PODER JUDICIÁRIO
 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
 
CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
 
Apelação n° 1003262-94.2017.8.26.0114
 
Registro: 2019.0000344276
 
ACÓRDÃO
 
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1003262-94.2017.8.26.0114, da Comarca de Campinas, em que são apelantes GISBERTO ANTONIO PIOVESAN e MARIA THEREZA CARELLI CAETANO, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMOVEIS DA COMARCA DE CAMPINAS.
 
ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento à apelação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
 
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).
 
São Paulo, 25 de abril de 2019.
 
GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO
 
Corregedor Geral da Justiça e Relator
 
Apelação Cível nº 1003262-94.2017.8.26.0114
 
Apelantes: Gisberto Antonio Piovesan e MARIA THEREZA CARELLI CAETANO
 
Apelado: 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMOVEIS DA COMARCA DE CAMPINAS
 
VOTO Nº 37.729
 
Registro de Imóveis – Sucessão Provisória – Ingresso do título no fólio real condicionado à sucessão definitiva – Negativa de registro da escritura de compra e venda celebrado pela viúva meeira e herdeiros em atenção ao princípio da continuidade – Formal de partilha – Documentos pessoais das partes – Apresentação ao Tabelião que não supre a omissão apontada nos títulos prenotados junto à serventia imobiliária – Manutenção dos óbices apontados pelo registrador – Dúvida julgada procedente – Apelação não provida.
 
Trata-se de apelação interposta por Gisberto Antonio Piovesan e Maria Thereza Carelli Caetano contra a sentença [1] proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial do 2º Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve a recusa de registro do aditamento ao formal de partilha expedido nos autos do processo nº 3175/97, que tramitou perante a 7ª Vara Cível daquela Comarca, referente à partilha da parte ideal de 7/48 ou 14,58% do imóvel objeto da matrícula nº 33.061 daquela serventia, bem como dos demais títulos protocolados relativos ao mesmo imóvel.
 
Alegam os apelantes, em síntese, que em relação à partilha dos bens deixados por Sylvio Caetano não há que se falar em sucessão provisória, sendo que a parte ideal de 14,58% do imóvel objeto da matrícula nº 33.061 foi atribuída à viúva e herdeiros mencionados no título. Aduzem que a menção equivocada à sucessão provisória não tem o condão de afastar o direito dos sucessores, devendo prevalecer a regra do art. 112 do Código Civil no sentido de que, nas declarações de vontade, mais se deve ater à intenção das partes que ao sentido literal da linguagem utilizada no título. Afirmam que houve regular processamento do inventário dos bens deixados pelo falecido, o que ensejou, inclusive, a lavratura de escritura de compra e venda do imóvel partilhado que, assim, merece ser registrada. Ainda, sustentam que a indisponibilidade decretada sobre uma pequena fração ideal do imóvel não pode reduzir o direito dos adquirentes e demais proprietários, sobretudo porque, à época da lavratura da escritura, não constava da matrícula nenhuma averbação de indisponibilidade. No mais, discordam da necessidade de apresentação dos documentos pessoais das partes, eis que já apresentados ao Tabelião de Notas quando da lavratura das escrituras que pretendem registrar[2].
 
A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso[3].
 
É o relatório.
 
O dissenso versa sobre a registrabilidade:
 
a) do aditamento de formal de partilha expedido nos autos do Processo nº 3175/97, que tramitou perante a 7ª Vara Cível da Comarca de Campinas/SP (prenotação nº 338.998);
 
b) da escritura de venda e compra lavrada pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Distrito de Barão Geraldo, Comarca de Campinas/SP, no Livro 171, pp. 185/186 (prenotação nº 338.999);
 
c) do formal de partilha expedido nos autos do Processo nº 2075/93, que tramitou perante a 5ª Vara Cível da Comarca de Campinas/SP (prenotação nº 339.001); e
 
d) da escritura de compra e venda lavrada pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Distrito de Barão Geraldo, Comarca de Campinas/SP, Livro 153, pp. 388/391 (prenotação nº 339.296).
 
Os títulos foram devolvidos, argumentando o Registrador que:
 
a) o aditamento de formal de partilha expedido nos autos do Processo nº 3175/97, que tramitou perante a 7ª Vara Cível da Comarca de Campinas/SP (prenotação nº 338.998), não é passível de registro eis que necessária a apresentação da sucessão definitiva, devendo, caso superado esse óbice, ser instruído com as cópias autenticadas dos documentos pessoais (RG e CPF) de Maria Thereza Carelli Caetano e Silvio Caetano;
 
b) a qualificação da escritura de venda e compra lavrada pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Distrito de Barão Geraldo, Comarca de Campinas/SP, Livro 171, pp. 185/186 (prenotação nº 338.999) resultou prejudicada, pois condicionada à superação dos óbices apresentados em relação ao título objeto da prenotação nº 338.998, em respeito ao princípio da continuidade dos registros previsto no art. 195 da Lei dos Registros Públicos;
 
c) o formal de partilha expedido nos autos do Processo nº 2075/93, que tramitou perante a 5ª Vara Cível da Comarca de Campinas/SP (prenotação nº 339.001), deveria estar acompanhado de cópias autenticadas dos documentos pessoais (RG e CPF) de João Carelli e Ana Casarin Carelli, em atenção ao disposto no art. 176 da Lei 6.015/73; e
 
d) a escritura de compra e venda lavrada pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Distrito de Barão Geraldo, Comarca de Campinas/SP, Livro 153, pp. 388/391 (prenotação nº 339.296) foi qualificada negativamente ante a existência de averbação de ordem de indisponibilidade na matrícula do imóvel.
 
Primeiramente, é preciso lembrar que o instituto da ausência visa assegurar a situação patrimonial de quem tenha desaparecido sem deixar notícias ou quem o representasse, e seus reflexos perante terceiros. Deferida a sucessão provisória, são os herdeiros imitidos na posse dos bens deixados pelo ausente, mas não em caráter definitivo. Nomeia-se quem irá administrar os bens do ausente até que, decorrido certo tempo, os bens se transmitam, definitivamente, a quem de direito.
 
Ensinam Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira que: “Em garantia aos direitos de terceiros, cumpre aos herdeiros, imitidos na posse dos bens do ausente, prestar caução de os restituir. Essa garantia visa preservar os direitos do ausente para a hipótese de seu regresso. Mantém-se a regra no novo Código Civil, porém suavizada pela dispensa da garantia para posse nos bens do ausente por seus ascendentes, descendentes ou cônjuge, uma vez provada a sua qualidade de herdeiros (art. 30 e seu par. 2º). Cessa a sucessão provisória pelo comparecimento do ausente, de seu procurador ou de quem o represente, enquanto não vencido o prazo para conversão da sucessão em definitiva” (Inventários e Partilhas, Leud, 15ª. Edição, p. 234/235).
 
Como se vê, na sucessão provisória os herdeiros ainda não tem a propriedade definitiva dos bens, o que é incompatível com a segurança que se exige do registro de imóveis. Por essa razão, o ingresso no fólio real fica condicionado à sucessão definitiva, conforme já decidido por este Egrégio Conselho Superior, nas Apelações Cíveis nº 093.962-0/5 e nº 99010515.250-3.
 
Até lá, o caráter provisório da transmissão fica ainda mais evidente por força do disposto no art. 31 do Código Civil, que veda a alienação dos imóveis do ausente, salvo nas hipóteses específicas ali estabelecidas. Em outras palavras, os herdeiros não possuem plena disponibilidade dos imóveis.
 
A conversão da sucessão provisória em definitiva dá-se por sentença, a requerimento dos interessados, o qual poderá ser feito somente dez anos após o trânsito em julgado da sentença que deferiu a abertura da sucessão provisória. No caso concreto, porém, tendo sido o formal expedido nos autos do procedimento de sucessão provisória, sem apresentação da sentença declaratória da sucessão definitiva (Código Civil, art. 37), inviável o registro.
 
Correto, pois, o óbice apresentado pelo Oficial em relação ao aditamento de formal de partilha expedido nos autos do Processo nº 3175/97, que tramitou perante a 7ª Vara Cível da Comarca de Campinas/SP, prenotado sob nº 338.998 e, por força do princípio da continuidade, também em relação à escritura de compra e venda em que figuram a viúva meeira e os demais herdeiros como outorgantes vendedores, prenotada sob nº 338.999.
 
E ainda que dispensável a exigência de apresentação de cópias autenticadas do CPF de Ana Casarin Carelli, eis que possível a relativização do princípio da especialidade subjetiva diante da justificativa apresentada, o fato é que a simples alegação de que os demais documentos já foram apresentados ao Tabelião de Notas, por ocasião da escritura de compra e venda posteriormente lavrada, não afasta os óbices apresentados ao registro do formal de partilha expedido nos autos do Processo nº 2075/93, que tramitou perante a 5ª Vara Cível da Comarca de Campinas/SP, prenotado sob nº 339.001. É que o formal de partilha que deve estar apto a registro independentemente da regularidade do ato subsequente, isto é, da escritura de compra e venda lavrada na sequência.
 
Aliás, o registro desse formal de partilha é pressuposto do registro da escritura de compra e venda lavrada pelos herdeiros junto ao Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Distrito de Barão Geraldo, Comarca de Campinas/SP, Livro 153, pp. 388/391, prenotada sob nº 339.296, de maneira que também se mostra correta a recusa formulada em relação a esse título, sobretudo diante da ordem de indisponibilidade averbada na matrícula e a impossibilidade de ser autorizada, no caso concreto, a cindibilidade do título.
 
Ressalte-se, a propósito, que no sistema dos registros públicos vige o princípio tempus regit actum. Em outras palavras, a registrabilidade do título é aferida por ocasião da prenotação, pouco importando, destarte, que a averbação de indisponibilidade tenha ocorrido após a lavratura da escritura de compra e venda.
 
Nesse cenário, correta a sentença prolatada.
 
Diante do exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.
 
GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO
 
Corregedor Geral da Justiça e Relator
 
Notas:
 
[1] Fls. 235/239.
 
[2] Fls. 250/253.
 
[3] Fls. 269/271.