No dia 27 de novembro, o Espaço Ética, com apoio institucional do Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo (CNB/SP), realizou o 2° Encontro sobre Ética nos Negócios no WTC São Paulo. O evento, que reuniu especialistas nacionais e internacionais para discutir as inúmeras visões da ética aplicadas ao campo econômico, político, filosófico, educacional e pessoal, contou com 700 espectadores.
 
Abrindo os painéis do dia, o filósofo e ex-ministro de educação na França, Luc Ferry, falou sobre a nova revolução industrial atrelada às questões políticas e éticas. Segundo ele, as 3 áreas que serão impactadas pela nova revolução serão a economia, a mobilidade urbana e o transhumanismo – filosofia (ou movimento intelectual) que visa analisar e melhorar a condição humana a partir do uso de ciência e tecnologia (biotecnologia, nanotecnologia e neurotecnologia) para aumentar a capacidade cognitiva e superar limitações físicas e psicológicas.
 
Após contrapor o setor hoteleiro ao Airbnb e o táxi ao Uber, Ferry abordou a evolução do sequenciamento do genoma humano e o projeto transhumanista. “Este projeto tem 3 objetivos: deixar o ser humano mais poderoso e inteligente, lutar contra o envelhecimento e corrigir as desigualdades naturais do homem, acreditando ser um dever moral corrigir anomalias genéticas no embrião”, informou. Além disso, informou que há 3 tipos de Inteligência Artificial (I.A.) no mundo: a I.A. fraca (calcula, mas não tem consciência do que está fazendo Ex: máquinas de jogar xadrez); a L.A. ampla (torna dados contextualizados Ex: Google) e a I.A. forte (fabricação de um cérebro semelhante ao humano, com mais precisão e perfeição).
 
“Se conseguirmos uma humanidade biológica pós-moderna será o grande passo para a humanidade, mas será o último passo pois vamos construir um ser darwiniano e ele vai querer nos eliminar”, analisou conforme opinião do físico e cosmólogo britânico Stephen Hawking. “Ou criamos uma instância de regulamentação a nível mundial, ou vamos caminhar para o mundo opaco/incompreensivo e não saberemos para onde estaremos caminhando”.
 
Em seguida, a ex-presidente da Federação das Seitas budistas do Brasil, Monja Coen, afirmou que a inteligência humana jamais vai superar a I. A. “Nutrimos as máquinas com inteligência humana, no entanto elas não têm a possibilidade de escolher princípios de como vamos levar a vida”, disse. “A minha proposta é liberdade para não ser manipulado por ninguém, nem pela minha própria mente”.
 
Na parte da tarde, a pesquisadora e mestre em filosofia política, Djamila Ribeiro, abordou a diversidade e a importância da quebra do silêncio para promover o debate de sérias questões na sociedade. “Se pararmos de falar de um problema ele vai deixar de existir? Não, precisamos debater para criar mecanismos de combate”, defendeu. Para isso, ela exibiu diversos dados da desigualdade, abordou a imposição dos papeis sociais, estudos acadêmicos sobre a questão e o papel das empresas nisso. “O trabalho oferece um ambiente único para atender políticas de inclusão, mas não é muito bem aproveitado. A mistura de pessoas estimula a inovação, a criatividade, além de aumentar a qualidade do ambiente e o relacionamento entre os funcionários”.
 
O presidente da Associação Comercial da cidade do Porto (Portugal), Nuno Botelho, deu prosseguimento exibindo a destruição econômica em Portugal por meio de dados de empresas que faliram motivadas pela falta de ética. “Quando os negócios e a política se misturam nunca dá certo pois se corrompem, não sabem agir com ética”, ponderou. “Em um ambiente de altos impostos somados à corrupção, é muito comum surgir movimentos demagógicos e populistas para iludir a população”.
 
Ainda, o procurador da República e coordenador da Operação Lava-Jato, Deltan Dallagnol, atrelou a ética ao desenvolvimento econômico. “Quanto menor o nível de corrupção de um país, maior o IDH e maior o nível de efetividade do governo e competitividade das empresas”, afirmou. Algumas das práticas antiéticas mais disseminadas foram citadas ao longo de sua palestra: propina, sonegação fiscal e pagamentos de comissões. “Quando fazemos algo errado podemos até nos sentir mal, mas adotamos mecanismos para amenizar isso como a racionalização e a compensação”.
 
Para evitar conflitos éticos dentro do ambiente de negócios, Dallagnol destacou 7 práticas saudáveis:
1. Estender a consciência desse mecanismo antiético na empresa: é desse tipo de “escorregão” que são feitos em grande medida os escândalos empresariais;
2. Incentivar a equipe a apertar a tecla “pause”: faça uma pausa de 3 minutos antes de decisões relevantes para identificar as alternativas possíveis;
3. Incentivar as discussões de dilemas éticos dentro das organizações: quando temos que escolher entre duas situações e em cada uma delas existem princípios e valores que você ou a empresa prezam;
4. Desenvolver nos colaboradores da empresa a percepção de que eles têm um papel relevante quando executam uma tarefa: pessoas que estão apenas cumprindo ordens são capazes de praticar atrocidades;
5. A empresa deve deixar muito clara quais são as expectativas que ela tem em relação ao papel dos colaboradores: quais são as qualidades de um funcionário de sucesso dentro de sua organização;
6. Defender punições firmes contra a violação do código de ética;
7. Quando o funcionário sentir que algo não está correto, ele deve escutar outras pessoas que sofrem os mesmos tipos de pressão.

Por fim, o historiador e professor Leandro Karnal abordou a dificuldade da manutenção prolongada de um ambiente polarizado, como foi possível observar no caso das últimas eleições. “A divergência é boa e a polaridade é a base do Estado democrático. No entanto, há momentos em que o sentimento de medo é muito aguçado e ele é o pior conselheiro ético pois não estabelece um elemento de constituição de valores”, argumentou. Para o professor, a virtude ética não é inata: o ser humano aprende com a sociedade ao seu redor. Diferente da moral, que pressupõe uma vigilância externa, a ética é motivada por valores internos, construídos ao longo dos anos. “Só a ética garante a escolha e a liberdade”.