inclusive, o acompanhamento do interessado no ato da citação é providência essencial para a garantia do ato, pois este pode auxiliar o oficial de justiça a localizar àqueles que se pretendem citar ou intimar.”
 
Já Guilherme de Souza Mendes, do Wambier, Yamasaki, Bevervanço, Lima e Lobo Advogados, entende que essas intimações não serão problema no meio rural. Segundo ele, o parágrafo 2º do artigo 216-A da Lei 6.015/73 é claro ao estabelecer que o silêncio será interpretado como concordância apenas nos casos em que o proprietário do imóvel em questão seja regularmente intimado.
 
“Situações em que envolvam nulidade na notificação e o Usucapião for reconhecido, podem ser impugnadas judicialmente, independente se a propriedade foi reconhecida pela via administrativa ou judicial (procedimento até então mais conhecido)”, afirma o advogado.
 
Atualização necessária
 
Nathaly Veras, coordenadora de processos estratégicos do Nelson Wilians e Advogados Associados, explica que a nova lei foi editada para por conta dos problemas registrados nas regras anteriores, implementadas em 2015. “Ressalta-se que ainda é necessário a usucapião judicial para os casos que não estejam no rol dos requisitos alinhavados na legislação atual vigente”, destaca a advogada.
 
Um exemplo disso é citado por Cintia Martins, advogada do Chiarottino e Nicoletti Advogados, afirma que a delimitação legislativa sobre o silêncio veio para preencher uma lacuna percebida só depois que as normas anteriores passaram a ser aplicadas. “Como muitas vezes o possuidor do imóvel usucapiendo não conhece o paradeiro do antigo proprietário, tornando impossível a obtenção desta anuência, os interessados se viam obrigados a se socorrer do Poder Judiciário. Ou seja, o procedimento de usucapião extrajudicial, não raras vezes, não conseguia atingir a sua finalidade, havendo necessidade de intervenção judicial.”
 
Já Luis Rodrigo de Almeida elogia trecho da lei que permite o reconhecimento da posse do imóvel por meio de procedimentos administrativos. “É um grande benefício. A produção de provas relacionadas ao tempo e natureza da posse poderão ser apuradas, avaliadas e certificadas também pela via administrativa, obedecendo, no que couber, à via judicial de produção antecipada de provas”, destaca.
 
“A redação da lei antiga praticamente inviabilizava a efetiva regularização da propriedade e aquisição originária do imóvel através da via extrajudicial. Agora, com a nova previsão legal, o procedimento administrativo para usucapião de imóveis não exigirá mais a anuência ou concordância dos titulares de direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes”, complementa.
 
*Brenno Grillo é repórter da revista Consultor Jurídico.