Tramita perante a Assembléia Legislativa de São Paulo o Projeto de Lei 250/2020, o qual altera a Lei nº 10.705 de 28 de dezembro de 2000, que dispõe sobre o Imposto sobre a Transmissão “Causa Mortis” e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD, visando à mitigação dos efeitos da pandemia do novo coronavírus – covid-19 no âmbito do Estado de São Paulo.
Referido diploma normativo, caso aprovado, deflagrará mudanças perniciosas ao contribuinte, como a criação de uma nova forma de definição da base de cálculo dos bens imóveis, qual seja, o valor de mercado.
Mas, pior ainda, é a pretensão de majoração da alíquota para até 8% sobre a parcela da base de cálculo que exceder 90.000 UFESPs. Essa alíquota máxima (8%) já é praticada pelos estados do Ceará, Santa Catarina, Mato Grosso, Paraíba, Sergipe, Goiás, Pernambuco, Tocantins, Bahia e Rio de Janeiro.
A exposição de motivos do projeto além de tentar equiparar a situação da tributação sobre herança em São Paulo com a de países desenvolvidos, esquecendo do total da carga tributária suportada pelo povo paulista, algo em torno de 35% do PIB, [1] alega que os recursos do aumento deverão ser direcionados para o combate a pandemia:
“Em matéria de destinação, há que se nomear a saúde pública como principal destino dos recursos amealhados. A pandemia evidenciou a necessidade urgente de liberar recursos novos para o Sistema Único de Saúde (SUS), em especial restabelecendo a fonte de financiamento que foi bloqueada pela aprovação da Emenda Constitucional nº 95, a qual já retirou do SUS o equivalente a R$ 22 bilhões, desde 2016” [2]
Certamente passou desapercebido que os impostos são a única espécie tributária “não vinculada”, segundo disposição do artigo 167, IV da Constituição Federal, ressalvado obviamente, as hipóteses dos artigos 37, XXII, 198, § 2º e 212, de aplicação compulsória.
Sem entrar no mérito das inúmeras inconstitucionalidades da proposta legislativa, a questão de fundo é outra: nada como uma pandemia para triturar ainda mais o bolso do contribuinte, que já sofre uma das maiores cargas tributarias do mundo.
Não há justificativa para a propositura em questão.
O momento é o mais inoportuno possível, se é que existe o acertado. Muitos paulistas perdendo emprego, comércio e indústria em vias de fecharem as portas, economia mundial em retração, não se mostra oportuno sequer iniciar debate sobre aumento da carga tributária.
Não é novidade que a covid-19 será motivo das mais variadas manobras jurídicas, cujos fins, passam longe da preocupação com a saúde pública.
Se realmente há interesse em concentrar receita no combate a pandemia, fica como sugestão aos governantes que comecem a cortar na própria carne, diminuindo secretarias, cargos em comissão, acabando com penduricalhos e mordomias incompatíveis com um estado de direito pautado pela moralidade.
A receita é simples, ao invés de aumentar a receita, massacrando ainda mais o sofrido contribuinte, opte-se pela drástica redução das despesas. Quando isso ocorrer, o cidadão efetivamente passará a ser tratado pelo Estado com dignidade, não como um burro de carga, com todo respeito ao equus asinu.
*Jose Antonio Gomes Ignacio Junior, advogado, professor de Direito Tributário na Faculdade Eduvale de Avaré, mestre em Teoria do Direito e do Estado, especialista em Direito Tributário, Eleitoral e Publico (latu sensu). Doutorando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autônoma de Lisboa Luiz de Camões, autor de artigos e livros jurídicos
[1] https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,carga-tributaria-bate-recorde-de-35-07-do-pib-mesmo-com-a-economia-fraca,70002944416. Acesso em 07/05/2020
[2] https://www.al.sp.gov.br/propositura/?id=1000322805. Acesso em 07/05/2020