Em meio à pandemia da Covid-19, um novo comportamento vem surgindo entre os casais do estado. Dados levantados junto ao Cartório Andrade Lima | 1º Ofício de Notas do Recife revelam a assinatura de 61 uniões estáveis, entre 23 de março e 22 de abril deste ano, contra 47, realizadas no cartório no mesmo período do ano passado. O número representa um aumento de 30%. Por trás dessa maior procura está principalmente o desejo de garantir o acesso do companheiro ou companheira ao plano de saúde em tempos de crise na saúde pública.
Segundo Alessandra Cândido, gestora jurídica do cartório e tabeliã, até o final desta sexta-feira o número deve aumentar e chegar a mais de 70 uniões estáveis. “A justificativa dos casais é porque querem incluir o parceiro ou parceira no plano de saúde no caso de necessidade e assim não utilizar o serviço público.”
Por conta da pandemia, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Corregedoria Geral de Justiça de Pernambuco baixaram provimentos para nortear as ações dos cartórios durante o período de isolamento social. Os documentos determinam a necessidade de preservar a saúde das pessoas e atender apenas aos casos de urgência. “A urgência é avaliada pelo tabelião. Entendemos que, dificilmente, uma pessoa sai de casa para vir ao cartório se não for um pedido de urgência. A pessoa liga e orientamos para enviarem todos os documentos necessários por email e WhatsApp e depois vêm só assinar”, explica Alessandra.
Caso a pessoa faça parte do grupo de risco, o cartório vai até o endereço do solicitante, com máscara e caneta higienizada, para a assinatura. “Também agendamos para um casal por vez no cartório”, completa a tabeliã. Alessandra entende que a união estável no atual momento pode ser considerada urgente por conta da necessidade de acesso ao plano de saúde. “Atendemos aos casos que já estavam em andamento e aos novos considerados urgentes. Muitos casais têm nos procurado porque não têm conseguido o mesmo em outros cartórios.”
Para a união estável, os casais hétero ou homoafetivos, precisam apresentar RG, CPF e informar – nesse caso não precisa documento – o estado civil, se tem filhos em comum, o endereço, tempo de convivência e o regime de bens.
Segundo a assessoria de imprensa da Corregedoria Geral de Justiça, cuja função também é fiscalizar os cartórios, com base nas informações do Registro Civil, os dados disponíveis, por enquanto, são de 2017 a fevereiro deste ano. Os dados de março deste ano ainda não chegaram para ser computados.
Caso semelhante ao do Cartório Andrade Lima foi registrado no 15º Cartório de Ofício de Notas, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Em março de 2019 foram assinadas 47 uniões estáveis, contra 73 no mesmo período deste ano, ou seja, um aumento de 55,3%, justamente no período da pandemia. Os relatos dos casais também se referem ao plano de saúde.
Namoro
Enquanto uns casais assinam a união estável para tentar garantir acesso à saúde durante a pandemia, namorados viram na ocasião uma oportunidade para dividir o mesmo teto e quem sabe formalizar a união em seguida.
A mestranda Joanna, 22, está morando na casa dos pais, em Afogados, no Recife, junto com a namorada, uma doula de 21 anos, desde o início das orientações de isolamento social no país. Joanna morava em Curitiba e a companheira, em Pernambuco. Mantinham um relacionamento à distância há apenas dois meses. Agora, vivem como em um casamento.
“A gente percebeu que ia ficar impossível de se ver, então, decidimos ficar juntas na mesma casa. Conheço algumas pessoas que fizeram o mesmo. Já tem tanta coisa ruim acontecendo e manter essa união é saudável”, diz Joanna.
Separação
Quanto aos pedidos de divórcio e de dissolução de união estável, os números do Cartório Andrade Lima deste ano estão empatados com os do ano passado, explica a tabeliã. Enquanto o divórcio permaneceu com cinco casos, entre 23 de março e 22 de abril, a dissolução da união estável ficou com vinte casos no mesmo período. Chama a atenção o fato das pessoas não esperarem a pandemia acabar para darem um fim à relação.
Outro movimento no cartório tem chamado a atenção da tabeliã. O número de buscas por procurações não aumentou em comparação com o ano passado, no entanto, mudou o objetivo de quem busca o documento. “A gente teve uma queda na procura, mas o que tem acontecido é que muitos idosos têm solicitado a procuração para não saírem de casa, por serem do grupo de risco para a doença”, explica.