Processo 0022068-71.2019.8.26.0100
Pedido de Providências
REGISTROS PÚBLICOS
C.G.J. – T.N.C.
F.E.L.
Vistos.
Trata-se de pedido de providências provocado por F.E.L. em face da XXª Tabeliã de Notas da Capital, questionando a lavratura de ata notarial por aquela Serventia Extrajudicial, a pedido de A. A. A. de C. F., em que teriam sido transcritos diálogos extraídos de aparelho celular.
A Senhora Tabeliã manifestou-se às fls. 637 e 641/661.
Sobreveio nova manifestação da reclamante (fls. 670/749).
Designada audiência, foram ouvidos C. L. G. e A. M. S. S., escrevente e Tabelião Substituto, respectivamente (782/787).
A D. Representante do Ministério Público manifestou-se, conclusivamente, às fls. 803/807, opinando pelo arquivamento do expediente.
É o breve relatório. DECIDO.
Trata-se de pedido de providências provocado por F.E.L. em face da XXª Tabeliã de Notas da Capital, questionando a lavratura de ata notarial por aquela Serventia Extrajudicial, a pedido de A. A. A. de C. F., em que teriam sido transcritos diálogos extraídos de aparelho celular.
Em suma, alega a reclamante que as conversas foram extraídas de forma parcial, sendo que, pelo seu conteúdo, infere-se que não diziam respeito à teórica proprietária do aparelho, indicada como filha menor dos envolvidos, Margot, mas sim à própria reclamante.
Neste contexto, o conteúdo da ata notarial seria ideologicamente falso. De seu turno, a Senhora Tabeliã manifestou-se às fls. 637 e 641/661, sustentando a regularidade do ato. Pois bem. De proêmio, oportuno ratificar que a matéria aqui ventilada é objeto de apreciação no limitado campo de atribuição administrativo desta Corregedoria Permanente, que desempenha, dentre outras atividades, a verificação do cumprimento dos deveres e obrigações dos titulares de delegações afeta à Corregedoria Permanente desta 2ª Vara de Registros Públicos da Capital.
Logo, refoge do âmbito de atribuições do exercício desta Corregedoria Permanente da Comarca da Capital a análise de eventual nulidade do ato notarial, condenação à indenizações, tampouco a averiguação no âmbito criminal, incumbindo à interessada dirimir estas questões perante os Juízos Jurisdicionais competentes.
Fixada estas premissas, resta-nos, pois, a verificação do cumprimento dos deveres e obrigações pela Senhora Delegatária afeta a esta 2ª Vara de Registros Públicos da Capital. Com efeito, a ata notarial é o instrumento pelo qual o Tabelião atribui fé aos fatos, materializando o estado de situações, coisas e pessoas, sem emissão de juízo de valor, e seu regramento legal está disposto nos artigos 6º, III e 7º, III da Lei 8.935/1994.
Em referidos atos, o Notário apenas atesta aquilo que presenciou ou aferiu por meio de seus sentidos, sem juízo de valor sobre os fatos constatados, não cabendo a ele adentrar nas minúcias do que foi levado à sua presença, devendo somente, como bem apontado pela I. Representante do Ministério Público, descrevê-los de maneira fiel e integral, sendo que sua interpretação e aplicação jurídica serão dadas pelo destinatário da prova.
Neste exato sentido:
“Ata notarial trata-se de uma das espécies do gênero instrumento público notarial, por cujo meio o tabelião de notas acolhe e relata, na forma legal adequada, fato ou fatos jurídicos que ele vê e ouve com seus próprios sentidos, quer sejam fatos naturais quer sejam fatos humanos, esses últimos desde que não constituam negócio jurídico.” SILVA, João Teodoro da. Ata Notarial Sua utilidade no cenário atual Distinção das Escrituras Declaratórias. In: SOUZA, Eduardo Pacheco Ribeiro de (coord.), Ideal Direito Notarial e Registral. São Paulo: Quinta Editorial, 2010, p. 33.
No caso em tela, após detalhada análise da documentação carreada aos autos e dos esclarecimentos prestados, reputo inexistir falta funcional atribuível à Sra. Tabeliã. Com efeito, na ata notarial em questão não se vê juízo de valor sobre os fatos constatados.
O escrevente atestou que foi chamado pelo solicitante quando lhe foi apresentado aparelho de telefone celular, que estava em seu poder e solicitou a transcrição de várias mensagens ali arquivadas no aplicativo “WhatsApp”.
A partir daí, cuidou o escrevente de verificar o número do aparelho, a marca, o número de série, o IMEI, a operadora (fls. 44), fugindo, por certo, de sua atribuição a investigação quanto à titularidade do equipamento, cabendo ao preposto e ao Notário apenas descrever o que ocorreu em sua presença.
Nesta senda, conquanto haja menção de que um dos contatos seria “Margot”, certo é que não há na ata notarial qualquer informação explícita do escrevente de que o aparelho pertenceria a tal pessoa.
Como bem aduzido pela I. Membro do Parquet, o instrumento apenas relatou que foram apresentadas conversas entre alguém que se intitulou como “Margot” e terceiros, sem efetuar qualquer análise ou incutir-se no conteúdo das mensagens.
Importante frisar, ainda, que o Notário goza de fé pública e as conversas foram efetivamente transcritas da mesma forma em que recebidas por meio de correio eletrônico, sem qualquer indicativo de que tenha havido adulteração, até porque exportadas por ferramenta disponibilizada pelo próprio aplicativo “WhatsApp”.
Ademais, refoge à competência deste Juízo Administrativo eventual discordância quanto ao conteúdo do ato notarial, competindo a este analisar tão somente eventual descumprimento aos deveres funcionais, o que não se vislumbrou. E, acaso entenda a reclamante tenha o solicitante se utilizado de meio fraudulento para induzir outrem a erro, ou tenha feito indevido uso da referida ata notarial, a questão deverá, acaso entender pertinente, ser levada ao Juízo competente, que ditará o melhor direito.
Ante todo o exposto, a hipótese dos autos não dá margem à adoção de providência censório-disciplinar em relação ao serviço correcionado, não se vislumbrando responsabilidade funcional apta a ensejar procedimento administrativo, razão pela qual determino o arquivamento dos autos.
Ciência aos interessados, à Sra. Tabeliã e ao Ministério Público.
Comunique-se a decisão à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente como ofício.
I.C.