Apelação Cível nº 1048498-06.2016.8.26.0114
Apelante: Matheus Maccari Neto
Apelado: 1° Oficial de Registro de Imóveis de Campinas
VOTO Nº 37.765
Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Carta de sentença extraída de ação de divórcio consensual – Partilha desigual em razão de liberalidade do cônjuge – Título que faz presumir a existência de doação – Necessidade de comprovação da declaração e do recolhimento do Imposto de Transmissão “causa mortis” e de Doação – ITCMD, ou de demonstração de sua isenção – Recurso não provido.
Trata-se de apelação interposta contra r. sentença que julgou procedente a dúvida e manteve a recusa do registro nas matrículas nºs 113.259, 113.260, 113.261, 113.262, 121.058 e 121.060 do 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, da partilha de bens realizada em ação de divórcio consensual em que, apesar da atribuição de patrimônio com valor desigual a cada um dos ex-cônjuges, não foram promovidos a declaração e o recolhimento do Imposto de Transmissão “causa mortis” e de Doação – ITCMD, ou demonstrada a sua isenção.
O apelante alegou, em suma, que em razão da compensação decorrente da atribuição aos cônjuges de bens com valores desiguais foram promovidos a declaração e o pagamento do Imposto de Transmissão “inter vivos” – ITBI. Afirmou que foi adotado o regime da comunhão parcial e que a universalidade dos bens partilhados, adquiridos durante o casamento, somente se extinguiu com a partilha que englobou o ativo e o passivo, ou seja, os bens e as dívidas comuns do casal. Esclareceu que os bens partilhados têm valor total de R$ 8.971.709,39 e que na partilha recebeu bens com valor de R$ 5.721.709,39, ao passo que os atribuídos à sua ex-esposa somam R$ 3.250.000,00. Contudo, assumiu a obrigação de pagar a totalidade das dívidas comuns, de R$ 4.236.794,80, o que caracterizou a reposição onerosa de bens em favor de sua ex-esposa, na forma de dação em pagamento, e ensejou a declaração e o pagamento do Imposto de Transmissão “inter vivos” – ITBI. Aduziu que a inexistência de transmissão gratuita afasta a incidência do imposto sobre doação e, portanto, a declaração e o recolhimento do ITCMD. Requereu o provimento do recurso para que seja promovido o registro da partilha (fls. 209/222).
A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 252/254).
É o relatório.
Foi apresentada para registro a carta de sentença extraída de ação de divórcio consensual, Processo nº 0004611-71.2013.8.08.0024 da 3ª Vara da Família da Comarca de Vitória, Espírito Santo (fls. 20 e seguintes), em que foram partilhados os bens móveis e imóveis relacionados às fls. 24/28.
O quadro demonstrativo apresentado às fls. 8 e 157/158 mostra que os bens partilhados somam R$ 8.971.709,39, sendo que os atribuídos ao apelante têm valor de R$ 5.721.709,39 e os pertencentes à sua ex-esposa totalizam R$ 3.250.000,00.
Por sua vez, o apelante assumiu a obrigação de pagar a totalidade dos débitos comuns do casal, de R$ 4.236.794,80 (fls. 08, 28/29 e 159).
Ocorre que na partilha não foi prevista a reposição em favor da ex-esposa da diferença entre valor total dos bens partilhados e o daqueles que lhe foram atribuídos (fls. 21/30 e 122/123), o que faz presumir a existência de doação.
As obrigações comuns, por seu lado, não alteram a base de cálculo do Imposto de Transmissão “causa mortis” e de Doação – ITCMD, porque o art. 12 da Lei nº 10.705/2000 dispõe que em seu cálculo não serão abatidas as dívidas que onerem os bens transmitidos:
“Artigo 12 – No cálculo do imposto, não serão abatidas quaisquer dívidas que onerem o bem transmitido, nem as do espólio“.
Ademais, neste caso concreto a obrigação de comprovar a declaração e o recolhimento do ITCMD não se modificaria pela existência de dívidas comuns que foram integralmente assumidas pelo apelante, pois se forem abatidas haverá inversão do resultado patrimonial da partilha, com atribuição de bens de maior valor à ex-esposa e a consequente permanência da obrigação de declarar e recolher o Imposto de Transmissão “causa mortis” e de Doação – ITCMD pela inexistência de reposição do patrimônio do outro cônjuge.
Por seu lado, o fato do apelante assumir integralmente as dívidas do casal, sem integral abatimento nos valores dos bens atribuídos à ex-esposa, não caracteriza reposição onerosa do patrimônio e, portanto, não afasta a incidência do ITCMD.
Assim porque a reposição do patrimônio, para efeito de apuração do imposto devido, ocorre mediante negócio jurídico bilateral, oneroso e comutativo.
Contudo, na forma como realizada, a partilha faz presumir a existência de doação porque não há previsão de que o patrimônio do outro cônjuge, correspondente à diferença entre a metade dos bens comuns do casal e o valor que efetivamente recebeu, será recomposto mediante pagamento em dinheiro, ou por outro modo equivalente.
Disso decorre a presunção da existência de negócio jurídico de doação que, conforme o art. 538 do Código Civil:
“Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra“.
A partilha realizada também não importou em dação em pagamento que consiste em acordo pelo qual o credor, para a extinção da obrigação, concorda em receber prestação diversa da que lhe é devida, ou como disposto no art. 356 do Código Civil:
“Art. 356. O credor pode consentir em receber prestação diversa da que lhe é devida“.
Por essas razões, mostra-se correta a exigência de comprovação da declaração e pagamento do Imposto de Transmissão “Causa Mortis” e de Doação – ITCMD, ou do reconhecimento de sua isenção, como requisito para o registro da partilha.
Ante o exposto, mantenho a recusa do registro e, em consequência, nego provimento ao recurso.
GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO
Corregedor Geral da Justiça e Relator