Com mais de 455 anos de história registrada em documentos públicos oficiais, a atividade notarial no Brasil nunca havia vivenciado, em tão pouco tempo, uma mudança tão drástica como a que ocorreu nos últimos 20 meses, quando se iniciou a pandemia da Covid-19 em nosso País. Embora, ao longo da evolução natural dos tempos, os escritos tenham passado por diversos suportes – da argila ao papiro, depois ao pergaminho, ao papel, à máquina de escrever e aos computadores – a transformação do notariado brasileiro em um serviço digital superou, em velocidade, quaisquer mudanças já ocorridas nesta esfera.
 
Para realizar tal feito, a Corregedoria Nacional de Justiça, provocada pelo Conselho Federal (CNB/CF), entidade que reúne os Cartórios de Notas de todo o País, autorizou a constituição da plataforma e-Notariado (www.e-notariado.org.br), um portal de serviços digitais padronizado em todo o país que, desde julho de 2020, passou a permitir a prática de uma série de atos eletrônicos, por meio de videoconferência e assinatura eletrônica, e que já totaliza mais de 100 serviços digitais, entre escrituras de compra e venda, doações, permutas, inventários, divórcios, uniões estáveis, testamentos, procurações e autenticações.
 
Para coroar este um ano e meio de avanço ímpar, os notários brasileiros colocam à disposição da população um dos últimos serviços que necessitavam ser migrados para o meio eletrônico: o Reconhecimento de Firma por Autenticidade. Comumente exigido em documentos como transferência de veículos automotores de qualquer valor, firma do fiador em contratos de locação, autorização de viagem de menores, assim como quaisquer outros contratos ou documentos de natureza econômica de valor apreciável.
 
Com a novidade, que passa a estar disponível na plataforma digital do notariado brasileiro, este serviço agora pode passar a ser feito de maneira virtual, em um processo que envolve o envio do documento ao Cartório de Notas, uma videoconferência com o tabelião e assinatura eletrônica, que pode ser a de modelo notarizada – emitida gratuitamente e de forma virtual pelo Cartório de Notas -, ou ICP Brasil, a mesma exigida para a declaração de imposto de renda. Ou seja, o cidadão não precisa se deslocar ao Cartório, nem para reconhecer a firma autêntica, nem para emitir seu certificado.
 
Para realizar o Reconhecimento de Firma por Autenticidade pelo e-Notariado o usuário deverá ter firma aberta no cartório escolhido e um certificado digital notarizado ou ICP-Brasil. Após escolher o Cartório de Notas (que pode ser consultado no site www.e-notariado.org.br), o cidadão assina o documento original e o envia à unidade. Na sequência, é marcada uma videoconferência para confirmar a identidade e capacidade civil do solicitante. Em seguida, o usuário assina eletronicamente um termo de validação, o tabelião reconhece a firma autêntica no documento original, disponibilizando-o para retirada ou para que seja entregue ao destinatário.
 
A disponibilização de mais este módulo de serviço eletrônico ao cidadão é fruto de um trabalho hercúleo, que envolve o desenvolvimento e adequação do sistema à 27 diferentes regramentos estaduais, muitas vezes conflitantes, além de uma complexa teia legal na qual os serviços dos Cartórios de Notas estão inseridos. Conjugar todas estas normativas e transformá-las em um padrão nacional uniforme de prestação de serviço têm sido um dos maiores desafios que a atividade tem superado nos últimos tempos.
 
Importante frisar, que o ato de Reconhecimento de Firma por Autenticidade, assim como a quase maioria dos atos realizados em Cartório de Notas é uma faculdade do usuário que, diante de uma importante transação patrimonial ou de um ato pessoal que envolve uma série de direitos, busca no ato praticado por um notário a autenticidade, a publicidade e a eficácia, que lhe darão a segurança jurídica de que aquele ato dificilmente será contestado, cabendo a quem o fizer fazer provas de sua ilegalidade.
 
Outro ponto muito importante a se destacar é que, neste momento, apenas os Reconhecimentos de Firma por Autenticidade, aqueles onde o cidadão deveria ir presencialmente ao Cartório de Notas assinar o documento diante de um tabelião, podem ser feitos de forma eletrônica. Já os Reconhecimentos de Firma por Semelhança, que costumam ser feitos nos balcões dos Cartórios, onde a assinatura do usuário é confrontada com um padrão constante na ficha de firma armazenada na unidade, permanecem sendo realizados de forma física. Já em janeiro de 2022, o Colégio Notarial do Brasil tem planejado o lançamento de um novo módulo, o de Reconhecimento de Assinatura Eletrônica, previsto pelo Provimento nº 100 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
 
Embora o Brasil ainda patine em muitas áreas tentando se reerguer dos efeitos devastadores da pandemia, na área notarial nosso país ocupa atualmente o posto de referência mundial. Reunidos em Porto Rico, em razão da Jornada Iberoamericana de Direito Notarial, grande parte dos 89 países que praticam o modelo de notariado igual ao brasileiro – sim!, Cartórios de Notas estão presentes em 7 das 10 maiores economias do mundo, em 22 dos 28 países que compõem a União Europeia; em 15 dos 20 países componentes do G 20; a atendem a 2/3 da população mundial – discutem hoje, como dar os passos que o Brasil galgou para, em tão pouco tempo, transformar um serviço secular em uma atividade quase que 100% digital.