CGJ|SP: Organização do serviço – Solicitação de criação e vinculação de assuntos “inventário e partilha” e “alvará” na competência “28 – conciliação”, alterando a tabela local de classes e assuntos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, para permitir o processamento dessas pretensões em fase pré processual perante o CEJUSC da capital – Desconformidade com orientações da tabela unificada elaborada pelo CNJ, conforme resolução CNJ n° 46/07 – Impossibilidade de apontamento em certidão – Violação do disposto nos artigos 11 e 189 do novo Código de Processo Civil e no artigo 5º, LX, da Constituição – Incompatibilidade com os artigos 610, §§ 1° e 2°, e 731 a 734, todos do novo Código de Processo Civil – A autocomposição extrajudicial dessas pretensões somente é admitida perante Cartórios de Notas/escritura pública – Impossibilidade de interpretação extensiva ou analógica – Necessidade de preservação de interesses de terceiros (credores, erário e possíveis herdeiros) – Regra constitucional da publicidade dos atos processuais praticados – Necessidade de apontamento em certidão – Princípio constitucional da publicidade que rege todos os atos processuais (art. 5º, LX, CF) – Impossibilidade de acolhimento do pedido – Parecer pelo indeferimento do pedido, com sugestão de divulgação de orientação aos CEJUSCS do Estado.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Proc. n° 2017/1123797 (406/2017-3)
ORGANIZAÇÃO DO SERVIÇO. SOLICITAÇÃO DE CRIAÇÃO E VINCULAÇÃO DE ASSUNTOS “INVENTÁRIO E PARTILHA” E “ALVARÁ” NA COMPETÊNCIA “28 – CONCILIAÇÃO”, ALTERANDO A TABELA LOCAL DE CLASSES E ASSUNTOS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, PARA PERMITIR O PROCESSAMENTO DESSAS PRETENSÕES EM FASE PRÉ PROCESSUAL PERANTE O CEJUSC DA CAPITAL. DESCONFORMIDADE COM ORIENTAÇÕES DA TABELA UNIFICADA ELABORADA PELO CNJ, CONFORME RESOLUÇÃO CNJ N° 46/07. IMPOSSIBILIDADE DE APONTAMENTO EM CERTIDÃO. VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 11 E 189 DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E NO ARTIGO 5º, LX, DA CONSTITUIÇÃO. INCOMPATIBILIDADE COM OS ARTIGOS 610, §§ 1° E 2°, E 731 A 734, TODOS DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. A AUTOCOMPOSIÇÃO EXTRAJUDICIAL DESSAS PRETENSÕES SOMENTE É ADMITIDA PERANTE CARTÓRIOS DE NOTAS/ESCRITURA PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA OU ANALÓGICA. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DE INTERESSES DE TERCEIROS (CREDORES, ERÁRIO E POSSÍVEIS HERDEIROS). REGRA CONSTITUCIONAL DA PUBLICIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS PRATICADOS. NECESSIDADE DE APONTAMENTO EM CERTIDÃO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PUBLICIDADE QUE REGE TODOS OS ATOS PROCESSUAIS (ART. 5º, LX, CF). IMPOSSIBILIDADE DE ACOLHIMENTO DO PEDIDO. PARECER PELO INDEFERIMENTO DO PEDIDO, COM SUGESTÃO DE DIVULGAÇÃO DE ORIENTAÇÃO AOS CEJUSCS DO ESTADO.
Eximo. Des. Corregedor Geral da Justiça,
Trata-se de expediente autuado em razão de pedido formulado pelo MM. Juiz de Direito Coordenador do Centro Judiciário de Solução de Conflitos (CEJUSC) do Foro Central da Capital, com vistas a disponibilizar códigos taxonomicos para lançar no sistema informatizado oficial acordos celebrados no âmbito pré-processual na área de direito das sucessões. Questiona-se a ausência de indicação na tabela local taxonômica dos assuntos 7687-Inventário e Partilha e 10000481- Alvará na competência 28 – Conciliação.
A SPI 3 apurou, posteriormente, que os CEJUSCs do Estado tem processados pedidos de inventário, partilha e alvará não apenas na área do direito das sucessões, como, também, em pedidos envolvendo direito de família.
É o relatório.
Opinamos.
I. TABELA UNIFICADA DE CLASSES E ASSUNTOS DO TJ/SP
A SPI 3 informou, as fls. 24/24, que na tabela processual unificada vigente no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a competência “Conciliação” é composta pelas classes 11875-Reclamação Pré-Processual e 12136- Pedido de Mediação Pré-Processual. Essa nomenclatura foi adotada razão de organização estabelecida pela tabela de classes processuais da justiça estadual de 1º grau instituída pela Resolução CNJ n° 46/2007. Esclarece, ainda, que não houve autorização para que houvesse vinculação na tabela local dos assuntos “Inventário e Partilhas” à competência pré-processual em razão de expressa orientação do CNJ sobre a questão:
“Abrange as ações de inventário e partilha, arrolamentos, alvarás objetivando recebimento de valores que independem de inventário e sobrepartilha. Carregamento automático nas classes de inventário e partilha e arrolamento.”.
A SPI 3 afirma que muito embora seja possível a criação de novos assuntos na tabela local, é preciso atentar ao fato de que nenhuma das classes vinculadas à competência “28 – Conciliação” é apontada em certidão. Alerta para o risco de se vincular os assuntos “7687 – Inventário e Partilha” e “10000481 – Alvará” à competência “28-Conciliação”, que resultará na impossibilidade de se filtrar processos para que sejam apontados na certidão de inventário, arrolamentos e testamentos. Diante desta perspectiva, a SPI 3 indaga:
a) se é possível estabelecer vinculação entre classes de natureza pré-processual e assuntos pertencentes ao direito das sucessões e de família – como está sendo feito atualmente pelos CEJUSCs do Estado; e
b) se autorizado, se é possível liberar as mesmas classes para serem apontadas nas certidões de distribuição estadual.
Sobre a certidão relativa a processos de inventário, arrolamentos e testamentos, a SPI 3 declara:
“As ações referentes à Inventários, Arrolamentos e Testamentos são as que mais demandam busca específica em nossos registros, pela necessidade de providências junto ao registro de imóveis entre outras, interesses de herdeiros, mesmo após o decurso de anos de encerramento do inventário, razão pela qual a certidão específica também aponta ordinariamente os processos extintos.” (fl. 29) (negritamos).
Pondera, ademais que o acolhimento do pedido em discussão importará em autorização para que todos os CEJUSCs do Estado possam fazer uso das referidas classes, tendo dúvidas quanto à sua capacidade estrutural e de recursos humanos para condução desses pedidos.
A COORDENADORIA DO CENTRO JUDICIÁRIO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS E CIDADANIA DA CAPITAL opinou favoravelmente à criação do novo assunto, utilizando a sequência numérica 50000, sem apontamento em certidão, considerando o disposto na Res. 125/10, que impõe obrigação de observar a confidenciaiidade.
Para se analisar as questões em debate neste expediente, necessário se analisar, previamente, as normas que disciplinam a atuação dos CEJUSCs tanto na fase pré processual quanto processual e, ainda, as ações envolvendo partilha de bens atinentes a direitos sucessórios e de família.
II. CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO NO AMBITO DO NCPC
Sobre a atuação de conciliadores e mediadores o Novo Código de Processo Civil disciplina, em seus artigos 165 a 174, os princípios orientadores da atuação dos CEJUSCs:
“Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.
§ 1º A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça.
§ 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.
§ 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.”
Ainda sobre a confidencialidade que deve ser observada na fase de conciliação, é necessário observar o que dispõe o CPC:
“Art. 166. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada.
§ 1º A confidencialidade estende-se a todas as informações produzidas no curso do procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes.
§ 2º Em razão do dever de sigilo, inerente às suas funções, o conciliador e o mediador, assim como os membros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundos da conciliação ou da mediação.
§ 3º Admite-se a aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente favorável à autocomposição.
§ 4º A mediação e a conciliação serão regidas conforme a livre autonomia dos interessados, inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais.“ (negritamos).
Evidencia-se, portanto, que a confidencialidade mencionada peio legislador abrange, exclusivamente, às questões discutidas durante a atuação do conciliador/mediador, que é feita em ambiente informal em que as transações independem da participação de magistrados. Em momento algum o legislador afirmou que a referida confidencialidade estendia-se, também, à divulgação da ocorrência de ato processual em si.
Sobre a amplitude do direito à confidencialidade esclarece a doutrina: “Para que os participantes da sessão consensual possam negociar com abertura e transparência, é essencial que se sintam protegidos em suas manifestações e contem com a garantia de que o que disserem não será usado contra si em outras oportunidades. Assim, por exemplo, se infrutífera a tentativa consensual, a proposta feita na audiência de conciliação não deverá constar no termo (a não ser que as partes concordem). (…) O terceiro facilitador do diálogo não pode expor a outrem o teor do que ouviu nas sessões consensuais. (…) É importante a previsão de sigilo para evitar que, em um possível cenário litigioso posterior, busque-se arrolar o mediador/conciliador como testemunha para força-lo a expor o que ouviu nas sessões consensuais; tal medida merece ser veementemente rechaçada para evitar o comprometimento da confiabilidade da via consensual e do sigilo profissional.” (Teresa Arruda Alvim Wambier, Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini, Bruno Dantas Coordenadores, Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil, 2ª tiragem, RT, fls. 526/527).
Especificamente com relação às conciliações ou mediações realizadas em âmbito processual, o art. 334 do NCPC, que disciplina o rito comum, assim dispõe:
“Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.
§ 1º O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação ou de mediação, observando o disposto neste Código, bem como as disposições da lei de organização judiciária.
§ 2º Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à composição das partes.
§ 3º A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado.
4º A audiência não será realizada: I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual; II – quando não se admitir a autocomposição.
§ 5º O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu deverá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência.
§ 6º Havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser manifestado por todos os litisconsortes.
§ 7º A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos termos da lei.
§ 8º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem económica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.
§ 9º As partes devem estar acompanhadas por seus advogados ou defensores públicos.
§ 10. A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir.
§ 11. A autocomposiçao obtida será reduzida a termo e homologada por sentença.
§ 12. A pauta das audiências de conciliação ou de mediação será organizada de modo a respeitar o intervalo mínimo de 20 (vinte) minutos entre o início de uma e o início da seguinte.” (negritamos).
Depreende-se dos dispositivos indicados acima que muito embora o legislador admita e estimule a autocomposiçao no âmbito de relações jurídicas processuais, impõe que isso ocorra observando alguns preceitos. Desse modo, a autocomposiçao em fase processual somente ocorrerá após a distribuição do processo e será determinada pelo magistrado competente, a quem competirá encaminhar o feito ao CEJUSC.
É interessante observar que apesar de o legislador ter assegurado que as tratativas ocorridas perante o conciliador/mediador sejam protegidas pela confidencialidade (art. 165 do NCPC), expressamente impôs observância da regra da PUBLICIDADE a TODOS OS JULGAMENTOS dos órgãos do Poder Judiciário.
Nesse sentido, o art. 11 do NCPC:
“Art. 11 – Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentados todas as decisões, sob pena de nulidade.”.
A regra da publicidade dos julgamentos consiste, ademais, em direito constitucional fundamental de 1ª geração, assegurado no art. 5º, LX da Constituição Federal:
“Art. 5º. (…) LX – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; (…)”.
Sobre o direito constitucional à publicidade dos atos processuais esclarece a doutrina: “Ponto fundamental da democracia representativa é a transparência da conduta dos agentes públicos em geral, eleitos ou não, com a possibilidade de fiscalização pelos cidadãos de seus atos, que, em regra, deverão ser públicos e acessíveis a todos do povo. A publicidade serve de antídoto para evitar abusos, desencoraja-os; permite a identificação das partes dos processos, evitando privilégios, além de estimular a confiança da população na justiça do país. Revela destacar que, no âmbito judicial, a publicidade constitui elemento essencial para o controle das partes e da opinião pública no que se refere ao cumprimento em geralmrdia das garantias fundamentais estabelecidas na Constituição Federal. Justamente por isso é estabelecida a ampla publicidade dos atos processuais, salvo hipóteses excepcionais, as quais serão examinadas adiante (art. 189).” (Teresa Arruda Alvim Wambier, Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini, Dantas Coordenadores, Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil, 2ª tiragem, RT, fl. 83).
Evidencia-se, portanto, que a publicidade dos atos processuais é necessária não apenas para dar ciência às partes da forma como o feito está tramitando, mas, em última análise, para permitir à sociedade brasileira em geral que, a qualquer momento, e independentemente de qualquer solicitação, possa monitorar a atuação do Poder Judiciário e verificar o seu comprometimento e adesão às garantias e direitos constitucionais. A publicidade de atos processuais consiste, desse modo, em importante ferramenta para permitir a prestação contínua e transparente de contas à sociedade, corroborando de forma inequívoca para a credibilidade institucional do Poder Judiciário, não comportando mitigações.
É interessante observar que mesmo para os casos em que o legislador admitiu que os feitos tramitassem em sigilo, o legislador se preocupou em assegurar que a atuação do Poder Judiciário constasse em certidão, considerando a necessidade de resguardar eventual interesse de terceiro. Nesse sentido, o art. 189, § 2° do NCPC:
“Art. 189. Os atos processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os processos:
I – em que o exija o interesse público ou social;
II – que versem sobre casamento, separação de corpos, divórcio, separação, união estável, filiação, alimentos e guarda de crianças e adolescentes;
III – em que constem dados protegidos pelo direito constitucional à intimidade;
IV – que versem sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de carta arbitral, desde que a confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo.
§ 1º O direito de consultar os autos de processo que tramite em segredo de justiça e de pedir certidões de seus atos fé restrito às partes e aos seus procuradores.
§ 2º O terceiro que demonstrar interesse jurídico pode requerer ao juiz certidão do dispositivo da sentença, bem como de inventário e de partilha resultantes de divórcio ou separação.“ (negritamos).
O dispositivo acima transcrito evidencia a importância de que todos os feitos que tramitem perante o Poder Judiciário constem em certidões, tratando-se de medida necessária para viabilizar que eventuais terceiros interessados possam identificar esses feitos e adotar as medidas que reputarem necessárias para preservar o seu direito.
Sobre a questão, esclarece a doutrina: “É preciso interpretar extensivamente o dispositivo, que usa o vocábulo “sentença”, sendo certo que pode haver interesse do terceiro na obtenção de certidão alusiva a decisões interlocutórias (por exemplo, decisões que resolvem parcialmente o mérito, que afetem direta ou reflexamente o interessado, a despeito de não se configurarem “sentença”) ou acórdãos. Toda decisão judicial exarada em processo que corre sob o regime de segredo de justiça pode ensejar o requerimento de certidão do respectivo dispositivo pelo terceiro interessado.” (Teresa Arruda Alvim Wambier, Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini, Bruno Dantas Coordenadores, Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil, 2ª tiragem, RT, fl. 590).
Tendo em vista o acima exposto, razoável concluir que todo e qualquer ato processual, praticado no âmbito de relação jurídica processual, tem, necessariamente, que ser publicado, exceto situações excepcionais, indispensáveis para assegurar a defesa da intimidade ou o interesse social. Destaca-se, contudo, que mesmo nesses casos esses feitos devem constar em certidão.
A sentença proferida por magistrado é um ato processual e, consequentemente, deve ser proferida no âmbito de relação jurídica processual previamente instaurada em razão de demanda específica, devidamente publicada, constando em certidão expedida pelo tribunal, observando-se o disposto no art. 5º, LX da CF e artigos 11 e 189 do NCPC.
III. CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO MO ÂMBITO DO CEJUSC – FASE PRÉ PROCESSUAL
Apurou-se, neste expediente, que os pedidos de transação, realizados no âmbito do CEJUSC, na fase pré-processual, não são distribuídos no sistema SAJ e, também, não apontam em certidões, ainda que haja prolação de sentença homologatória de acordo por magistrado.
Entendemos que é necessário distinguir entre atos realizados objetivando alcançar a composição dos interesses das partes da sentença homologatória de acordo.
Qualquer parte pode, a qualquer momento, em qualquer instância, judicial ou extrajudicialmente, transacionar com a parte contrária direitos disponíveis.
Não há necessidade, para que haja a autocomposição de interesses, da autuação de magistrado.
A homologação de acordo por magistrado, contudo, qualifica o acordo de vontade celebrado entre as partes, transforma-o em título executivo judicial, habilitando o credor a adotar medidas de constrição no património do devedor, dispensando-o de comprovar a existência de seu crédito.
Desse modo, a atuação do Poder Judiciário na composição de direitos individuais entre partes permite a intervenção estatal na esfera jurídica de indivíduo, qualificando o respectivo documento e, em especial, a pretensão do credor. Necessário, portanto, diante da gravidade desse efeito, que seja possível a fiscalização da sociedade civil como um todo, para monitorar não apenas a atuação de magistrados, mas, sobretudo, do correto emprego do poder estatal pelos cidadãos. Foi justamente por esse motivo que a Constituição Federal impôs a todos os atos do Poder Judiciário a característica da publicidade.
Considerando, portanto, o princípio da PUBLICIDADE, que orienta todos os atos do Poder Judiciário, deve-se entender que os atos realizados na fase pré processual pelos CEJUSC poderão ser mantidos “não públicos” até que haja prolação de sentença homologatória de acordo.
Proferida a sentença, contudo, impõe-se a sua publicidade. A publicidade de atos processuais – por registro no sistema SAJ e por apontamento em certidão – é necessária pois:
a) Permite o conhecimento da decisão judicial por terceiros de terceiros (credores, erário, herdeiros desconsiderados, etc);
b) Permite a terceiros e aos magistrados em geral verificar a ocorrência de coisa julgada;
c) Evita fraudes por desconhecimento de prévio acordo sobre de terminada questão homologado judicialmente.
Observou-se, no âmbito da Corregedoria Geral da Justiça, a prática por maus profissionais da advocacia em conluio com profissionais de partes rés de celebrar acordos com o intuito exclusivo de aferir honorários advocatícios, utilizando o Poder Judiciário de forma predatória. Tal prática não apenas não representa verdadeira lide, como, também, impõe serviço irracional aos cartórios judiciais.
A falta de apontamento de acordos celebrados na fase pré processual pelos CEJUSC potencializa essa má prática, ao permitir que, no âmbito do Poder Judiciário, exista zona “cinzenta” em que não exista registro dos acordos homologados judicialmente, inviabilizando o controle centralizado dessas ações pela Corregedoria/alta administração do TJSP.
Conclui-se, portanto, diante do acima exposto, que o princípio constitucional da publicidade dos atos judiciais impõe que qualquer acordo homologado por juiz, ainda que na fase pré processual, seja registrado no sistema SAJ e que aponte em certidão, quando o caso.
Na hipótese, contudo, de que os acordos sejam simplesmente formulados perante conciliadores, na fase pré-processual, sem que haja respectiva sentença homologatória, dispensa-se o registro no sistema SAJ e o apontamento em certidão.
IV. AÇÕES ATINENTES A DIREITOS SUCESSÓRIOS E DE FAMÍLIA: POSSIBILIDADE DE AUTOCOMPOSIÇÃO NO CEJUSC
A SPI 3 relata, as fls. 33/35, que em diversos feitos do CEJUSC nas áreas de família e sucessão foram proferidas sentenças homologatórias no bojo de sua atuação pré processual.
A consequência dessa situação em ações envolvendo partilha de bens ou mudança de regime de casamento é grave, conforme alertado pela SPI3: esses feitos – e, consequentemente, a informação quanto aos respectivos acordos – não constarão em certidão.
A questão que remanesce cinge-se à possibilidade de autocomposição em questões envolvendo partilha de bens e mudança de regime de casamento em ações sucessórias/família no âmbito dos CEJUSCs, na fase pré processual.
O art. 610 do NCPC afirma que havendo testamento ou interessado incapaz proceder-se-á ao INVENTÁRIO JUDICIAL, ou seja, impõe a constituição de relação jurídica processual. O legislador excepciona a necessidade de submissão ao procedimento judicial na hipótese dos parágrafos §§1º e 2º do mesmo dispositivo legal:
“Art. 610. (…)
§ 1º Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.
§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.”
Da análise do dispositivo transcrito acima, evidencia-se que o legislador disciplinou as hipóteses em que admite a autocomposição extrajudicial sobre direitos sucessórios, e, mesmo nesse caso, disciplinou as formalidades que deverão ser observadas pelas partes para que o respectivo negócio jurídico seja válido, regular e eficaz – sobretudo perante terceiros interessados (herdeiros desconhecidos e credores do de cuius, por exemplo).
É importante lembrar que o objetivo do inventário não se circunscreve, apenas, à imputação de bens aos herdeiros, mas, sobretudo, a identificação dos credores do falecido e do seu pagamento. Somente após a liquidação do passivo é que se poderá conceber a distribuição de ativos entre herdeiros. Essa peculiaridade justifica a necessidade de observância às formalidades impostas pelo legislador, para preservar interesse de terceiros.
Sobre a questão, esclarece a doutrina: “O procedimento de inventário e partilha pode ser extrajudicial (CPC, art. 610 e §1°, Res. CNJ 35/2007, arts. 11 a 32) ou judicial. Sendo judicial, seguirá conforme o caso o rito: i) litigioso (CPC, arts. 615 a 658), nas hipóteses em que há conflito entre sucessores; ii) do arrolamento sumário (CPC, arts. 659 a 663), para os casos em que, independentemente do valor do acervo hereditário, os sucessores sejam capazes e estejam de acordo com a partilha amigável; ou iii) do arrolamento simples (CPC, art. 664), quando, independentemente de serem ou não capazes os sucessores, o valor total da herança não superar mil salários mínimos.” (Teresa Arruda Alvim Wambier, Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini, Bruno Dantas Coordenadores, Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil, 2ª tiragem, RT, fl. 1516).
E, ainda: “O inventário extrajudicial é feito por escritura pública, lavrada em Tabelionato de Notas. Tem como requisitos: i) que todos os herdeiros sejam capazes, concordes, individual ou comum; ii) que o de cujus não tenha deixado testamento. (…) A redação do CPC/2015 não contemplou a gratuidade da escritura e demais atos notariais, ao contrário do condito no art. 982, §2°, do CPC/1973. Mesmo preenchendo os requisitos para a via extrajudicial, os herdeiros podem promover o inventário judicialmente (CPC, art. 610, §1°, Res. CNJ 35/2007, art. 2º). A modalidade extrajudicial é, portanto, facultativa.” (Teresa Arruda Alvim Wambier, Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini, Bruno Dantas Coordenadores, Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil, 2ª tiragem, RT, fl. 1516).
Em recente manifestação, a Corregedoria Geral da Justiça admitiu a realização de inventário perante Tabelionatos de Notas, em casos de autocomposição, mesmo no caso em que houvesse testamento, alterando a redação do item 129 e subitens do Capítulo XIV, Tomo II das NSCGJ.
Muito embora a relativização admitida pela Corregedoria, manteve-se a orientação do legislador para que a autocomposição ocorresse exclusivamente perante Tabelionatos de Notas, com respectiva alteração de norma, mantendo a necessidade de distribuição de feitos, no âmbito judicial.
Tendo em vista o acima exposto, razoável concluir que a autocomposição entre todos os herdeiros em partilha de bens no âmbito pré processual somente terá validade jurídica se realizada perante tabelionato de notas.
Desconsiderada a hipótese de encaminhamento da pretensão a Tabelionato de Notas, o legislador expressamente determinou a observância de um dos procedimentos PROCESSUAIS a seguir listados:
a) Rito litigioso (quando houver conflito entre herdeiros);
b) Arrolamento sumário (quando houver herdeiros capazes e acordo quanto à partilha amigável);
c) Arrolamento simples (independentemente da capacidade dos herdeiros, se o valor da herança for inferior a 1000 salários mínimos).
É possível, dentro dos procedimentos judiciais mencionados acima que haja encaminhamento ao CEJUSC. É imperioso, contudo, que haja PRÉVIA DISTRIBUIÇÃO da ação. Em outras palavras, é inviável, com relação a esses assuntos, a atuação do CEJUSC na fase pré processual, apenas mediante a presença de conciliadores/mediadores.
O rigor do legislador quanto à composição em partilha de bens decorrentes de herança se justifica, conforme já aventado, diante do potencial interesse de terceiros, sejam possíveis credores (inclusive o Erário, beneficiário de imposto de transmissão de bens em razão da herança), sejam possíveis herdeiros desconsiderados. Desse modo, mesmo que diante da autocomposição de herdeiros capazes, o legislador somente facultou duas hipóteses para sua válida celebração: ou será feita extrajudicialmente, e, nesse caso, perante Tabelião de Notas, ou será feita judicialmente, na presença de magistrado.
Em ambos os casos o legislador designou agente público responsável peia fiscalização do pagamento de impostos e, ao mesmo tempo, assegurou mecanismos para que terceiros possam ter conhecimento quanto à sua existência: seja por meio de pesquisa em cartórios de Notas (se extrajudicial), seja por meio de pesquisas em certidões judiciais (se judiciais).
Vale destacar, por fim, que em momento algum, quando disciplinaram inventários, alvarás ou divórcio, as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, Tomo I, admitiriam que fossem conduzidos na fase pré processual.
Nesse sentido, os artigos 217 e seguintes:
“Subseção X Do Processo de Conversão de Separação Judicial em Divórcio
Art. 217. Os processos de conversão de separação judicial em divórcio, havendo concordância dos interessados e salvo determinação judicial em contrário, prescindirão do apensamento dos autos da separação ou desquite, bastando, para sua instrução, a certidão da sentença ou da sua averbação no assento de casamento, tal como previsto no art. 47, da Lei n° 6.515, de 26 de dezembro de 1977.
Subseção XI Da Solicitação de Informações sobre a Existência de Testamentos ao Colégio Notarial do Brasil
Art. 218. Requerido o inventário, os juízes requisitarão ao Colégio Notarial do Brasil, Conselho Federal, informação sobre a existência de testamento.
Subseção XII Dos Alvarás Judiciais Requeridos em Processos de Inventário e Arrolamento
Art. 219. Requerimento de alvará formulado por inventariante, herdeiro ou sucessor, relativo a processo de inventário ou arrolamento, findo ou não, será juntado aos autos respectivos independentemente de distribuição; quand