A união estável é a convivência pública, contínua e duradoura entre duas pessoas, tendo, por fim, a constituição de uma família (informal).
 
É uma situação de fato que gera efeitos jurídicos, a qual a Constituição Federal classifica como entidade familiar. A união estável é marcada pela informalidade na sua formação, além de manter-se e extinguir-se livremente – no mundo do ser, pois situa-se no plano dos fatos com efeitos jurídicos.
 
No mesmo sentido ensina Euclides de Oliveira: “A união estável é tipicamente livre na sua formação. Independe de qualquer formalidade, bastando o fato em si, de optarem, homem e mulher, por estabelecer vida em comum. Bem o diz ANTONIO CARLOS MATHIAS COLTRO, assinalando que a união de fato se instaura 'a partir do instante em que resolvem seus integrantes iniciar a convivência como se fossem casados, renovando dia a dia tal conduta, e recheando-a de afinidade e afeição, com vistas à manutenção da intensidade. Na união estável basta o mútuo consentimento dos conviventes, que se presume do seu comportamento convergente e da contínua renovação pela permanência” (g.n)
 
Seu regime jurídico disciplina-se mormente no arts. 226, §3º, da CF e 1.723 a 1.727 CC, afora as Leis Extravagantes anteriores.
 
O comando constitucional determina ainda a facilitação da conversão da união estável em casamento; a ser concretizada através do procedimento de habilitação de casamento perante o Registro Civil de Pessoas Naturais do domicílio dos conviventes. Aliás, independentemente de sua celebração por juiz de paz, consuma-se com o registro no Livro B, após a publicação de editais na serventia extrajudicial e em jornal de circulação local ou eletrônico (art. 1.726, CC).
 
Todavia, não é obrigatória a sua conversão, embora igualmente seja possível dar publicidade à relação de fato, através de sua formalização via escritura pública lavrada em Tabelionato de Notas do domicílio dos conviventes e registrada no Livro-E.
 
Para disciplinar a questão, editou-se o Provimento nº 37/2004 da Corregedoria Nacional de Justiça, em que consta o ato de registro da união estável no Registro Civil das Pessoas Naturais como faculdade aos companheiros. Justifica-se tal liberdade das partes por se tratar de uma relação que independe de outra publicidade para sua existência, “in verbis”:
 
“Art. 1º. É facultativo o registro da união estável prevista nos artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil, mantida entre o homem e a mulher, ou entre duas pessoas do mesmo sexo”.
 
Em consequência, a eficácia de sua constituição e dissolução, nos termos art. 5º do mesmo Provimento, via registro da união estável no Livro “E” do Registro Civil, produzirá efeitos patrimoniais entre os companheiros, sem prejudicar terceiros que não tiverem participado da escritura pública, como se aduz:
 
“Art. 5º. O registro de união estável decorrente de escritura pública de reconhecimento ou extinção produzirá efeitos patrimoniais entre os companheiros, não prejudicando terceiros que não tiverem participado da escritura pública”
 
A questão que se põe no presente artigo é a seguinte: a dissolução informal da união estável, para eventual casamento de um dos companheiros com um terceiro, pressupõe alguma formalidade legal? Ou seja, constituição formal leva à ruptura formal?
 
Pelas características da relação entre os conviventes – informalidade e consensualismo – a resposta parece que não.
 
Ademais, nos impedimentos matrimoniais não se vislumbra restrição nesse sentido, a despeito de corrente jurisprudencial que traça entendimento divergente. Todavia, as normas excepcionais de direito devem ser interpretadas restritivamente.
 
Inclusive, se é possível a constituição de união estável em relação à pessoa casada separada de fato (art. 1.723, § 1 º, CC), não seria lógico restringir-se com proeminência à situação de fato, diante da liberdade conferida à união formal (casamento).
 
Esta tem natureza jurídica institucional e contratual – regime de bens. Confere ao relacionamento publicidade ampla, fidelidade e domicílio conjugal. Para se dissolver, pressupõe a lei civil a separação ou o divórcio, morte, declaração de nulidade ou anulação por decisão judicial, neste caso.
 
Neste caso, para o casamento do nubente – que convivia em união estável com terceiro – deve se exigir, por prudência e segurança jurídica, somente a colheita de sua declaração de que se dissolveu anterior união estável, no próprio procedimento de habilitação para o casamento. Ao oficial de registro civil caberá, por conseguinte, anotação na Central de Registro Civil (CRC) com o fim de se extinguir a publicidade do registro no Livro E.
 
Por não produzir efeitos perante terceiros, o presente assento não se condiciona a averbação de dissolução, devido à inexistência de pressuposto jurídico à dissolução da união estável. Finda a consensualidade entre as pessoas, termina a relação de fato.
 
Não se pode olvidar que a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso II, é clara: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Assim sendo, se não há regra impediente, jamais se impede; salvo em regimes totalitários, onde inexiste Estado de Direito.
 
A Associação dos Registradores Civis de São Paulo (ARPEN/SP) publicou enunciado orientativo nesse sentido, a saber: “Enunciado 20: Para a habilitação para o casamento não é necessário previamente cancelar ou dissolver eventual registro de união estável com outra pessoa”.
 
Nas palavras de Jean Jacques Rousseau: “Junto do estado civil vem a liberdade moral, a única que torna o homem verdadeiramente dono de si, já que obedecer apenas aos desejos é escravidão, e a obediência à lei é a liberdade”.
 
Entretanto, apesar dessas características, a união estável convive no ordenamento jurídico com os direitos reais, os quais são marcados pela observação de forma específica para que certos atos e negócios jurídicos produzam plenamente seus efeitos jurídicos. Em especial, a constituição de direitos reais sobre imóveis, oponíveis erga omnes, por força da publicidade de seu registro.
 
Em regra, aplica-se às relações econômicas da união estável o regime da comunhão parcial de bens, salvo se existir instrumento público ou particular em sentido diverso. Através da lavratura de escritura pública declaratória de sua existência, permite-se aos companheiros optarem por qualquer regime previsto no Código Civil, ou mesclá-lo de forma livre.
 
Pois bem, o registro de aquisição de bem imóvel gera efeitos jurídicos de direito real. Por isso, tem por finalidade a publicidade e a garantia de segurança jurídica estática (posição jurídica de titular de direito real com eficácia erga omnes) e dinâmica (do tráfego negocial do bem). Para atingir a esse desiderato, deve respeitar a certos princípios, como o da especialidade subjetiva.
 
Desse modo, seu titular não será classificado apenas como companheiro ou “em união estável”, em virtude da necessidade de se preencher os requisitos da especialidade subjetiva.
 
Caso conste seu estado civil de casado, não poderá de forma concomitante receber tal qualificação subjetiva, já que o Registro de Imóveis não permite a simultaneidade de inscrições do direito de propriedade que sejam conflitantes. De modo que, ou o titular de direito é solteiro, viúvo, separado ou divorciado e mantém união estável – neste caso, sem a existência de conflitos de direito – ou seu estado civil é de casado.
 
Frente a esse estado civil, em específico, é impossível a permanência de qualificação concomitante da existência de companheiro, sob pena de se gerar prejuízo a terceiro, salvo se reconhecida por decisão judicial.
 
Somente sob essa perspectiva, o oficial de registro deve exigir a certidão do registro no Livro E ou da sentença judicial que assim o declare, porquanto esse ato registral é facultativo, pelo art. 1º do Provimento n. 37/2004, todavia, proibido se constar o estado civil de casado (art. 8º do Prov. 37/2004 da Corregedoria Nacional de Justiça).
 
Ressalta-se que união estável não é estado civil, mas situação de fato que produz efeitos jurídicos, sendo esse o entendimento do atual Corregedor Geral da Justiça. Para sua inscrição no fólio real, em regra, é inexigível seu registro no Livro E do RCPN do atual ou último domicílio dos companheiros, ou ainda, seu registro no Livro n. 3 – Registro Auxiliar do Registro de Imóveis – para que conste essa condição na aquisição de direito real.
 
Porém, é requisito para o ingresso de aquisição de direito real dentro do fólio a declaração conjunta dos companheiros, ou sentença judicial transitada em julgado, na medida que a declaração unilateral de vontade obriga somente quem a realizou, sem criar ou prejudicar direito de terceiro que dela não tenha participado.
 
Da aplicação da separação obrigatória de bens à união estável e seus efeitos
 
O regime patrimonial de bens que deve regular a partilha de bens dos conviventes em união estável, tanto em decorrência do término, em vida, do relacionamento, quanto em razão do óbito do companheiro, deve observar o ordenamento jurídico vigente ao tempo da aquisição de cada bem a partilhar, e não o vigorante no momento do partilhamento, como forma a ser preservado o ato jurídico perfeito que então se aperfeiçoara (Enunciado 346, IV Jornada de Direito Civil).
 
Mesmo diante de contrato escrito em que se elege outro regime de bens, ou então do silêncio eloquente dos companheiros, é aplicável o regime de separação obrigatória de bens à união estável entre septuagenários, por ser imperativo, cogente, conforme entendimento do STJ. Com efeito, produz efeitos, inclusive, sucessórios, sendo inexistente direito hereditário entre os cônjuges aos bens particulares, quando houver concorrência com descendentes (art. 1.829, I, CC). Ademais, é desnecessário o consentimento do companheiro para alienação ou doação de bens particulares, e ausente a comunhão de bens, salvo na hipótese de aquestos, desde que provada a participação em sua aquisição.
 
A determinação do regime jurídico aplicável à partilha de bens, seja pela dissolução da união estável ou óbito de um companheiro, será aquela vigente no momento da aquisição do bem. A finalidade de tal exegese é a proteção da segurança jurídica dos atos jurídicos perfeitos e dos interesses de terceiros de boa-fé.
 
Outrossim, para produção de publicidade, o contrato de convivência ou a decisão declaratória da existência de união estável deve ser averbado no Registro de Imóveis em que registrado os bens comuns, ou pela demonstração de má-fé pelo adquirente.
 
Da dissolução da união estável sob o regime da separação obrigatória
 
É sabido que o regime da separação obrigatória de bens é aplicável às uniões estáveis. Assim sendo, diante da idade de 60 anos do homem ou 50 anos da mulher, antes da vigência do novo Código Civil, aplicar-se-á aos companheiros esse regime, de acordo com art. 258.
 
Neste contexto, a partilha de bens no regime de separação obrigatória, conforme previsto na Súmula 377 do STF, dependerá da comprovação do esforço comum na aquisição do bem a título oneroso pelo companheiro. Inclusive, a contribuição pode ser material ou imaterial.
 
“nos moldes do art. 258, II, do Código Civil de 1916, vigente à época dos fatos (matéria atualmente regida pelo art. 1.641, II, do Código Civil de 2002), à união estável de sexagenário, se homem, ou cinquentenária, se mulher, impõe-se o regime da separação obrigatória de bens. Nessa hipótese, apenas os bens adquiridos onerosamente na constância da união estável, e desde que comprovado o esforço comum na sua aquisição, devem ser objeto de partilha” (EREsp 1171820/PR, Rel. Ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 26/08/2015, DJe 21/09/2015).
 
Do regime da sucessão do companheiro e do reserva da quarta parte
 
Em decorrência da decisão do STF que julgou inconstitucional o art. 1.790 do CC, a sucessão do companheiro será feita da maneira equivalente à do cônjuge. Assim, aplica-se o regime jurídico do art. 1.829 do CC, quando o companheiro concorrer com herdeiros do de cujus, sejam exclusivos ou comuns.
 
Por consequência, o companheiro é herdeiro necessário, concorre com descendentes aos bens particulares do de cujus, e lhe é reservada a quota de ¼ do patrimônio se concorre com descendentes comuns. Em relação a essa última hipótese, se houver concorrência híbrida, ou seja, descendentes exclusivos, será inaplicável essa reserva.