A depender do tempo faltante, ou da demora dos trâmites processuais, mesmo que inicialmente a parte não tenha cumprido o requisito de tempo, após o ajuizamento e ainda durante o percurso processual, esse tempo pode se completar
 
Inicialmente, cumpre destacar que, a Usucapião, independente da modalidade em que ocorra (ordinária, extraordinária, especial), deve preencher os requisito de cumprimento de lapso temporal na posse do bem, seja este móvel ou imóvel.
 
Isso é, se o prazo previsto para usucapir é de 2 anos, como em casos de abandono de lar por um dos cônjuges, deve haver o cumprimento deste prazo, sem interrupção, para que o cônjuge que ficou em posse do bem no momento do abandono e por período igual ou superior ao previsto, possa entrar com a ação, e para que esta possa ter resultado favorável à ele.
 
Assim, três são os requisitos da ação de usucapião, sendo estes, o bem a ser usucapido, a posse do bem, e o decurso do tempo necessário para aquisição pela modalidade tentada, sendo em algumas modalidade exigido ainda, o justo título.
 
Portanto, parece coerente que, sem que haja o cumprimento de todo o prazo, a ação não poderia ser tentada e por tanto, se tentada antes do prazo, deveria ser considerada improcedente, já que seria um requisito de demonstração no momento de interposição da ação.
 
Ocorre que, o Conselho da Justiça Federal, na V Jornada de Direito Civil, aprovou o enunciado 497, que trata da situação da contagem deste prazo, durante o decorrer do processo, como podemos ver abaixo:
 
“Enunciado 497: O prazo, na ação de usucapião, pode ser completado no curso do processo, ressalvadas as hipóteses de má-fé processual do autor.”
 
O enunciado 497, garante que, caso a pessoa, de boa-fé, entre com ação antes do período necessário para que seja possível usucapir, esta, não deve ser prejudicada pelo erro, e poderá utilizar do tempo que corre, durante o curso do processo, para se tornar proprietária do bem, por meio da ação intentada.
 
Esse engano pode ser, pelo não cumprimento do prazo em si, confusão acerca do momento da posse, da contagem de prazo conforme a transmissão dessa à herdeiros, comprovação de não interrupção e outros, que ao serem analisados, podem acabar por reduzir o prazo válido de contagem frente ao juízo, e por tanto, frente ao que o Autor acreditava ser o prazo total que contabilizava.
 
A depender do tempo faltante, ou da demora dos trâmites processuais, mesmo que inicialmente a parte não tenha cumprido o requisito de tempo, após o ajuizamento e ainda durante o percurso processual, esse tempo pode se completar.
 
Isso ocorre já que, a sentença que julga a possibilidade da Usucapião tem natureza declaratória e não constitutiva de direito, apenas afirmando uma situação que já ocorre de fato, com efeitos ex-tunc.
 
Ou seja, não há razão, para que em uma sentença haja decisão contrária à parte, caso o único requisito faltante seja o prazo da usucapião no momento de proposição da ação, sendo que no momento da sentença esse já foi cumprido. Então, o problema já teria sido sanado antes mesmo da decisão ser proferida.
 
O fato de haver à posse não modificou após a propositura da ação, e considerando o princípio da economia processual, em que deve buscar a forma menos custosa para o mesmo resultado, e da proporcionalidade, em que se busca o equilíbrio entre os meios e os fins a serem alcançados, é ilógico que se obrigue a parte à entrar com nova demanda, tendo mais gastos, em um período maior de tempo e utilizando novamente do serviço jurisdicional, para concretizar fato que desde já poderia ser declarado.
 
Bem como, o prejuízo que pode ser causado ao possuidor, que não conseguirá alienar o bem caso seja necessário, por ainda não ser registrado como proprietário deste, apesar de já ter cumprido os requisitos necessários para tanto.
 
Caso interessante ocorreu em Minas Gerais, onde o Tribunal do Estado julgou improcedente a demanda de Usucapião, por não considerar o prazo após o período em que a demanda foi interposta, isso porque, o magistrado argumentou dizendo que a sentença declaratória deveria ser apenas de fatos preexistente ao momento da interposição da demanda, ou seja, o prazo não poderia ser contabilizado até o proferimento da sentença. Chegando então ao STJ a decisão para uma reanálise, que teve decisão neste sentido:
 
“Desse modo, é possível o reconhecimento da usucapião quando o prazo exigido por lei se complete no curso do processo judicial, conforme a previsão do art. 460 do CPC/1973 (correspondente ao art. 493, caput, do CPC/2015), ainda que o réu tenha apresentado contestação.”
 
Considerando ainda que a interposição de contestação no caso não seria suficiente para suspensão da contagem do prazo:
 
“incumbe ressaltar que a contestação apresentada pelo réu não impede o transcurso do lapso temporal. Com efeito, a mencionada peça defensiva não tem a capacidade de exprimir a resistência do demandado à posse exercida pelo autor, mas apenas a sua discordância com a aquisição do imóvel pela usucapião.”
 
(…)
 
“a interrupção do prazo da prescrição aquisitiva poderia ocorrer na hipótese em que o proprietário do imóvel usucapiendo conseguisse reaver a posse.”
 
Assim, o STJ, confirmou o entendimento do Enunciado 497, supramencionado, para considerar válida a contagem do prazo, mesmo que seja no decorrer do processo. Não havendo necessidade, portanto, de interposição de nova demanda para declarar fato que se firmaria entre a propositura da demanda e o momento decisório.
 
Claramente, todos os outros requisitos devem estar comprovados para que, a propriedade possa ser de fato considerada apta a ser declarada do usucapiente.
 
Para ilustrar essa situação, podemos ver um julgado que ocorreu em Tocantins, e teve decisão desfavorável às partes, já que elas pugnaram pelo reconhecimento da contagem de prazo no decurso do processo, o que foi admitido pelo Tribunal, mas não demonstraram o termo inicial da posse, para que a contagem fosse confirmada:
 
“Nesses termos, a despeito de conhecer os precedentes jurisprudenciais que atestam a possibilidade de o prazo aquisitivo ser completado no curso do processo, bem como não ter o ajuizamento de ação reivindicatória extinta sem julgamento de mérito sobre a propriedade o condão de interromper a prescrição aquisitiva, não há nos autos elementos seguros que possam indicar com precisão a data em que o imóvel foi adquirido”.
 
Outras demandas como esta, chegaram ao STJ, mas também não prosperaram.
 
Assim, conclui-se que, atualmente, o Ordenamento Jurídico Brasileiro, adota em sua maioria a possibilidade de usar o tempo decorrido do momento da propositura da ação até seu momento decisório, para contabilizar o cumprimento do período necessário de posse, para declaração de propriedade pelo usucapiente. Considerando, claro, o cumprimento de todos os outros requisitos necessários para que haja decisão favorável ao feito.
 
E ainda, considera que a mera interposição de contestação não seria apta a interromper a contagem do tempo, a não ser que o réu da ação, reaveja a posse neste período.