As mais recentes interpretações mitigam o direito constitucional a imunidade na integralização de imóveis às sociedades que estejam sem receita operacional no período de análise da atividade preponderante
 
A norma imunizadora segundo a qual o ITBI – Imposto de Transmissão de Bens Imóveis- não incide sobre a transmissão de bens e direitos incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica em realização do capital social, e sobre as transmissões decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção da pessoa jurídica nunca gerou tantas dúvidas, cobranças indevidas e discussões judiciais.
 
Apesar do texto constitucional – art. 156, II, § 2º, I, CF, afastar a regra imunizante apenas às hipóteses de a atividade preponderante da empresa for a compra e venda desses, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil, os municípios têm ignorado as disposições da Carta Política.
 
Até pouco tempo, na prática, nos casos de integralização de capital social mediante a integralização de imóvel à pessoa jurídica, cabia aos fiscos municipais tão somente avaliar a preponderância imobiliária da pessoa jurídica beneficiária do patrimônio.
 
Ou seja, o ITBI seria devido apenas nos casos em que mais da metade da receita operacional da empresa receptora do bem decorresse de operações imobiliárias (compra, venda, locação e arrendamento mercantil de imóveis) em determinado período – três anos subsequentes para nova empresa ou empresa constituída há menos de dois e quatro anos, sendo os dois anteriores e os dois posteriores à admissão do patrimônio, para empresas constituídas há mais de dois anos. Ela também se aplicava nos casos de desincorporação do capital social mediante a transferência dos imóveis aos sócios decorrente de extinção total ou parcial da sociedade.
 
Entretanto, as mais recentes interpretações mitigam o direito constitucional a imunidade na integralização de imóveis às sociedades que estejam sem receita operacional no período de análise da atividade preponderante.
 
Não bastasse isso, recentemente o STF, ao julgar o RE 796.376/SC, abriu caminho para que os municípios possam cobrar ITBI sobre o valor dos bens imóveis que exceder o valor o montante efetivamente integralizado.
 
Feita esta introdução, cumpre enfrentar o tema do presente artigo, da inconstitucional exigência de ITBI sobre a transmissão de imóveis aos sócios, mediante desintegralização do capital social, seja em razão de pagamento de haveres por extinção parcial ou total da sociedade, exceto se o bem esteja retornando ao mesmo sócio que o integralizou.
 
Os municípios fundamentam o lançamento no ITBI na regra contida no parágrafo único do art. 36, do CTN.
 
O mencionado dispositivo legal, apesar de ter sido recepcionado pela Constituição Federal de 1988, com status de lei complementar, não possui o condão dar sentido ao texto constitucional, nem de limitá-lo, sobretudo quando se trata de regra imunizante.
 
A lei – seja ela ordinária ou complementar – não tem o condão de alargar as materialidades tributárias previstas na Constituição Federal, estas, como visto, são conceitos constitucionais apropriados pela Constituição do direito privado pré-constitucional.
 
O Código Tributário Nacional não tem força jurídica para restringir o enunciado imunizante do ITBI previsto na Constituição Federal em seu artigo 156, § 2º, I, o qual dispõe que não incide o Imposto sobre a transmissão de bens imóveis na transmissão de bens decorrente de extinção de pessoa jurídica.
 
A vigente Constituição Federal diz que o imposto não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.
 
Neste ponto, insta destacar que ao mencionar que o ITBI não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil, a Constituição Federal institui uma regra de imunidade, que se configura em restrição à regra de competência outorgada no seu art. 156, II. A imunidade é, portanto, uma exclusão do próprio poder de tributar. Partindo de tal premissa, há que se admitir que os Municípios, entes investidos do poder de instituir o ITBI, simplesmente não possuem o poder de instituir imposto sobre a transmissão de bens em virtude de extinção de pessoa jurídica.
 
O fato de serem os bens, na extinção da pessoa jurídica, transferidos aos mesmos alienantes, vale dizer, às mesmas pessoas que os incorporaram ao capital da pessoa jurídica, não está na hipótese de incidência da norma de imunidade em questão. Em outras palavras, na hipótese de extinção da pessoa jurídica é irrelevante quem seja o destinatário dos bens transferidos.
 
Portanto, para a fruição da imunidade constitucional do ITBI não há qualquer requisito ou condição, tampouco de que o bem a ser desincorporado tenha sido previamente integralizado pelo mesmo alienante. A regra disposta no parágrafo único do art. 36, do CTN, não pode desbordar dos limites constitucionais, criando condições não previstas na Carta Política de 1988. Ao se estipular regra que limita ou condiciona a imunidade, a legislação infraconstitucional acaba por instituindo tributo sobre fato que transcende à sua competência.
 
Assim, inconstitucionais quaisquer lançamentos tributários lavrados em virtude de transmissão de bens imóveis decorrentes de extinção de pessoa jurídica, ainda que destinados a pessoas diversas daquelas que os houveram incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica.