Na linha do artigo publicado na semana anterior, é necessário estudar as decisões judiciais relativas à aplicação, ou não, do direito de preferência nas parcerias rurais. Isso porque, diante das diversas omissões legislativas, a jurisprudência torna-se grande fonte de direito capaz de nortear eventuais controvérsias.
 
Dito isso, com a presente série de artigos, foram realizadas pesquisas jurisprudenciais no âmbito do TJ/SP, do TJ/RS e do STJ. No presente, apresentam-se os resultados obtidos no estado de São Paulo. Quanto à classificação das decisões, tendo em vista a doutrina, categorizaram-se conforme as seguintes matrizes interpretativas:
 
a) A primeira categoria, inaplicabilidade por interpretação gramatical, engloba as decisões que justificaram a não aplicação do direito de preferência à parceria rural pela inexistência de disposição normativa no Estatuto da Terra (ET) para que isso ocorra;
 
b) A segunda categoria, inaplicabilidade por interpretação por natureza jurídica, engloba as decisões que justificaram a não aplicação do direito de preferência à parceria rural pelo fato de que é cabível apenas o arrendamento, que detém natureza jurídica de locação, diferentemente da parceria, que detém natureza jurídica de sociedade;
 
c) A terceira categoria, aplicabilidade por interpretação extensiva, engloba as decisões que justificaram a aplicação do direito de preferência à parceria rural pela extensão das normas gerais do artigo 92, do ET e das normas do arrendamento, conforme artigo 96, VII, do ET e artigo 34, do Decreto 59.566/66;
 
d) A quarta categoria, aplicabilidade por interpretação principiológica, engloba as decisões que justificaram a aplicação do direito de preferência à parceria rural pelos princípios do Direito Agrário, em especial, da continuidade da relação jurídica pretendida com a produção agropecuária no imóvel rural e da conservação da empresa rural.
 
Além disso, é importante relembrar que se discute a existência de duas espécies de direito de preferência nos contratos de parceria rural. Por um lado, o direito de preferência do parceiro outorgado na aquisição do imóvel rural cedido em caso de alienação onerosa e, por outro, o direito de preferência do parceiro outorgado na renovação do contrato. Ambas as espécies foram consideradas para a categorização das decisões.
 
No Tribunal de Justiça de São Paulo, dos 16 acórdãos tratados, apenas dois versavam acerca da aplicação, ou não, do direito de preferência do parceiro outorgado na aquisição do imóvel rural. Esses acórdãos foram assim categorizados: um na categoria de inaplicabilidade por interpretação gramatical; um na categoria de inaplicabilidade por interpretação por natureza jurídica; nenhum nas demais categorias.
 
Desse modo, obtiveram-se os respectivos percentuais: 100% para o entendimento de inaplicabilidade do direito de preferência ao parceiro outorgado no caso de alienação do imóvel rural. Esse posicionamento foi justificado pelo tribunal da seguinte maneira: 50% por interpretação gramatical e 50% por interpretação por natureza jurídica. Portanto, a partir do procedimento metodológico empregado, nota-se que, por unanimidade, o TJ/SP tende a não aplicar o direito de preferência nesse caso.
 
Em relação às demais 15 decisões que se manifestavam acerca da aplicação, ou não, do direito de preferência do parceiro outorgado na renovação do contrato de parceria rural, foram assim categorizadas: três na categoria de inaplicabilidade por interpretação gramatical; uma na categoria de inaplicabilidade por interpretação por natureza jurídica; seis na categoria de aplicabilidade por interpretação extensiva; cinco na categoria de aplicabilidade por interpretação principiológica.
 
Desse modo, obtiveram-se os respectivos percentuais: 26,67% para o entendimento de inaplicabilidade e 73,33% para o entendimento de aplicabilidade do direito de preferência ao parceiro outorgado no caso de renovação do contrato. O posicionamento de inaplicabilidade foi justificado pelo tribunal da seguinte maneira: 20% por interpretação gramatical e 6,67% por interpretação por natureza jurídica. Já o posicionamento de aplicabilidade seguiu os seguintes percentuais: 40% por interpretação extensiva e 33,33% por intepretação principiológica
 
Portanto, a partir do procedimento metodológico empregado, nota-se que, ao contrário do caso da alienação do imóvel rural, o TJ/SP tende, majoritariamente (73,33%), a aplicar o direito de preferência nos contratos de parceria rural quando se trata de renovação desse contrato. Nesse sentido, prepondera a categoria, aplicabilidade por interpretação extensiva, que estende às parcerias a aplicação do artigo 22 do Decreto 59.566/66.
 
Além disso, verifica-se no TJ/SP a predominância de três diferentes teses sobre a renovação automática do contrato de parceria rural: 1) a renovação automática legal, prevista no artigo 22, §1º, do Decreto 59.566/66, é inaplicável, podendo ocorrer ajuste prévio de renovação automática; 2) a renovação automática legal é aplicável, mas passível de afastamento por ajuste das partes; 3) a renovação automática legal é aplicável e impossível seu afastamento.
 
O primeiro entendimento considera que o direito de preferência à renovação não se presume, isto é, deve estar disposto no instrumento. Portanto, a renovação automática não decorre de lei, e, sim, da vontade das partes, ou seja, o direito de preferência sequer é cogitado na ausência de disposição. O segundo entendimento admite o direito de preferência na parceria rural e discute se ele é cogente ou não. Para esses desembargadores, a liberdade contratual prepondera e as partes podem afastar o direito de preferência, se houver disposição expressa nesse sentido. No terceiro caso, tem-se a aplicação da lei por excelência. Desse modo, o direito de preferência à renovação se aplica aos contratos de parceria e configura-se como uma norma cogente, de uso obrigatório, não podendo ser modificada pela estipulação das partes.