Aquisição de terras por estrangeiros é um tema controverso que está na pauta do Legislativo há bastante tempo e sem previsão de solução
 
A lei que regula a aquisição de terras rurais por estrangeiros data de 1971 (Lei no 5.709) e, desde então, vem sendo muito debatida. Em 1993, através da Lei no 8.629, as limitações impostas à aquisição de terras foram estendidas para o arrendamento, dificultando ainda mais a exploração de terras rurais por estrangeiros.
 
Com a Constituição de 1988, que estabeleceu o conceito de empresa brasileira, veio a dúvida se a pessoa jurídica que tivesse em seu quadro social pessoa estrangeira detendo a maioria do capital social teria ou não restrição de aquisição e arrendamento de imóvel rural.
 
Entre 1994 e 2010, a Advocacia-Geral da União (AGU) emitiu quatro pareceres. Os três primeiros permitiam a aquisição de terras por empresa brasileira com a maioria de capital estrangeiro. Já o último parecer, de no 001/2008, publicado em 2010, entendeu pela aplicação das restrições da lei 5.709 de 1971 a essas empresas nacionais com maioria de capital estrangeiro.
 
Como se pode ver do histórico legislativo, a aquisição de terras rurais por estrangeiros é um dos temas controversos que estão na pauta do Legislativo há bastante tempo e sem previsão de solução a curto prazo.
 
Buscando segurança jurídica nesse processo de aquisição a fim de estimular a entrada de capital estrangeiro no agronegócio do país, existem inúmeros projetos de lei que tratam desse tema e que buscam alterar a legislação atual no que se refere à aquisição e ao arrendamento de imóvel rural por estrangeiro ou empresa brasileira com capital e/ou controle estrangeiro. Como citado antes, a Advocacia-Geral da União  complicou a situação com a publicação do parecer no 001/2008.
 
A principal diretriz do documento é a restrição à aquisição de terras por sociedades que tenham controle estrangeiro. Isso gerou discussões sobre o conceito de controle estrangeiro, assim como a competência do registrador e do tabelião na interpretação de controle societário para fins de aquisição e arrendamento de imóvel rural.
 
Além disso, esse parecer da AGU criou um problema nas operações de crédito rural com bancos estrangeiros, uma vez que as garantias de terras ofertadas não seriam registráveis/executáveis.
 
Também há a morosidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária  (Incra) em autorizar ou negar operações envolvendo capital estrangeiro no processo administrativo de sua competência.
 
Esse cenário é o pior possível para um setor essencial à economia brasileira. A resposta frente à inércia legislativa é a busca de mecanismos não vedados expressamente por lei ou atos normativos para receber o investimento estrangeiro no campo, o que está longe de ser o ideal e encarece as operações, que deveriam ser simples.
 
Esses mecanismos são estruturados através de, por exemplo, contratos de parceria rural, contratos de direito de superfície e emissão de debêntures conversíveis em ações. Todos, sem exceção, visam à exploração da terra sem efetivamente adquiri-la ou arrendá-la de imediato. Certas estruturas mais arriscadas funcionam com aquisições de ações de sociedades que mantêm imóveis rurais em seu ativo por não passarem por um crivo do registro de imóveis.
 
Mesmo dentro de um ambiente hostil e imprevisível como o atual, os investimentos estrangeiros estão presentes no país, mas, certamente, em escala muito menor do que o setor demanda e a um custo alto diante dos riscos envolvidos.
 
De maneira análoga a outros setores regulados, a falta de segurança jurídica inibe e encarece os investimentos. É mais uma pauta legislativa essencial para o país.
 
*Viviane Castilho é advogada, responsável pela área de direito societário da Guedes Nunes, Oliveira e Roquim – Sociedade de Advogados. Este artigo foi publicado originalmente em agosto de 2018, na edição nº 394 da Revista Globo Rural. **Colaborou Luiz Ernesto de Oliveira, sócio responsável pela área de direito societário da Guedes Nunes, Oliveira e Roquim – Sociedade de Advogados.