Procedimento Administrativo Disciplinar – Tabeliã de Notas – Aplicação de pena de suspensão por noventa dias – Decisão originária do Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça – Solicitação de esclarecimentos sobre os efeitos de eventual recurso administrativo e sobre a destinação da renda da delegação durante o período da suspensão.
Número do processo: 85561
Ano do processo: 2018
Número do parecer: 5
Ano do parecer: 2019
Parecer
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2018/85561
(5/2019-E)
Procedimento Administrativo Disciplinar – Tabeliã de Notas – Aplicação de pena de suspensão por noventa dias – Decisão originária do Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça – Solicitação de esclarecimentos sobre os efeitos de eventual recurso administrativo e sobre a destinação da renda da delegação durante o período da suspensão.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:
Trata-se de processo administrativo disciplinar instaurado por Vossa Excelência contra a Sra. Tabeliã de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca, Dra. L.B., em que foi aplicada a pena de suspensão por 90 (noventa) dias.
A Sra. Tabeliã de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca solicitou a sustação do início do cumprimento da pena até o trânsito em julgado da r. decisão prolatada por Vossa Excelência, diante da possibilidade de interposição de recurso administrativo para a Col. Câmara Especial do Tribunal de Justiça, ou, alternativamente, que seja regulamentada a destinação da renda da serventia durante o período da suspensão (fls. 329/330).
Opino.
Embora apresentados de forma alternativa, os requerimentos formulados pela Sra. Tabeliã de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca comportam respostas que não são excludentes e, portanto, serão apreciadas de maneira sucessiva.
O art. 33, parágrafo único, e seu inciso V, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça dispõem que compete à Col. Câmara Especial o julgamento dos recursos interpostos contra as decisões originárias que forem prolatadas pelo Corregedor Geral da Justiça nos processos administrativos instaurados contra os delegados dos serviços notariais e de registro:
“Art. 33. A Câmara Especial, presidida pelo Vice-Presidente do Tribunal, é integrada pelos Presidentes das Seções e pelo Decano.
Parágrafo único. Competirá à Câmara Especial processar e julgar:
(…)
V – os recursos das decisões originárias do Corregedor Geral da Justiça, nos processos disciplinares relativos a titulares e servidores das serventias judiciais, delegados dos serviços notariais e de registro de oficiais de justiça”.
O Regimento Interno do Tribunal de Justiça, contudo, não dispõe sobre os efeitos desse recurso administrativo.
Essa matéria é disciplinada no Capítulo XXI das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça que somente preveem o efeito suspensivo contra as decisões em que aplicada a pena de perda de delegação:
“24. Das decisões do Juiz Corregedor Permanente caberá recurso para o Corregedor Geral da Justiça, no prazo de quinze dias.
24.1. Das decisões disciplinares originárias do Corregedor Geral da Justiça caberá recurso, no mesmo prazo, para a Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
- Os recursos referidos no item 24 e subitem 24.1 serão recebidos apenas no efeito devolutivo, exceto na hipótese de perda de delegação”.
Entretanto, a execução da pena de suspensão produz efeitos irreversíveis porque retira do titular a administração direta da delegação, por tempo limitado, impedindo-o de exercer o gerenciamento administrativo e financeiro a que se refere o art. 21 da Lei nº 8.935/94.
Ademais, a pena de suspensão deve repercutir na destinação da renda líquida obtida com a prestação do serviço público delegado.
Mais que isso, diante do silêncio do Regimento Interno do Tribunal de Justiça caberia ao relator do recurso, ao menos em tese, deliberar sobre a concessão, ou não, do efeito suspensivo.
Por essas razões, é recomendável a não execução da pena de suspensão, aplicada à requerente, até o julgamento do recurso administrativo que for interposto contra a r. decisão prolatada por Vossa Excelência de forma originária.
Ressalva-se, contudo, a possibilidade de execução da pena após a decisão do recurso administrativo pela Col. Câmara Especial, independentemente da interposição de eventuais novos recursos a outros Órgãos porque não previstos no Regimento Interno do Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Por seu lado, a concessão do efeito suspensivo ao eventual recurso administrativo que for interposto perante a Col. Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo também se mostra recomendável pelos efeitos que sua aplicação terá em relação à renda da delegação.
Conforme a sistemática adotada pela Lei nº 8.935/94, o preposto substituto do § 5° do art. 20 responde nos casos de impedimento e durante todos os períodos de afastamento do titular:
“Art. 20. Os notários e os oficiais de registro poderão, para o desempenho de suas funções, contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados, com remuneração livremente ajustada e sob o regime da legislação do trabalho.
(…)
- 5° Dentre os substitutos, um deles será designado pelo notário ou oficial de registro para responder pelo respectivo serviço nas ausências e nos impedimentos do titular”.
Igual decorre do § 1º do art. 36 e do § 2º do art. 39, ambos da Lei nº 8.935/94.
O § 1º do art. 36 da Lei nº 8.935/94 dispõe que o preposto substituto responde pela delegação durante o período de suspensão preventiva do titular em decorrência de processo administrativo disciplinar, exceto se também for acusado das faltas, ou se a conveniência do serviço recomendar a nomeação de pessoa distinta:
“Art. 36. Quando, para a apuração de faltas imputadas a notários ou a oficiais de registro, for necessário o afastamento do titular do serviço, poderá ele ser suspenso, preventivamente, pelo prazo de noventa dias, prorrogável por mais trinta.
- 1° Na hipótese do caput, o juízo competente designará interventor para responder pela serventia, quando o substituto também for acusado das faltas ou quando a medida se revelar conveniente para os serviços”.
O § 2º do art. 39 da Lei nº 8.935/94, por seu lado, prevê que o preposto substituto do § 5º do art. 20 responde pelo expediente vago na hipótese de extinção da delegação, enquanto essa perdurar:
“§ 2º Extinta a delegação a notário ou a oficial de registro, a autoridade competente declarará vago o respectivo serviço, designará o substituto mais antigo para responder pelo expediente e abrirá concurso”.
Desse modo, interpretação sistemática da Lei nº 8.935/94 faz concluir que o preposto substituto do § 5° do art. 20 responde pela delegação nas hipóteses de impedimento e afastamento.
Ressalvam-se, contudo, as situações em que a manutenção do preposto substituto como responsável pela prestação do serviço não for compatível com o interesse público, como naquelas em que participou de falta disciplinar praticada pelo titular, ou poderia impedi-la, assim como na hipótese de não ter capacidade técnica suficiente para promover a gestão financeira e administrativa da unidade.
Por seu lado, na designação de responsável interinamente por delegação vaga incidem as hipóteses de vedação ao nepotismo previstas no § 2° do art. 3° Resolução nº 80/2009, do Conselho Nacional de Justiça e no v. acórdão prolatado no julgamento da Consulta nº 0001005-57.2018.2.00.0000, também do Conselho Nacional de Justiça, de que foi relator o e. Conselheiro Valtércio de Oliveira, em que reconhecida a existência de nepotismo: “…no caso de assunção à interinidade do substituto mais antigo, nos termos do art. 39, § 2º da Lei nº 8.935/94, que possua algum parentesco com o anterior delegatário…”.
A vedação ao nepotismo na designação de responsável interinamente por delegação vaga incide tanto na hipótese de consanguinidade como na de parentesco por afinidade, como decidido nos autos da Consulta nº 0001005-57.2018.2.00.0000 e previsto no Provimento nº 77/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça.
A primeira questão a ser analisada, portanto, consiste em verificar se a vedação ao nepotismo incide na substituição do titular nas hipóteses de afastamento, sem extinção da delegação, como ocorre na execução da pena de suspensão.
E assim não decorre da Resolução nº 80/2009, do Conselho Nacional de Justiça, do v. acórdãos prolatados no julgamento da Consulta nº 0001005-57.2018.2.00.0000 e dos PCAs 000785-40.2017.2.00.0000 e 0007449– 43.2.00.0000, e do Provimento nº 77/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça.
Por sua vez, no presente processo administrativo disciplinar não houve afastamento cautelar da requerente e não se tratou de eventual atuação do substituto como responsável pela autorização da prática dos atos ao final reconhecidos como irregulares.
Em razão disso, não se verifica, em princípio, impedimento para que o preposto substituto do § 5° do art. 20 da Lei nº 8.935/94 responda pela delegação durante o afastamento da titular em razão da aplicação de pena de suspensão.
Porém, isso não implica na possibilidade da titular da delegação punida com pena de suspensão, ou do preposto substituto, receberem a totalidade da renda líquida da unidade no período de afastamento.
O afastamento da titular da delegação pela imposição de pena administrativa acarreta a impossibilidade de prestar o serviço de forma direta, ou de interferir no gerenciamento administrativo e financeiro da unidade e, portanto, de receber a renda proporcionada pelo serviço público delegado.
Por outro lado, ao responsável interinamente por delegação vaga também compete o gerenciamento administrativo e financeiro da unidade, mas com vedação para a contratação de despesas que possam onerar sua viabilidade econômica, salvo se a nova despesa for imprescindível para a prestação do serviço e se houver autorização do Juiz Corregedor Permanente como previsto no §4° do art. 3° da Resolução nº 80/2009 do Col. Conselho Nacional de Justiça:
“§ 4º Aos responsáveis pelo serviço, que tenham sido designados interinamente, na forma deste artigo, é defeso contratar novos prepostos, aumentar salários dos prepostos já existentes na unidade, ou contratar novas locações de bens móveis ou imóveis, de equipamentos ou de serviços, que possam onerar a renda da unidade vaga de modo continuado, sem a prévia autorização do respectivo tribunal a que estiver afeta a unidade do serviço. Todos os investimentos que comprometam a renda da unidade vaga no futuro deverão ser objeto de projeto a ser encaminhado para a aprovação do respectivo tribunal de justiça; (…)”.
Outrossim, conforme r. decisão prolatada pelo Exmo. Ministro Gilson Dipp, então Corregedor Nacional de Justiça, nos autos do PP/CNJ nº 000384-41.2010.2.00.0000 (Evento 4289), em 12/07/2010, publicada no Diário da Justiça nº 124, a renda máxima a ser obtida pelos responsáveis interinamente por delegações vagas é limitada a 90,25% dos subsídios dos Exmos. Senhores Ministros do Supremo Tribunal Federal, com obrigação de depositar o excedente da arrecadação em favor do Fundo Especial de Despesa do respectivo Tribunal de Justiça.
A limitação da renda do responsável pela delegação que não a tenha recebido mediante outorga pelo Poder Público também é prevista no art. 6° do Provimento nº 77/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça.
O valor da remuneração dos responsáveis interinamente pelas delegações vagas é apurado trimestralmente pela diferença entre a arrecadação dos emolumentos e as despesas com a prestação do serviço.
Desse modo, o responsável interinamente por delegação vaga deve utilizar a renda da unidade para pagar todas as despesas com a prestação do serviço, depositando para o Poder Público o valor remanescente, ou seja, a diferença entre as despesas com a prestação do serviço e o valor que superar o teto remuneratório.
Aplicada à titular a pena de suspensão, durante o período do afastamento deve o responsável pela delegação submeter-se às regras que vigoram para os interinos no que se refere à vedação de contratação de despesas não justificadas e de limite de remuneração, pois nesse período existirá situação análoga ao retorno do serviço ao Poder Público delegante.
Esse entendimento mantém consonância com a vedação ao nepotismo que foi reconhecida pelo Eg. Conselho Nacional de Justiça no julgamento da Consulta nº 0001005-57.2018.2.00.0000, anteriormente referida.
Ainda, o referido entendimento é compatível com o v. acórdão prolatado Procedimento de Controle Administrativo nº 0007585-40.2017.2.00.0000 de que foi relator o e. Ministro João Otávio de Noronha, e com o v. acórdão prolatado no Procedimento de Controle Administrativo nº 0005414-13.2017.2.00.0000, de que foi relatora a e. Conselheira Maria Teresa Uille Gomes, sendo decidido, em ambos, que aos interinos responsáveis por delegação vaga aplica-se o regime de direito público.
Portanto, no período de afastamento da titular da delegação decorrente da execução da pena administrativa de suspensão deve a renda líquida que exceder 90,25% dos subsídios dos Exmos. Ministros do Supremo Tribunal Federal ser revertida ao Estado mediante depósito em favor do Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça, com adoção das normas aplicáveis para os responsáveis interinamente pelas delegações vagas.
Interpretação diversa permitiria ao preposto substituto obter renda superior à dos responsáveis interinamente pelas delegações vagas, o que não se coaduna com a suspensão dos efeitos da outorga da delegação que ocorre em relação à titular durante o período de execução da pena de suspensão.
Ademais, ainda que em tese, a não limitação da renda líquida poderia ensejar seu repasse ao titular da delegação mesmo durante o período da suspensão, pois mantém a qualidade de empregadora do preposto substituto, o que ensejaria a frustação de uma das finalidades da pena administrativa disciplinar.
Por fim, cabe registrar a existência de precedente desta Eg. Corregedoria Geral da Justiça no sentido de que durante a execução da pena de suspensão a renda do substituto é limitada ao teto previsto para os interinos, como decidido pelo Exmo. Desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, então Corregedor Geral da Justiça, no Processo nº 2016/31.915, em que foi aprovado r. parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, Dr. Swarai Cervone de Oliveira, que teve a seguinte ementa:
“DISCIPLINAR – APLICAÇÃO DE PENA DE SUSPENSÃO – ANTERIOR INTERVENÇÃO, QUE SÓ DEVE PERDURAR ATÉ A SENTENÇA – APLICADA PENA DE SUSPENSÃO, CESSA A INTERVENÇÃO E, AFASTADO O TITULAR, ASSUME, DURANTE O PERÍODO DE SUSPENSÃO, O SEU SUBSTITUTO – TITULAR QUE, SUSPENSO, PERDE SEUS DIREITOS E VANTAGENS – REMUNERAÇÃO DO SUBSTITUTO QUE DEVE OBEDECER AO TETO PREVISTO PARA OS INTERINOS – EXEGESE DOS ARTIGOS 35 E 36 DA LEI 8.935/94 E 254, § 1°, DA LEI ESTADUAL 10.261/68”.
Ante o exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de fixar os seguintes parâmetros para a execução da pena de suspensão imposta à requerente:
- I) ressalvado o que for decidido sobre a matéria por seu relator, a execução da pena de suspensão terá início após a decisão do recurso administrativo pela Câmara Especial, independentemente da interposição de eventuais novos recursos administrativos a outros Órgãos porque não previstos no Regimento Interno do Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;
- II) durante a execução da pena de suspensão responderá pela delegação o preposto substituto designado na forma do art. 20, § 5°, da Lei nº 8.935/94, salvo se assim não se mostrar conveniente em prol do serviço público em razão de fato a ser apurado de forma própria;
III) no período de afastamento da titular da delegação decorrente da execução da pena administrativa de suspensão a renda líquida da unidade que exceder 90,25% dos subsídios dos Exmos. Ministros do Supremo Tribunal Federal será revertida ao Estado, com depósito em favor do Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, aplicando-se ao preposto substituto as demais normas de vedação à contratação de funcionários e majoração de despesas a que estão sujeitos os responsáveis interinamente pelas delegações vagas.
Sub censura.
São Paulo, 7 de janeiro de 2019.
José Marcelo Tossi Silva
Juiz Assessor da Corregedoria
DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto. Intime-se. São Paulo, 08 de janeiro de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: JOSÉ DE MELLO JUNQUEIRA, OAB/SP 18.789 e ÁLVARO CELSO DE SOUZA JUNQUEIRA, OAB/SP 161.807.
Diário da Justiça Eletrônico de 22.01.2019
Decisão reproduzida na página 016 do Classificador II – 2019
Fonte: INR – Publicações
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