O Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo (CNB/SP) disponibiliza a decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP), referente ao processo n° 1050363-28.2024.8.26.0100
Pedido de Providências – Petição intermediária – N.J.M. – VISTOS. A matéria aqui ventilada será objeto de apreciação no limitado campo de atribuição desta Corregedoria Permanente, que desempenha, dentre outras atividades, a verificação do cumprimento dos deveres e obrigações dos titulares de delegações afetas à Corregedoria Permanente desta 2ª Vara de Registros Públicos da Capital. Assim, delimitado o alcance do procedimento, recebo a presente ação intitulada “procedimento comum” como Pedido de Providências. De início, indefiro o pedido de autorização para inspeção dos registros de testamentos cerrados, livros e arquivos correspondentes pela parte interessada no arquivo do ********** de Notas desta Capital. Isso porque: Pode-se dizer que a publicidade nos registros é a denominada publicidade indireta, uma vez que o acesso do público refere-se às informações constantes do registro, e não propriamente aos livros das serventias. Eventuais diligências judiciais ou extrajudiciais que exigirem a apresentação de livros, papéis ou quaisquer documentos arquivados na serventia deverão ser realizadas dentro do próprio cartório e, caso haja necessidade de saída de referidos documentos, é imprescindível que se tenha autorização judicial (arts. 22 e 23 da Lei 6.015/1973). Quando se fala em publicidade indireta, quer-se dizer que o acesso do usuário às informações constante do registro se faz por meio do fornecimento de certidão. Qualquer pessoa interessada pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido. Esse pedido pode ser feito por escrito, verbalmente ou ainda pela internet, atendendo aos requisitos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça, com a utilização de assinatura eletrônica avançada ou qualificada, conforme definido no art. 4º da Lei 14.063, de 23 de setembro de 2020 (art. 38 da Lei 11.977/2009) (GENTIL, Alberto. Registros Públicos. 4ª. Ed. Rio de Janeiro: Método, 2023, p. 762, grifei). Assim, “em regra, nos registros públicos, como consta do art. 16 da Lei 6.015/1973, a publicidade é indireta, sendo materializada por meio da expedição de certidões ou pela prestação de informações, não havendo acesso direto (publicidade direta) a livros e demais documentos balizadores dos atos registrados” (GENTIL, Alberto. Registros Públicos. 4ª. Ed. Rio de Janeiro: Método, 2023, p. 364) – grifei. O fundamento para tanto recai, sobretudo, na necessidade de se resguardar (i) a integridade física do acervo, que está sob responsabilidade do delegatário, bem como (ii) os dados pessoais que possuam natureza sigilosa ou restrição legal de acesso consignados nos documentos mantidos na unidade, os quais, após o advento da Lei Geral de Proteção de Dados, passaram a dispor de ainda maior proteção e cuidado. Seria temerário, portanto, deixá-los à livre disposição de particulares sem qualquer baliza. E se trata, inclusive, de questão já examinada pela Egrégia Corregedoria Geral de Justiça: Serventia Extrajudicial – Acervo documental – Requerimento formulado por empresa particular que busca autorização para examinar, digitalizar e divulgar via internet parte dos acervos de diversos – Tabeliães de Notas – Impossibilidade – Acesso ao acervo que dá por meio de certidões ou pedido de informações – Serviço Público prestado em caráter privado – Dever de guarda e sigilo – Indeferimento. É certo que o acervo das Serventias Extrajudiciais tem natureza pública, isto é, pertencem ao Estado e não ao titular que, momentaneamente, exerce a delegação que lhe foi outorgada por meio de concurso público. […]. Mas é preciso observar que o fato de ser público não torna o acervo acessível a qualquer pessoa. São as informações – e não os livros que as contêm – que estão ao alcance de todos, excetuados os casos resguardados por sigilo. Essa conclusão se extrai da Lei de Registros Públicos, cujo art. 16 traz as formas pelas quais o usuário dos serviços notariais e registrais pode ter acesso ao acervo: certidão ou pedido de informações. […]. Se o acesso do particular ao acervo ocorresse por meio de contato direto com os livros e demais documentos arquivados nas Serventias Extrajudiciais, o conteúdo protegido por sigilo restaria comprometido, porque o titular da delegação não teria como controlar, a cada manuseio das páginas dos livros, o que o usuário está vendo. Foi por isso que o legislador fixou como critério o acesso indireto ao acervo por meio de certidão ou informações. Só assim o titular da Serventia Extrajudicial tem condições de filtrar os dados que serão entregues aos solicitantes, preservando os sigilosos. Além de zelar pelo conteúdo dos registros, os notários e registradores também são responsáveis pela guarda física do acervo. […]. Se de um lado a lei lhes impõe o ônus de preservar fisicamente o acervo, de outro, ao prever que o acesso ao conteúdo registral se dá por certidão ou pedido de informações, assegura meio para que possam cumprir com essa incumbência, mantendo o usuário afastado dos livros e documentos arquivados na Serventia. E é exatamente por isso que, em caso de dano ou extravio injustificado, o titular da Serventia não pode se furtar da responsabilidade. Há livros que, de tão antigos, se danificam pelo simples manuseio. E, muito embora alguns registradores façam manutenção deles, o manejo por pessoa não habilitada pode dar ensejo à perda da informação neles contidas. […]. Todas as informações constantes nos acervos das Serventias Extrajudiciais, por mais singelas que possam parecer, são dotadas de valor e relevância. Mesmo os dados isolados que, aparentemente, são desprovidos de importância, podem, uma vez contextualizados, causar dano à privacidade e intimidade das pessoas, mormente se disponibilizadas na internet, onde uma simples ferramenta de busca pode cruzar diversos registros de forma a criar o perfil de um indivíduo. […] (CGJ/SP, Processo 2.070/2014, DJ 09/04/2014) – grifei. E o pedido alternativo, consistente na realização de visita correcional, revela-se igualmente inapropriado, por tampouco se prestar ao fim pretendido, uma vez que se trata de medida voltada ao interesse público e não pode ser desvirtuada para o atendimento de questões pontuais de particulares. Feitas tais considerações, manifeste-se o Sr. Tabelião. Com o cumprimento, intime-se o Sr. Representante para manifestação no prazo de 05 (cinco) dias. Após, com ou sem manifestação, ao Ministério Público. Intime-se. – ADV: RENATO ROSAS MACHADO PETERMANN (OAB 501722/SP) (DJe de 10.05.2024 – SP)
Fonte: TJ/SP
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