CNB/CF conversa com o diretor de Programa da Secretaria Especial de Modernização do Estado, Eduardo Magalhães de Lacerda Filho, e com o consultor da Ethereum, Alexandre Van de Sande, sobre o uso de blockchain na segurança dos atos notariais eletrônicos e seus impactos na confiança do mercado na economia brasileira.
 
Nas palavras da presidente do Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB/CF), Giselle Oliveira de Barros, “a transformação do notariado brasileiro em um serviço digital superou, em velocidade, quaisquer mudanças já ocorridas nesta esfera”.  Nos últimos 20 meses, mais de 100 serviços notariais foram introduzidos ao ambiente digital, rapidamente galgando espaço nas solicitações de atos das 27 unidades federativas do país, unificando e integrando nacionalmente os distintos cenários sociais do país em uma só plataforma. Assegurados pela fé-pública notarial, assim como suas contrapartes presenciais, os atos eletrônicos carregam o inevitável receio da volatilidade própria ao mundo digital. A garantia das informações postas nestes documentos, dando suporte ao ato notarial e sua fé-pública, transforma-se do papel ao digital utilizando-se de soluções próprias do meio.
 
Integrada à realização de cada ato notarial e os principais processos feitos pelo e-Notariado, a Notarchain é uma rede privada blockchain dos Cartórios de Notas. Este tipo de tecnologia é utilizado em todo o mundo e, segundo relatório da International Business Machines Corporation (IBM), é uma das “mais seguras e confiáveis formas de protocolar transações em um livro-razão compartilhado com registros imutáveis”, pois organiza, carrega e arquiva códigos por meio de transações interconectadas, como uma corrente (blocks in a chain). Assim, a Notarchain garante que os documentos lavrados, com fé-pública e assinatura do tabelião, sejam atrelados a outros processos, impossibilitando a edição posterior do mesmo sem que toda a “corrente” seja atingida.
 
Tal preocupação e investimento na segurança dos atos notariais eletrônicos ganham também a atenção de legislações próprias mundo afora, vide a Lei 18600 de documentos e firmas eletrônicos o Uruguai, que regulamenta o uso de dispositivos de segurança criptografados em seus atos online, ou a Lei de Arquivamento de Atos Notariais da Itália que recentemente foi atualizada para contemplar dispositivos tecnológicos que assegurem documentos digitais. Segundo estimativa da McKinsey & Company, empresa de consultoria empresarial americana, a implementação de uma identidade digital segura no Brasil poderia impactar, em 10 anos, o PIB em até 13%. Eduardo Magalhães completa. “Não só pela redução de burocracia, custos e redução de fraudes, mas também pela oportunidade de novos negócios. Citamos aqui a melhoria do ambiente de negócios. Ou seja, é um pilar na produção de riquezas do país. Os notários deram, sem dúvida, uma grande contribuição nesse sentido”, conclui o diretor de Programa da Secretaria Espacial de Modernização do Estado.
 
Blockchain integrada ao ato notarial
 
O funcionamento da tecnologia blockchain, em uma definição básica, “permite que você prove, de forma verificável, que uma pessoa afirmou algo”, conforme explica Alexandre Van Sande, consultor e um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento da Ethereum no Brasil, uma das maiores plataformas de programação de aplicativos descentralizados, contratos inteligentes e transações de uma criptomoeda própria, a Ether.
 
Assim definida, a blockchain não pode ser confundida pela transposição da atividade notarial pelo uso desta tecnologia. O principal argumento encontra-se na forma de como os atos são juridicizados e baseados na fé-pública do tabelião que, além de um coletor da vontade das partes, é também um conselheiro jurídico que garante prudência e efetividade ao ato. Alexandre explica que tais sistemas baseados em criptografia “permitem a verificação de que afirmação A foi feita pelo indivíduo B, mas não garante que esta afirmação é verídica”. Por exemplo, a declaratória de uma união estável pode ser verificada pela blockchain em data específica, porém não garante que os preceito jurídicos e regulamentações do ato foram realizados de forma correta. Torna-se então a blockchain uma mera, mas importante, ferramenta de organização e segurança do notário.
 
Segurança online e impactos na economia
 
O diretor de Programa da Secretaria Especial de Modernização do Estado da Presidência da República, Eduardo Magalhães de Lacerda Filho, explica em entrevista exclusiva ao CNB/CF que a Notarchain equipara a segurança dos atos online às ferramentas já utilizadas com implementação de sistemas criptográficos em sistemas de Governo, bancário, comercial, entre tantos outros, o que gera confiabilidade ao e-Notariado. “É relevante para o Estado Brasileiro saber que os processos notariais, de um tempo para cá, agora são protegidos com esse tipo de tecnologia.  Ganha-se com transparência e agilidade nos serviços, além das já comentadas rastreabilidade e segurança de todo o processo”, explica.
 
Para Van Sande, a utilização da Notarchain como rede privada também permite a testagem de novas tecnologias que sirvam para funções muito específicas. “É importante que o conhecimento de como lidar com chaves privadas se espalhe tanto em instituições como no uso geral do cidadão. Eventualmente todos nossos celulares e aparelhos tecnológicos serão portadores de chaves privadas com os quais assinaremos mensagens das mais importantes, como uma venda de patrimônio, até as mais triviais, como um post de rede social”, diz o consultor ao prever um futuro em que a atual tecnologia empregada na segurança digital dos atos notariais eletrônicos seja democratizada e utilizada também na segurança digital individual cotidiana do cidadão.
 
Eduardo Magalhães reforça: “Quando falamos do emprego destes dispositivos tecnológicos em uma rede com tal fluxo de dados pessoais, falamos também sobre modernização, segurança, facilidade e um melhor ambiente de negócio. O e-Notariado é um excelente caso em que tais benefícios são atingidos”. Já Alexandre Van Sande comenta que “experimentos que vemos hoje com NFTs, DAOs, e diferentes formas de governar, vender, dividir, compartilhar, pagar etc. não são só brincadeiras, mas também aprendizados que um dia nos ajudarão a recriar nossa sociedade que já é tão digital”, conclui ao citar William Gibson, escritor américo-canadense de ficção-especulativa: “O futuro já está aqui, só não é igualmente distribuído”. Neste sentido, notários e usuários do e-Notariado já podem contar com um passo na democratização deste futuro ao usufruírem da reconfortante seguridade que a plataforma atinge com o Notarchain.