Cada vez mais a Inteligência Artificial tem ocupado espaço na área de Gestão de Pessoas, ampliando as possibilidades e trazendo inúmeros desafios

 

É inquestionável a necessidade de investir na aplicação de Inteligência Artificial na Gestão de Pessoas e não apenas no negócio. Essa afirmação se respalda em dados cada vez mais relevantes indicados em diversas pesquisas sobre IA e no papel estratégico da área de Gestão de Pessoas nos resultados organizacionais, na experiência do empregado e especialmente na gestão da transformação cultural. Para citar apenas um exemplo dessa associação, uma pesquisa publicada pela PwC indica que 67% dos CEOs no Brasil (49% no mundo) acreditam que inovações tecnológicas, como a IA, terão um grande impacto na lucratividade nos próximos dez anos.

 

Pela dimensão continental e pela grande diversidade cultural do Brasil, sabe-se que as organizações privadas ou públicas, de diferentes tamanhos, estão em estágios de maturidade muito diferenciados no uso de tecnologia e nas práticas de recursos humanos.

 

Algumas das aplicações da IA na Gestão de Pessoas que se tornaram rapidamente popularizadas foram os Assistentes Virtuais e Chatbots, para fornecer informações aos funcionários em questões relacionadas aos processos de recursos humanos, como por exemplo, solicitações de licença e outros benefícios e atualizações de políticas.

 

A adoção de People Analytics foi incrementada pelo uso da IA, pois ficou mais fácil coletar, organizar e analisar os dados para tomada de decisão. Estudos mostram que algoritmos de IA podem ser usados para prever a rotatividade de funcionários com uma precisão significativamente maior do que os métodos tradicionais. Por exemplo, a IBM conseguiu reduzir sua taxa de rotatividade em 20% usando análises preditivas baseadas em IA para identificar funcionários com maior probabilidade de deixar a empresa.

 

Na contrapartida, a coleta e o uso de dados pessoais para alimentar sistemas de IA provoca sérias preocupações sobre a privacidade e a segurança das informações dos funcionários, exigindo uma rigorosa conformidade com as leis de proteção de dados e com a adequação a padrões éticos das organizações.

 

A IA pode automatizar tarefas repetitivas e burocráticas, liberando tempo para os profissionais se concentrarem em atividades mais estratégicas e de maior valor agregado, onde certamente tem mostrado a sua maior aplicação.

 

Isto remete a um grande desafio de capacitação das pessoas em novas skills para assumir estas atividades de maior valor agregado, o que passa a ser missão das próprias organizações, para não gerar impactos sociais mais preocupantes do que os atualmente conhecidos, assim, poder aproveitar seus talentos em prol de maximizar seus resultados, enquanto o sistema educacional brasileiro não for repensado e reestruturado para preparar os seus egressos para o futuro do trabalho.

 

Ao reduzir a necessidade de trabalho mecânico, a IA pode tornar a vida profissional dos funcionários mais fácil e atraente. Por exemplo, ao dar a eles oportunidade e capacitação para trabalhar com IA de ponta, a organização pode ajudar a aumentar o valor de seus profissionais. Já existem aplicações em que a IA pode até ajudar a fornecer suporte emocional no local de trabalho, combatendo a perda de produtividade e o esgotamento.

 

Pesquisa da Society for Human Resource Management (SHRM), mostra que quase 1 em cada 4 organizações relatam o uso de automação ou Inteligência Artificial para apoiar atividades relacionadas a RH, incluindo recrutamento e contratação. Daqueles que usam essas ferramentas, 2 em cada 3 profissionais de RH dizem que o tempo que leva para preencher as vagas abertas é um pouco (53%) ou muito melhor (16%) devido ao uso de automação ou IA. No entanto, apenas 2 em cada 5 empregadores que adquirem estas ferramentas afirmam que o seu fornecedor é muito transparente sobre as medidas tomadas para garantir que as ferramentas protegem contra preconceitos.

 

O emprego de algoritmos para análise de currículos, triagem, cruzamento de informações sobre perfil comportamental e competências exigidas para o cargo, permite análise preditiva, podendo reduzir tempo e custo do processo de seleção.

 

Especificamente, recrutamento e seleção apresentam um grande paradoxo, pois apesar de terem probabilidade de reduzir os vieses e permitir práticas de diversidade e inclusão, se não forem adequadamente projetados, os algoritmos de IA podem perpetuar e até amplificar o viés humano, reproduzindo práticas discriminatórias típicas dos processos que envolvem avaliação, como é o caso da seleção e das promoções dentro das empresas.

 

Os chatbots também são adotados nos processos de onboarding, dando assistência virtual para auxiliar e orientar os novos colaboradores durante os processos de integração à nova organização, bem como, para coletar feedbacks regulares, identificando possíveis problemas, tais como, de engajamento e reclamações frequentes do time, por exemplo.

 

Já existem boas práticas de uso da IA para fornecer treinamento e desenvolvimento personalizado aos funcionários. Isso inclui a análise de dados de desempenho e preferências individuais para recomendar cursos de capacitação, planos de desenvolvimento de carreira sob medida e programas de benefícios, que possibilitem a personalização da experiência de cada colaborador.

 

Uma antiga máxima da gestão de pessoas, que continua atual, é “colocar a pessoa certa no lugar certo”, com um software de gestão a empresa consegue desenhar quais são as competências necessárias para o exercício de determinado cargo, tornando mais rápido encontrar no quadro interno ou externo de candidatos, aqueles que mais se encaixam com essas características, auxiliando na realocação de colaboradores e nas avaliações de desempenho, identificando lacunas de habilidades e sugerindo planos de desenvolvimento personalizados.

 

Algumas empresas já adotam sistemas de reconhecimento automatizado para identificar e recompensar os colaboradores de alto desempenho, aumentando a motivação, o engajamento e a produtividade.

 

Um problema muito recorrente a todo o tipo de organização é a comunicação. A IA pode automatizar tarefas rotineiras de comunicação, como envio de e-mails, criação de relatórios, tradução de idiomas, personalização de mensagens de acordo com as necessidades individuais dos funcionários, inclusive quanto a deficiências visuais e auditivas, garantindo uma comunicação mais fluída, natural e eficaz. A IA também pode ser empregada para analisar dados de comunicação, como e-mails, conversas e reuniões, permitindo aos profissionais de RH identificar padrões e tendências, bem como melhorar a eficácia de suas estratégias de comunicação. Isso libera tempo para os profissionais de RH se concentrarem nos relacionamentos e na construção de confiança com todos os seus stakeholders.

 

As organizações estão agora mais cientes de que a IA não é somente mais uma opção, mas, uma tecnologia mandatória, de acordo com a pesquisa da PwC, 94% agora acreditam que a IA ajudará a criar mais oportunidades do que ameaças ao seu setor. Segundo essa pesquisa, o que diferencia as empresas que alcançam elevados resultados com adoção da IA é que em vez de se concentrar primeiro em um objetivo e depois passar para o próximo, elas adotam uma abordagem holística e avançam com a IA em três áreas ao mesmo tempo: transformação de negócios, tomada de decisões aprimorada e sistemas e processos modernizados.

 

Apesar da perspectiva de perda de empregos causada pela IA, os entrevistados mencionam com mais frequência os impactos positivos do que os negativos. O sentimento mais comum, expresso por 43% dos participantes no Brasil e 31% no mundo, é que a IA ajudará a ampliar a produtividade/eficiência no trabalho. A força de trabalho remota confia mais em assistentes digitais baseados em IA para fazer seu trabalho sem perda de produtividade do que em sistemas convencionais de orientação e controle. Por outro lado, tais preocupações relacionadas com a substituição de empregos também precisam ser abordadas: deve-se considerar que nem todos os profissionais se adaptam igualmente a novas ferramentas tecnológicas, portanto, é necessário dar esse espaço para a aquisição de novas competências. A resistência cultural à IA, assim como ocorre em todo processo de transformação digital, como já tratado aqui em outros artigos, precisa ser trabalhada.

 

O uso responsável da IA requer experiência em tecnologia e negócios. Os profissionais de IA podem, por exemplo, não se dar conta do impacto sobre a conformidade ou a marca, quando a IA toma decisões com base em conjuntos de dados históricos, que podem estar repletos de preconceitos. Especialistas em negócios e riscos podem não ter as habilidades técnicas para prever o desempenho de algoritmos altamente complexos quando as circunstâncias mudam. Como a IA altera continuamente sua própria tomada de decisão com base em novos dados, ela exige governança e proteção que acompanhem esse movimento.

 

A dependência excessiva da IA pode levar a área de Gestão de Pessoas ao risco da perda de seu propósito, que é de preservar na gestão os valores de dignidade humana. A falta de interação humana e de empatia são elementos essenciais que precisam ser cuidadosamente tratados durante o processo de implementação da IA em seus diversos aspectos e rotinas que envolvem o ciclo de vida do colaborador na organização.

 

Uma gestão pautada nas regulamentações já existentes, padrões éticos bem definidos e equilíbrio com interações humanas e uso da inteligência natural, emocional e criativa do ser humano, podem mitigar os riscos e maximizar os impactos positivos do uso da IA na gestão de pessoas, melhorando a experiência dos colaboradores, fortalecendo os líderes e agregando valor aos resultados organizacionais.

 

Fonte: Mit Technology Review

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