Recurso Administrativo em Pedido de Providências – Efetivação de interino em serventia extrajudicial – Cumprimento dos requisitos constitucionais e legais – 1. Os requisitos para a efetivação de interinos em serventias extrajudiciais estão previstos no art. 208 da Constituição Federal de 1967, segundo a redação dada pela EC 22/82, e do prescrito no art. 47 da Lei Federal 8.935/94, a saber: a) 5 anos de substituição na mesma serventia até 31/12/1983; b) vacância da serventia até 05/10/1988 – 2. Inaplicáveis os recentes precedentes deste Conselho relativos a nepotismo aos serventuários que cumpriram os requisitos para a efetivação, justamente porque perderam a condição de interinidade – Recurso Administrativo conhecido e julgado procedente. (Nota da Redação INR: ementa oficial)
 
Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS – 0000786-44.2018.2.00.0000
 
Requerente: FABIOLA DOS SANTOS ALMEIDA e outros
 
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ
 
EMENTA. RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. EFETIVAÇÃO DE INTERINO EM SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS.
 
1. Os requisitos para a efetivação de interinos em serventias extrajudiciais estão previstos no art. 208 da Constituição Federal de 1967, segundo a redação dada pela EC 22/82, e do prescrito no art. 47 da Lei Federal 8.935/94, a saber: a) 5 anos de substituição na mesma serventia até 31/12/1983; b) vacância da serventia até 05/10/1988.
 
2. Inaplicáveis os recentes precedentes deste Conselho relativos a nepotismo aos serventuários que cumpriram os requisitos para a efetivação, justamente porque perderam a condição de interinidade.
 
Recurso Administrativo conhecido e julgado procedente.
 
ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –
 
O Conselho, por unanimidade, conheceu e deu provimento ao recurso administrativo, nos termos do voto do Relator. Não participou do julgamento o Conselheiro Humberto Martins. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros Henrique Ávila e Daldice Santana. Presidiu o julgamento o Ministro Dias Toffoli. Plenário, 9 de abril de 2019. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema do Vale, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, Valdetário Andrade Monteiro, André Godinho e Maria Tereza Uille Gomes.
 
1. RELATÓRIO
 
Cuida-se de recurso administrativo interposto por ROSA MARIA RODRIGUES LIMA DE OLIVEIRA contra decisão da CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA que julgou improcedente o presente pedido de providências.
 
Em suas razões iniciais, a recorrente esclareceu que foi surpreendida com a informação, veiculada no Diário de Justiça Eletrônico do Poder Judiciário de Alagoas em 24/01/2018, de que a serventia pela qual responde – Cartório do Único Ofício de Pilar – fora incluído na lista de serventias vagas (Id. 2346077).
 
Alega que possui direito adquirido à efetivação na serventia extrajudicial, por atender aos requisitos descritos no art. 208 da Constituição Federal de 1967, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 22/82, combinado com o artigo 47 da Lei Federal n. 8.935/94, a saber: a) 5 anos de substituição na mesma serventia até 31/12/1983; b) vacância da serventia até 05/10/1988.
 
Relembra que tal fato foi reconhecido por este Eg. Conselho em 12/07/2010 na decisão proferida pelo então Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Gilson Dipp, que divulgou a lista das serventias vagas e providas em todo o país.
 
Contudo, foi surpreendida com a alteração do status da serventia no Sistema Justiça Aberta, mas não obteve acesso à decisão que fundamentou essa modificação. Desse modo, formulou o PP 6507-11, perante a Corregedoria Nacional de Justiça, que determinou ao TJ/AL que cientificasse a Requerente sobre a situação. Cumprida a determinação, o feito foi arquivado.
 
Relata que passou à condição de escrevente juramentada e substituta do Cartório do Único Ofício de Pilar em 19/05/1978. Em 1985, com o falecimento do titular da serventia, assumiu a titularidade na condição de interina.
 
Por esta mesma razão, este Eg. Conselho publicou decisão em 12/07/2010 no PP nº 0000384-41.2010.2.00.000, reconhecendo o direito de titularização da Requerente e declarando a serventia provida. A informação permaneceu no Sistema Justiça Aberta até o ano de 2016.
 
Em 2013, ao ser informada da necessidade de adquirir o certificado digital para sua serventia, requereu à Corregedoria local a certidão de sua regularidade funcional, o que deu ensejo à instauração do processo administrativo n. 04567-5.2014.001, a que só teve acesso após acionar o CNJ por meio do PP 0006507-11.2017.2.00.0000, já no ano de 2017.
 
Segundo a Requerente, no processo administrativo em questão, o TJ/AL não somente deixou de observar a decisão do CNJ de 2010, como limitou-se em insistir que a serventia estaria vaga desde 1985, com a morte do então titular.
 
Entende que o TJ/AL não poderia rever a decisão proferida pelo CNJ em 2010, pois transcorrido o prazo decadencial de 5 anos para a Administração rever ou anular seus atos.
 
Relata, ainda, não haver sido intimada da decisão que declarou vaga a serventia nem pelo TJ/AL.
 
Ante o exposto, pretende:
 
a) O desarquivamento do PP nº 0006507-11.2017.2.00.0000 para que seja apenso a este Pedido de Providências por ser matéria a ela vinculada;
 
b) Seja reconhecida como consolidada a r. decisão deste C.CNJ que reconheceu a titularidade da Requerente na Serventia em questão, declarando-a provida em 12/07/2010 (PP nº 0000384-41.2010.2.00.0000), retirando-a da relação de serventias vagas publicada em 24/01/2018 e constante no edital retificador nº 1/2018 de 30 de janeiro de 2018 do concurso público a ser realizado pelo Tribunal de Justiça de Alagoas;
 
c) A exclusão definitiva da Serventia em questão da lista de vacâncias e do edital retificado nº 1/2018 de 30/01/2018 do concurso público e por conseguinte, sua inclusão na lista de serventias providas, ante as razões invocadas, ou alternativamente, que seja colocada na relação de serventia “sub judice”, até decisão final;
 
d) Seja definitivamente incluído nos assentamentos funcionais da Requerente a função de titular da Serventia e para que a CGJ/AL certifique a regularidade de sua situação como titular do Cartório de Notas, Protesto, Registro de Imóveis, Títulos e Documentos em Pilar/Al;
 
e) O reconhecimento da inexistência ou da nulidade de possível ato de intimação da interessada quanto à decisão de inclusão da Serventia em questão na relação de vacâncias e no edital retificador 1/2018 de 30/01/2018, em face da inobservância à decisão consolidada deste C.CNJ em 12/07/2010 e do §3º do art. 15 do Regulamento Geral da Corregedoria Nacional de Justiça e do parágrafo único do art. 2º da Resolução CNJ nº 80/2009, bem assim do que acabou sedimentado pelo STF no MS nº 25.962-1/DF;
 
f) Que, acolhida ou não a alegação de inexistência ou de nulidade da intimação suso mencionada, seja reconhecida a impossibilidade de a Requerente exercer o direito de defesa, em razão da falta de cientificação dos documentos e do inteiro teor das razões que motivaram a decisão de inclusão da Serventia na relação provisória de vacâncias e no sistema ‘Justiça Aberta’ como ‘vago’ em 25/07/2017.”
 
Intimado a se manifestar (ID 2367147), o Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas esclareceu que: a) a situação da serventia em questão foi alterada para vaga em decorrência do ato n. 299/2016 do Presidente do TJ/AL que designou a Requerente, excepcional e precariamente, para exercer a função de Oficial Interino do Cartório até a conclusão do concurso público; b) o ato é a conclusão do que se discutiu no processo administrativo n. 04567-5.2014.09.001, em que se constatou que a Requerente, filha do então titular da serventia, foi designada como substituta em razão da morte do pai em 13.12.1985, sendo, no mesmo ato, designada escrevente juramentada; c) todavia, em razão da relação de parentesco entre ambos, e dos recentes precedentes deste Conselho (PCA 5414-13),  configurada a hipótese de nepotismo, não lhe pode ser conferida a titularidade na serventia, como pretendido; d) afirma, ainda, que no âmbito do processo administrativo n. 02957-9.2009.001, a Comissão instituída pela Portaria n. 1.666/2017, da Presidente do Tribunal, chegou à conclusão de que a Requerente, na “qualidade de substituta mais antiga”, assumiu a responsabilidade, “em caráter precário, pelos correspondentes serviços notariais e registrais”; e) por fim, no bojo dos autos n. 178/2008, informa que a Comissão instituída pela Portaria n. 717/2008 para analisar a situação das serventias extrajudiciais do Estado, emitiu parecer no sentido de se declarar a serventia vaga, devendo ser provida por meio de concurso público; f) informa ainda que “em razão do recebimento da remuneração relativa ao cargo de Escrevente Juramentado, configurou-se a ‘opção tácita’ pela serventia judicial. Portanto, é latente a situação de vacância da referida serventia extrajudicial”. Entende, desse modo, que a Requerente não realizou a opção antes da vigência da Constituição Federal.
 
Posteriormente, o então Corregedor Nacional de Justiça, Ministro João Otávio de Noronha, proferiu decisão terminativa em que julgou improcedente o pedido (ID 3169375).
 
A ora Recorrente formulou recurso administrativo, sob os seguintes fundamentos: a) o CNJ reconheceu sua titularidade no Cartório único do Ofício de Pilar na decisão proferida em 12/07/2010, como se poderia aferir do Sistema Justiça Aberta; b) em 24/1/2018 foi surpreendida com a alteração da situação da serventia, que passou a figurar como vaga, sem que tivesse sido pessoalmente intimada do procedimento que discutiu a questão; c) o Tribunal não esclareceu porque alterou a situação da serventia antes declarada vaga pelo CNJ; d) a decisão do TJ/AL, tomada 6 anos após a decisão do CNJ, viola o prazo decadencial que a administração dispõe para rever seus atos, que é de 5 anos, conforme previsão contida no art. 54 da Lei 9.784/99; e) possui direito adquirido à efetivação na serventia, com base no art. 208 da Constituição Federal de 1967, segundo a redação dada pela EC 22/82, nos termos do regime vigente antes da Constituição de 1988 e do prescrito no art. 47 da Lei Federal 8.935/94; f) o Tribunal equivocadamente não considerou que a Recorrente fez sim a opção pela serventia extrajudicial em prejuízo da judicial, pois há diversos documentos juntados aos autos que confirmam que foi “exonerada a pedido”, e que nos anos de 1997, 1999 e 2001 já era considerada, nos censos administrativos da Corregedoria local, como tabeliã. Ademais, se ainda ocupasse o cargo público relativo à serventia judicial, já teria sido aposentada compulsoriamente pelo próprio Tribunal, em razão do implemento da idade; g) por fim, sustenta a inaplicabilidade do precedente do CNJ que reconheceu o nepotismo na relação existente entre titular e substituto, pois deve ser considerada titular, e não substituta.
 
É o relatório.
 
2. FUNDAMENTAÇÃO
 
A discussão trazida aos autos afigura-se bastante peculiar.
 
Em pesquisa realizada no PP 00003841-41.2010.2.00.0000, o então Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Gilson Dipp, reconheceu que a serventia pela qual responde a Recorrente estaria regularmente provida, como se depreende da decisão proferida em 12/07/2010, divulgada juntamente com a lista das serventias judiciais existentes no país e sua respectiva condição (providas ou vagas) (disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/69809-corregedoria-do-cnj-determina-que-5561cartorios-sejam-submetidos-a-concurso-publico).
 
A decisão teve como fundamento o art. 4º, parágrafo único, b, da Resolução CNJ n. 80/09, que assim dispõe (grifos acrescidos):
 
Art. 4º Estão incluídas nas disposições de vacância do caput do artigo 1º desta resolução todas as demais unidades cujos responsáveis estejam respondendo pelo serviço a qualquer outro título, que não o concurso público específico de provas e títulos para a delegação dos serviços notariais e de registro, a exemplo daqueles que irregularmente foram declarados estáveis depois da Constituição Federal de 1988 e dos que chegaram à qualidade de responsável pela unidade por permuta ou por qualquer outra forma não prevista na Constituição Federal de 5 de outubro de 1988.
 
Parágrafo único. Excluem-se das disposições de vacância do caput do artigo 1º desta resolução as unidades dos serviços de notas e registro, cujos notários e oficiais de registro:
 
a) tenham sido legalmente nomeados, segundo o regime vigente até antes da Constituição de 1988, assim como está prescrito no artigo 47 da Lei Federal 8.935, de 18 de novembro de 1994, cuja norma deferiu a esses titulares, regularmente investidos sob as regras do regime anterior, a delegação constitucional prevista no art. 2º dessa mesma lei;
 
b) eram substitutos e foram efetivados, como titulares, com base artigo 208 da Constituição Federal de 1967 (na redação da EC 22/1982). Nesses casos, tanto o período de cinco anos de substituição, devidamente comprovado, como a vacância da antiga unidade, deverão ter ocorrido até a promulgação da Constituição Federal de 05 de outubro de 1988;
 
Por sua vez, o art. 208 da Constituição Federal de 1967 (com redação dada pela EC 22/1982), determina:
 
Art. 208 – Fica assegurada aos substitutos das serventias extrajudiciais e do foro judicial, na vacância, a efetivação, no cargo de titular, desde que, investidos na forma da lei, contem ou venham a contar cinco anos de exercício, nessa condição e na mesma serventia, até 31 de dezembro de 1983. (Redação da pela Emenda Constitucional nº 22, de 1982)
 
A lei 8935/94, mais conhecida como a lei dos cartórios, assim disciplina a questão em seu artigo 47:
 
Art. 47. O notário e o oficial de registro, legalmente nomeados até 5 de outubro de 1988, detêm a delegação constitucional de que trata o art. 2º.
 
Verifica-se, desse modo, que as condições para a efetivação dos interinos nas serventias extrajudiciais são as seguintes: a) 5 anos de substituição na mesma serventia até 31/12/1983; b) vacância da serventia até 05/10/1988.
 
No caso concreto, tem-se que a Requerente era filha do antigo titular da serventia extrajudicial, e assumiu simultaneamente a condição de escrevente juramentada e de tabeliã “ad hoc” da serventia, conforme certidões juntadas aos autos pelo próprio Tribunal de Justiça de Alagoas (ID 2617148, fls. 1, 2, 6 e 7). Os documentos também esclarecem que a Requerente substituía o titular efetivo em razão de suas licenças por motivo de saúde.
 
Há ainda informações de que, com a morte do então titular, ocorrida em 12/12/1985, a Requerente foi nomeada por meio de portaria da lavra do Juiz de Direito da Comarca de Pilar, para responder pela serventia como titular interina e escrevente juramentada (ID 2617151, fls 1).
 
Contudo, o TJ/AL instituiu Comissão para, dentre outras funções, apurar a regularidade do exercício das delegações no Estado, conforme Portaria 1166/2007 (ID 2617149, fls. 5), posteriormente alterada pela Portaria 610/2008, que alterou os membros para desempenhar as mesmas funções (ID 2617149, fls. 46). Em parecer datado de 08/10/2008, após a instrução do feito, a Comissão opinou pela declaração de vacância da serventia, por entender que encontrava-se vaga desde 12/12/1985, com o falecimento do então titular (fls. 47 e 48). Por meio de despacho de 22/06/2009, a então Presidente do Tribunal acolheu os termos do parecer e declarou a serventia vaga, notificando a Corregedoria local para as providencias necessárias (fls. 50).
 
Inobstante, não restam dúvidas de que a Requerente tem direito à efetivação na serventia extrajudicial pela qual responde desde 1985, em razão do preenchimento de todos os requisitos constitucionais e legais. Nesse mesmo sentido, o decidido pelo Min. Gilson Dipp na condição de Corregedor Nacional de Justiça, em 2010.
 
Sobre a possível configuração do vínculo de nepotismo, suscitada pelo E. TJ/AL, o argumento não deve prosperar, pois a Requerente é de fato a atual titular do cartório, e portanto não há que se aferir se o vínculo com o anterior titular fere o princípio da moralidade.
 
Por fim, em relação à escolha entre a Serventia judicial e a extrajudicial, o TJ/AL esclareceu que, “em razão do recebimento da remuneração relativa ao cargo de Escrevente Juramentado, configurou-se a opção tácita pela serventia judicial”.
 
Contudo, não é o que se infere das informações extraídas dos autos, já que documentos produzidos pelo próprio Tribunal, datados de 2007, dão conta de que a Requerente não acumulava a serventia extrajudicial com outra função pública, e que não recebia remuneração paga pelo TJ/AL (ID 2671149, fls. 7).
 
Desse modo, entendo que a decisão do TJ/AL que não efetivou a Requerente no Cartório do Único Ofício de Pilar, além de contrariar decisão deste próprio Conselho, viola dispositivos constitucionais e legais, e deve ser revista.
 
Ante o exposto, conheço do presente recurso administrativo para julgá-lo procedente e:
 
a) anular a decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas que declarou a vacância do Cartório do Único Ofício de Pilar,
 
b) determinar a alteração de seu status no Sistema Justiça Aberta para a condição de “provido”;
 
c) reconhecer a efetivação da Sra. Rosa Maria Rodrigues de Lima de Oliveira na titularidade da serventia.
 
É como voto.
 
Ministro ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA
 
Corregedor Nacional Substituto
 
Brasília, 2019-04-10. – – /
 
Dados do processo:
 
CNJ – Pedido de Providências nº 0000786-44.2018.2.00.0000 – Alagoas – Rel. Cons. Aloysio Corrêa da Veiga.