Tributo – ITCMD – Doação – Casal donatário – Falecimento de um dos cônjuges – Totalidade da doação para o cônjuge sobrevivo – ITCMD – Impossibilidade – Lançamento do tributo provocado por erro e omissão do contribuinte – Ônus da sucumbência – Princípio da causalidade – Possibilidade – Doado o bem em favor do casal, a subsistência da doação na totalidade para o cônjuge supérstite não caracteriza fato gerador do ITCMD – Pelo princípio da causalidade a parte que deu causa à instauração do processo arca com o pagamento dos ônus da sucumbência. (Nota da Redação INR: ementa oficial)
ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação Cível nº 1042941-27.2016.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO e ESTADO DE SÃO PAULO, é apelada VERA NOGUEIRA FERRAZ.
ACORDAM, em 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento em parte ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores TERESA RAMOS MARQUES (Presidente), PAULO GALIZIA E ANTONIO CARLOS VILLEN.
São Paulo, 10 de junho de 2019.
Teresa Ramos Marques
RELATOR
Assinatura Eletrônica
10ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO
APELAÇÃO CÍVEL: 1042941-27.2016.8.26.0053
APELANTE: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
APELADO: VERA NOGUEIRA FERRAZ
JUIZ PROLATOR: EDSON NAKAMATU
COMARCA: SÃO PAULO
VOTO Nº 22.580
EMENTA
TRIBUTO
ITCMD – Doação – Casal donatário – Falecimento de um dos cônjuges – Totalidade da doação para o cônjuge sobrevivo – ITCMD – Impossibilidade – Lançamento do tributo provocado por erro e omissão do contribuinte – Ônus da sucumbência – Princípio da causalidade – Possibilidade:
– Doado o bem em favor do casal, a subsistência da doação na totalidade para o cônjuge supérstite não caracteriza fato gerador do ITCMD.
– Pelo princípio da causalidade a parte que deu causa à instauração do processo arca com o pagamento dos ônus da sucumbência.
RELATÓRIO
Vera Nogueira Ferraz demanda contra a Fazenda do Estado a declaração de inexigibilidade do ITCMD lançado por meio de AAIM, bem como o cancelamento do respectivo protesto.
Sentença de procedência, para determinar o cancelamento do auto de infração e do protesto, ante a declaração de inexigibilidade da dívida. Honorários advocatícios fixados em R$3.000,00.
Apela a Fazenda do Estado, alegando que os fatos narrados pela autora e que embasaram a sentença referem-se ao AIIM 4.069.022-2, já cancelado administrativamente pela Secretaria da Fazenda em 23.5.2016. A autora apontou em sua declaração do imposto de renda 2010/2009 o valor de R$1.128.864,18, a título de doação recebida de sua sogra no ano de 2009, caracterizando o fato gerador do ITCMD. Não foram encontrados registros do recolhimento do imposto referente às doações mencionadas, motivo pelo qual foi lavrado o AIIM. A autora deve responder pela sucumbência em razão do princípio da causalidade.
Foram apresentadas as contrarrazões (fls.330/334).
FUNDAMENTOS
A pretensão envolve o cancelamento do protesto relativo ao AIIM 4.051.005, conforme se denota da respectiva certidão (fls.15), portanto não beneficia a apelante a alegação de que a demanda envolve o AIIM 4.069.022-2, já cancelado administrativamente.
O AIIM em questão tem por fundamento o não pagamento do ITCMD decorrente de suposta transferência de patrimônio verificada na declaração do IRPF 2009/2010 prestada pela autora, ora apelada. No campo “Rendimentos Isentos e Não Tributáveis Transferências patrimoniais”, subcampo “doações, heranças, meações e dissolução da sociedade conjugal ou unidade familiar”, a autora declarou o valor de R$1.128.864,18 (fls.220), especificando a informação no campo “Declaração de Bens e Direitos”, a saber:
50% da cota parte do espólio do esposo Carlos Nogueira Ferraz filho, recebido como doação de Wanda Nogueira Ferraz, sito à Rua Professor Guilherme Milward, 297-Butantã, conf escritura R$200.081,28.
50% da cota parte da Fazenda Santa Tereza da Serra, localizada no município de Santa Cruz das Palmeiras-SP, do espólio do esposo Carlos Nogueira Ferraz Filho, recebido como doação de Wanda Nogueira Ferraz, conforme escritura. R$928.798,90
Os documentos que instruem a inicial demonstram que a autora e seu marido receberam referidas cotas-partes por doação formalizada em novembro de 1987, conforme escrituras públicas que instruem a inicial (fls.114/127).
Portanto, figurando o casal como donatário, com a morte do marido da autora subsiste a doação na totalidade em favor desta, conforme disposto no art.551, par.único, do Código Civil, in verbis:
Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-se distribuída entre elas por igual.
Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo.
Não se trata de doação ou sucessão, motivo pelo qual não há a incidência do ITCMD.
Importante observar que os documentos que instruem a inicial comprovam o recolhimento do ITBI que incidiu à época sobre a doação (Lei Estadual 9.591/66), nos valores de Cz$ 49.620,66 e Cz$ 42.647,80, referentes, respectivamente, aos imóveis rural e urbano, conforme consignado nas respectivas escrituras pelo notário (fls.120 e 127), que tem fé pública. Também consta dos autos a guia de recolhimento do ITBI referente ao imóvel urbano (fls.175).
Portanto, recolhido o imposto devido à época da doação, a cobrança ora efetuada pela Fazenda do Estado configura bitributação vedada pela legislação vigente.
A inexigibilidade do tributo também decorre do art.150, inc.III, al.”a”, da Constituição Federal, pois quando da ocorrência do fato gerador, em 1987, não havia previsão para o pagamento do ITCMD.
Embora indevida a cobrança, não se pode olvidar que foi a autora que deu causa à demanda, pois informou em sua declaração do imposto de renda a propriedade das cotas-partes de forma extemporânea e equivocada, como transferência patrimonial do espólio de seu marido.
E, quando notificada sobre a autuação, não informou em sua defesa administrativa o recebimento dos bens por doação, em favor do casal (autora e marido), no ano de 1987; tampouco explicou a omissão dos referidos bens no espólio de seu marido (fls.229/231).
Portanto, à luz do princípio da causalidade, responde a autora pelos ônus da sucumbência em razão dos equívocos e omissões apontados.
Destarte, pelo meu voto, dou parcial provimento ao recurso, tão somente para inverter os ônus da sucumbência.
TERESA RAMOS MARQUES
RELATORA – – /