A 2ª turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) determinou a impenhorabilidade de bem de família mesmo quando o devedor não mora no local. De acordo com os ministros, o fato do imóvel ser o único utilizado para residência da entidade familiar dos executados, no caso a filha do dono, é o bastante para assegurar a garantia da impenhorabilidade.
 
De acordo com os autos, a controvérsia surgiu na fase de execução da sentença proferida na reclamação trabalhista, ajuizada por um assistente financeiro que trabalhou na empresa condenada, em meados de 2000. Sem bens em nome da empresa, o juiz determinou a desconsideração da personalidade jurídica e localizou o imóvel de um dos sócios em São Paulo. Mas, ao certificar que se tratava do único bem de propriedade do sócio, deixou de fixar a penhora.
 
O juízo da execução entendeu que o fato de o devedor não morar no local não afasta a impenhorabilidade do bem de família, que visa à proteção da garantia constitucional à dignidade da pessoa humana e ao direito de moradia. “O imóvel segue destinado à residência da unidade familiar, mesmo que na maior parte do tempo seja utilizado unicamente por sua filha”, trazia a decisão.
 
O ex-assistente financeiro recorreu e, no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 4ª região, conseguiu a determinação da penhora do imóvel para o pagamento dos débitos. Os autos constaram que o dono não morava mais em São Paulo, onde está a casa, mas, sim em Chapecó/SC, mais próximo das atividades da empresa. “Não há como se ter como bem de família imóvel em que o executado e sua esposa não têm o seu domicílio, e, portanto, não se constitui como bem de família”, entendeu o TRT.
 
Com o caso levado ao TST, a ministra Delaíde Miranda Arantes reconheceu que o homem mora em Chapecó, mas que ele continua arcando com as despesas da casa em São Paulo, como as contas de água, luz e telefone, para que sua filha utilize o local.
 
A ministra determinou que essas premissas são suficientes para demonstrar que o imóvel penhorado é utilizado pela unidade familiar para moradia. “Trata-se, portanto, de um bem de família, impenhorável”, concluiu Delaíde Miranda Arantes.
 
Súmula 486 do STJ auxilia na decisão
 
Para José Fernando Simão, advogado e diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – Ibdfam, a decisão revela orientação já pacificada no Superior Tribunal de Justiça (STJ) pela qual o bem de família não perde essa característica pelo fato de o proprietário não lá residir.
 
Assim, temos a Súmula 486 do STJ que diz: “É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família”. Nesse sentido, de acordo com José Simão, morar no imóvel não é a condição única para que esse seja considerado bem de família, em uma análise da teleologia da norma.
 
“O próprio STJ já tem entendido que ‘o fato do terreno encontrar-se desocupado ou não edificado são circunstâncias que sozinhas não obstam a qualificação do imóvel como bem de família, devendo ser perquirida, caso a caso, a finalidade a este atribuída’, conforme Informativo de jurisprudência 453. O simples fato de o bem não ser utilizado, não o faz menos essencial à família e, novamente, sua impenhorabilidade atende aos objetivos da lei 8.009/90”, afirma.
 
Contudo, José Fernando Simão ressalta que cabe ao titular do bem a prova de que apesar de não utilizar o imóvel, este permanece locado, ou utilizado esporadicamente pela família. Em suma, deve o devedor provar que o imóvel é destinado ao proveito da família.
 
“No caso em tela, a filha do casal morava esporadicamente na casa, o casal residia em imóvel locado perto de seu trabalho, razão pela qual a finalidade não se perdeu. A decisão do TST é acertada pela teleologia da lei 8.009/90”, diz.
 
Caso a empresa tivesse outros bens, o diretor nacional do Ibdfam destaca que seriam eles a ser penhorados e não a casa dos sócios. “Aliás, só se pretendeu atingir o imóvel residencial do sócio exatamente porque a empresa não tinha bens. Se tivesse, a penhora jamais poderia ocorrer sobre bem do sócio, pois a personalidade do sócio não se confunde com a da sociedade”, finaliza.
 
Confira o acórdão.