É pacífico o posicionamento do Poder Judiciário no sentido de que aquele que utiliza imóvel comum, de forma exclusiva, deve arcar com o custeio das despesas oriundas do uso do bem, mesmo que a aquisição de tal patrimônio seja derivada de herança ou até mesmo de relação familiar anterior.
 
Isso porque é devida uma contrapartida (aluguel ou indenização) aos demais coproprietários-condôminos, dos quais é possível destacar os herdeiros ou os ex-cônjuges/companheiros, por serem tolhidos da própria posse do bem e da percepção de eventuais frutos civis. Tal alternativa é cabível sob pena de prejuízo àqueles que estejam privados de usar o imóvel, pois dividirão despesas sem contraprestação e de vantagem direcionada àquele que usufrui diretamente do bem, já que, de certa forma, sobreviverá à custa alheia.
 
Além disso, seria demasiadamente absurdo impor aos demais coproprietários-condôminos, privados da utilização do bem, que arquem com as verbas condominiais e, até mesmo, o IPTU – Imposto Predial Territorial Urbano – relativo ao imóvel, já que tal obrigação incumbe apenas ao possuidor direto.
 
Referida situação pode ser observada, de forma análoga, nas relações locatícias em que o locador resta contratualmente dispensado de arcar com as despesas condominiais e tributárias do bem, recebendo alugueres em virtude de ter cedido a utilização direta ao locatário. Por que seria diferente nas relações originadas por um vínculo familiar anterior ou, ainda, decorrentes de elo sucessório, já que se está em voga a posse direta de bem imóvel?
 
Imaginemos a seguinte situação: determinado casal, que adquiriu imóvel durante a constância da união conjugal, se divorcia sem partilhar o bem, estabelecendo-se, então, relação condominial. Decide-se que um dos ex-cônjuges irá permanecer no bem, utilizando-o de forma exclusiva, bem como que o outro deverá procurar um novo local para residir, arcando com todas as despesas de sua nova vida.
 
O Superior Tribunal de Justiça resolveu tal impasse no Recurso Especial nº 1.375.271. Os ministros decidiram que o ex-cônjuge que utilizava o bem de forma exclusiva deveria arcar com indenização, em favor do outro, correspondente a metade do valor da renda do aluguel apurado. Isso para evitar o enriquecimento sem causa da ex-esposa e o prejuízo integral do ex-marido que deixou o lar conjugal.
 
Outra situação interessante pode ser aqui apontada: determinado herdeiro utiliza exclusivamente bem pertencente ao acervo do espólio. Porém, por outro lado, os demais herdeiros, além de se verem impedidos de usar o imóvel, não podem locá-lo a terceiros e, ainda, precisam arcar com as despesas condominiais e tributárias do bem, que atingirão diretamente sua quota parte sucessória, em virtude da relação condominial que possuem entre si, bem como do conhecido dever do espólio de suportar as dívidas do falecido até os limites da herança.
 
A Corte Superior do STJ sabiamente solucionou o impasse acima descrito, por meio do julgamento recentíssimo do Recurso Especial nº 1.704.528, impondo o dever de custeio das despesas ordinárias do bem, como prestação condominial e pagamento de IPTU à herdeira inventariante. Ela utilizava o bem de forma exclusiva, também com o principal objetivo de evitar o enriquecimento ilícito, já que não seria razoável imputar aos demais herdeiros tal obrigação, principalmente pela inventariante não pagar aluguel aos demais pelo uso exclusivo.
 
Portanto, pelo que se pode concluir, aqueles que utilizam imóvel comum de forma exclusiva devem estar atentos. Não se pode presumir uma chamada “gratuidade” no uso do bem, pois o suporte de suas despesas ordinárias e, até mesmo, a contraprestação (aluguel ou indenização) pelo uso é o que se impõe nos casos levados a julgamento.
 
*Paula Dias Cruz é advogada do Departamento de Família e Sucessões do escritório Braga Nascimento e Zílio. Especialista em Direito Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós-graduanda em Direito de Família e Sucessões pela Escola Paulista de Direito.