Advogado diz que casais deveriam falar mais sobre a própria vida financeira um com o outro
Em um momento que costuma ser difícil e delicado como um divórcio, falar em dinheiro pode parecer uma inconveniência, quase um desrespeito. Mas, na verdade, este é um assunto incontornável, que, como diversos outros aspectos que envolvem uma separação, precisa ser debatido com maturidade e serenidade. É o que aponta o advogado Paulo Akiyama, especializado em direito de família e sucessões, lembrando que o tabu de se falar da própria vida financeira, mesmo entre casais que vivem um bom momento, tende a tornar a ruptura ainda mais traumática.
De fato, pesquisas demonstram que, no contexto de um casamento, os parceiros têm pouco hábito de falar em dinheiro. Ao mesmo tempo, o tema costuma aparecer como um grande motivo de insatisfação, sendo até razão para o divórcio. No Brasil, segundo estudo realizado pelo SPC em parceria com o Banco Central, 46% dos casais brigam por motivos monetários, sendo que 51% culpam o outro pelo desequilíbrio nas finanças. Além disso, pelo menos 29% reconhecem não revelar detalhes de seus ganhos e despesas pessoais à sua parceria.
Tão evitado e também motivo recorrente de brigas, falar de dinheiro tende a gerar ainda mais animosidade durante um processo de divórcio. “A partilha de bens é algo até mesmo estressante para as partes, pois sempre há quem se sinta insatisfeito. E vale lembrar que, nos casos de casais com filhos, a disputa em torno do valor de uma pensão costuma deixar os ânimos ainda mais à flor da pele”, comenta Akiyama.
O advogado observa que, no Brasil, as quedas de braço financeiras podem ficar para depois de ter ocorrido a ruptura, pois “o divórcio atualmente não está vinculado com a partilha de bens, que fica para um segundo momento processual”. Trocando em miúdos, “o que se decide de pronto é a separação, o regime de guarda dos filhos e a questão relativa à alimentação”, explica. Contudo, ele reconhece que uma atitude muito intransigente tende a ser contraproducente na medida em que torna a separação ainda mais traumática e onerosa.
Akiyama ainda sublinha que, no caso das partes não se entenderem e estarem despreparadas para uma conversa assertiva sobre a partilha de bens, é comum que ocorram estresse e desequilíbrio do orçamento doméstico. “Geralmente, isso acontece com o guardião provisório dos filhos. É essa figura que costuma ficar mais vulnerável e se desequilibrar economicamente. Principalmente porque, ainda hoje, na grande maioria das famílias o provedor é o marido, que, estando separado, vai deixando de proporcionar a mesma qualidade de vida a que a família estava acostumada anteriormente”, indica.
Ele ainda explica ser comum que o gerenciamento de um orçamento menor cause muito desconforto e rivalidade entre as partes do ex-casal. “Mesmo com a vida moderna, em que ambos possuem atividade remunerada, na grande maioria das vezes ainda ocorre de a remuneração da mulher ser inferior à do homem, e, portanto, tende a haver desequilíbrio”, conclui.
Acordos
Apesar de se tratar de um tema que é tabu, Paulo Akiyama reforça ser importante que se fale sobre dinheiro no contexto do casamento. Algo tão fundamental que, a partir do momento em que duas pessoas decidiram se casar, elas precisam optar de imediato por algum dos três regimes de partilha de bens instituídos pela legislação brasileira.
“O regime de casamento usual é o de comunhão parcial de bens. Isso significa que tudo que o casal construiu ao longo do relacionamento a ambos pertence, ou seja, 50% para cada um dos ex-cônjuges”, detalha o advogado. “Temos também a comunhão universal de bens, quando tudo pertence ao casal, seja o que tiver construído antes ou durante aquela relação”, informa, detalhando que, para a adoção dessa modalidade, é preciso haver uma declaração por escritura pública pela opção. “O mesmo acontece no caso da separação total de bens. Nesta última hipótese, as posses e as despesas não se comunicam entre o casal”, conclui, situando que a escritura de regime de casamento deve ser feita no cartório de registro de imóveis e levada a termo no cartório civil, onde se realizará o casamento.
Vale registrar que, na união estável, quando não há um acordo pactuado entre o casal, o regime de bens aplicado é o da comunhão parcial.
Dívidas. No caso de haver contas e dívidas conjuntas, a regra é a mesma. “Quando casados pelo sistema de comunhão parcial de bens ou comunhão universal de bens, tanto o bônus quanto o ônus devem ser divididos na proporção de 50% para cada um”, avalia Akiyama, lembrando que a possibilidade de acordo sempre existe, desde que seja factível.
Filhos. Mesmo no caso de um casamento com separação total de bens, havendo filhos com menos de 18 anos, os alimentos são tratados de forma prioritária juntamente com o regime da guarda. “Quando não há acordo entre o ex-casal, aquele que detiver a guarda provisória pode requerer auxílio provisório”, explica o advogado. “Vale lembrar que as despesas alimentares com os filhos devem ser divididas entre ambos os genitores”, comenta.
Imóveis. Se o casal está se separando e possui um imóvel compartilhado, estando um dos ex-cônjuges ocupando o local, eventuais parcelas do financiamento deverão ser rateadas na proporção de 50% para cada um, enquanto as despesas de moradia – como condomínio, IPTU, energia elétrica e gás – ficam sob responsabilidade de quem está em posse daquele espaço. “Porém, se ambos estiverem no imóvel, o compartilhamento das despesas será de 50% para cada cônjuge”, informa.