4ª turma rejeita incidente de impenhorabilidade do bem de família
 
A 4ª turma julgou, no último dia 15, se crédito oriundo de contrato de empreitada para a construção, ainda que parcial, de imóvel residencial, é salvaguardado nas exceções legais de impenhorabilidade do bem de família.
 
A recorrida, empresa de pequeno porte, ajuizou execução afirmando ser credora de R$ 10,7 mil, representada por três duplicatas vinculadas a contrato particular de construção por empreitada parcial de imóvel. Os executados aduziram que o bem é o único do casal e, apesar de estar em construção, é destinado à residência do conjunto familiar, sendo impenhorável.
 
As instâncias ordinárias mantiveram a penhora sob entendimento de que a obrigação oriunda de financiamento de material e mão de obra destinados à construção de moradia, decorrente de contrato de empreitada, enquadra-se na hipótese prevista pelo inciso II do artigo 3º da lei 8.009/90, exceção à regra da impenhorabilidade: “A credora, empresa de construção civil responsável pela compra dos materiais de construção e pela execução da obra de empreitada, dispõe do benefício da penhora, ainda que sobre imóvel residencial.”
 
Tratamento diferenciado
 
O relator do recurso dos executados, ministro Marco Buzzi, considerou que o caso em debate tem peculiaridade que justifica tratamento diferenciado, uma vez que não se trata de contrato de mútuo/financiamento entabulado com agente financeiro ou contrutora/incorporadora, nos moldes usualmente analisados pela Corte Superior.
 
“A situação dos autos é efetivamente peculiar, pois o terreno sobre o qual foi ou seria erigido/construído o prédio residencial é de propriedade do contratante/dono do imóvel que se comprometeu, mediante contrato específico de empreitada global, a saldar a dívida contraída para a construção de sua moradia com recursos próprios, porém, mediante pagamento parcelado, tendo inadimplido a obrigação.”
 
Exceção à regra da impenhorabilidade
 
Após abordar o instituto da empreitada, S. Exa. explicou que o ponto nodal é que o executado realizou com a construtora uma operação de crédito concomitante ao ajuste atinente à edificação, e quedou-se inadimplente para com o pagamento da dívida contraída, essa vinculada especificamente à construção de sua própria moradia. Tal fato, conforme o ministro Buzzi, atrai a exceção à regra de impenhorabilidade referida pelo inciso II do artigo 3º da lei 8.009/90:
 
“A execução é movida pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à edificação do próprio prédio, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato.”
 
Marco Buzzi consignou que, para os efeitos estabelecidos no dispositivo legal, o financiamento referido pelo legislador abarca operações de crédito destinadas à aquisição ou construção do imóvel residencial, podendo essas serem stricto sensu, como aquelas em sentido amplo, nas quais se inclui o contrato de compra e venda em prestações, o consórcio ou a empreitada com pagamento parcelado durante ou após a entrega da obra, pois todas essas modalidades viabilizam a aquisição/construção do bem pelo tomador que não pode ou não deseja pagar o preço à vista.
 
“Quando o legislador utilizou a palavra financiamento, não objetivou restringir a regra da impenhorabilidade somente às hipóteses nas quais a dívida assumida seria quitada com recursos de terceiros (agentes financiadores), mas sim que, quando o encargo financeiro anunciado – operação de crédito – fosse voltado à aquisição ou construção de imóvel residencial, ao credor seria salvaguardado o direito de proceder à penhora do bem.”
 
De acordo com o relator, entendimento contrário premiaria o comportamento contraditório do devedor e causaria enriquecimento indevido, haja vista que lhe bastaria assumir o compromisso de quitar a obrigação com recursos próprios para estar autorizado, nos termos da lei, “a se locupletar ilicitamente”.
 
“Se o bem de família pode ser penhorado para garantir a quitação da dívida contraída para sua aquisição/contrução, não faz sentido afirmar que, no caso, isso não possa ocorrer apenas porque a acessão sobre o terreno seria quitada com recursos próprios.”
 
Assim, concluiu Buzzi, tendo o devedor contratado a empreitada na modalidade mista para a construção de sua residência e se incumbido de adimplir a obrigação de forma parcelada, a operação de crédito/financiamento viabilizou a construção do imóvel, motivo pelo qual não há como afastar a possibilidade de sua penhora.
 
A decisão da turma em manter a penhora foi unânime, tendo os ministros Salomão, Raul Araújo e Antonio Carlos Ferreira votado com o relator. Ausente, justificadamente, a ministra Gallotti.
 
Processo: REsp 1.221.372
 
Veja o acórdão.