Reportagem publicada no Anuário da Justiça São Paulo 2019, que será lançado na próxima quarta-feira, 11 de setembro, no Tribunal de Justiça São Paulo.
No final de 2019 encerra o biênio administrativo do desembargador Getúlio Evaristo dos Santos Neto na presidência da Seção de Direito Público. Partindo de uma proposta conservadora e com a pretensão de dar continuidade aos trabalhos anteriores, a atual gestão tem focado na eficiência dos processos e na diminuição do acervo, algo que, segundo o presidente, tem apresentado resultados.
De acordo com números fornecidos pela corte, de janeiro de 2018 a junho de 2019 foram distribuídos quase 253 mil processos, sendo mais de 170 mil recursos e quase 64 mil processos originários. No mesmo período, mais de 340 mil processos foram julgados. “Eliminamos acervo, eliminamos processos, graças à produtividade dos colegas”, diz Evaristo dos Santos, que considera esses resultados uma vitória e uma contraprestação de eficiência à sociedade.
Todos os dias, ao chegar ao tribunal, o presidente da seção visita as sessões de julgamento em andamento das câmaras e cumprimenta os magistrados presentes. Também se reúne periodicamente com os colegas para ouvi-los sobre questões prementes e os estimula a compartilhar suas estratégias para controle do acervo do gabinete.
Foi por meio dessas conversas que identificou a falta de padronização dos procedimentos nos cartórios como um entrave para a eficiência da seção. Cada câmara era atendida por um cartório, cada qual com procedimentos e iniciativas organizacionais próprias. Quando um funcionário saía e precisava ser substituído, o remanejo de um funcionário de outro cartório para preencher a vaga exigia praticamente o mesmo período de treinamento e adaptação de alguém recém-contratado.
Assim, a presidência promoveu uma reestruturação dos cartórios, buscando padronizar os procedimentos e treinar todos os funcionários. A mudança, que está em progresso nos grupos de câmaras, vai dividir o atendimento aos processos em duas fases: pré e pós-julgamento. Há encontros mensais entre os diretores, coordenadores, supervisores e chefes dos cartórios com dois dos juízes assessores da presidência e, eventualmente, com o presidente da seção para resolver problemas, esclarecer dúvidas e orientar o andamento dos cartórios.
Evaristo dos Santos aponta, ainda, que não é possível aferir o verdadeiro impacto dessas medidas, que ainda estão em implantação e não haviam atingido todos os cartórios, no aumento da eficiência e na diminuição do acervo. Segundo ele, os resultados só serão sentidos durante as próximas administrações. Para o presidente da seção, as melhoras só ocorreram porque houve esforço conjunto dos desembargadores do Direito Público e boa vontade dos funcionários na adoção dessas ideias.
A seção é formada por 90 desembargadores e 24 juízes substitutos em segundo grau, mais os dez desembargadores alocados nas duas Câmaras Reservadas ao Meio Ambiente. Totalizam 20 câmaras, responsáveis pelo julgamento de recursos que envolvem questões gerais de Direito Público (1ª a 13ª Câmaras); cobrança de tributos municipais, com muitas execuções fiscais (14ª, 15ª e 18ª Câmaras); acidentes de trabalho (16ª e 17ª Câmaras); mais as duas câmaras especializadas em Meio Ambiente.
Há ainda quatro câmaras extraordinárias, que julgam as ações mais antigas, de até dezembro de 2016. Na maioria dos casos, são processos que obrigatoriamente tiveram de ficar parados por julgamento de recursos repetitivos ou que subiram para os tribunais em Brasília e retornaram para o segundo grau. Mas, em geral, os julgamentos da seção estão em dia e não há previsão de abertura de novas câmaras extraordinárias em 2019.
As principais demandas na seção são a concessão de auxílio-acidente; disputas sobre a cobrança de IPTU; reajustes de remuneração, provento e pensões; questões municipais; e questões sobre o ICMS. Mas, para o presidente Evaristo dos Santos, a questão de maior complexidade enfrentada pelos magistrados da seção são as ações civis públicas por improbidade administrativa, pois é nestas que há maior evidência da atuação do Estado como controlador do próprio Estado.
Há também grande preocupação com decisões retidas nos tribunais superiores para serem decididas em caráter de repercussão geral e como recurso repetitivo. Em junho de 2019, havia mais de 120 mil processos aguardando esses julgamentos que, quando forem decididos, podem significar um tsunami para o tribunal.
Uma dessas decisões é o Tema 810 do Supremo Tribunal Federal. Em setembro de 2017, o Plenário do STF decidiu que a TR não pode ser usada para corrigir as dívidas de precatórios. A tese é de que a TR fica sempre abaixo do IPCA, usado para calcular a inflação e as dívidas de contribuintes contra o Fisco. Portanto, seria inconstitucional corrigir as dívidas da Fazenda com um índice menor que o usado para calcular os créditos.
Venceu a tese do ministro Luiz Fux, relator. Diante de embargos de declaração propostos com pedido de modulação do entendimento do Plenário, Fux suspendeu os efeitos da decisão até que esses recursos sejam julgados. De acordo com a pauta definida pela Presidência do Supremo, o caso deve retornar à pauta em setembro de 2019. Essa decisão deve ter impacto em praticamente todas as execuções impostas à Fazenda Pública que tramitam na Seção de Direito Público.
Com 35 anos de atuação na magistratura, Evaristo dos Santos está particularmente bem posicionado para avaliar as transformações pelas quais a Seção de Direito Público passou nos últimos dez anos. Ele observa que houve um incremento das preocupações regularizadoras de comportamento, caracterizadas nas ações de improbidade administrativa, que antes eram incipientes. Segundo ele, houve um amadurecimento das questões, uma extensão, uma preocupação da Defensoria Pública, do Ministério Público e da Procuradoria-Geral do Estado em enfrentar as questões mais técnicas do Direito Público, principalmente as mais ligadas à Constituição.
Desde o início de sua carreira, ele avalia, houve uma migração de interesses do Direito Privado para o Direito Processual num primeiro momento, e, depois, para o Direito Constitucional, e isso vai continuar, com a especialização das áreas do Direito Público focadas no Direito Positivo.
Foi candidato único à presidência da Seção de Direito Público para o biênio 2018-2019. Nos seus últimos seis meses no cargo, considera que colocou em prática todos os seus planos. O mais significativo foi a reestruturação do trabalho dos cartórios. Conseguiu, ainda, organizar encontros mensais da hierarquia da administração da seção para uniformizar os procedimentos e oferecer apoio e soluções aos problemas. Em sua avaliação, apesar de essas mudanças já estarem surtindo efeito, seu real impacto só será sentido nos próximos biênios.
PLANOS DE GESTÃO
O que mudou no Direito Público nos últimos anos? Normalmente, as preocupações, as teses se renovam, mas estão sempre relacionadas a vantagens para funcionários públicos e pedidos de indenização por ações do Estado. As questões de improbidade administrativa, que antes não eram tão expressivas, aumentaram muito, diante da dinâmica e do acompanhamento que o Ministério Público faz nas comarcas do interior. E hoje os desembargadores conversam mais entre si, trocam ideias com mais frequência e estão sempre preocupados com a formação, com cursos, com pós-graduações. Enfim, cada vez mais se capacitam para atender às especialidades do Direito Público e melhorar a prestação jurisdicional. Por exemplo, a seção participou efetivamente dos estudos de adequação do regimento interno da corte ao novo Código de Processo Civil, e essa é uma dinâmica constante.