Pares não chegaram a um consenso se a DNV – declaração de nascido vivo deve conter categorias tradicionais de “mãe e pai” junto a termos mais inclusivos como “parturiente e responsável legal”
Nesta quarta-feira, 18, em sessão plenária, ministros do STF discutiram quais termos devem constar na DNV – Declaração de Nascido Vivo do SUS, considerando que as categorias “mãe” e “pai” excluem homens trans gestantes.
Os pares retomaram a análise de ADPF previamente julgada no plenário virtual. Naquela ocasião, haviam decidido pela procedência do pedido principal da ação, determinando que o ministério da Saúde tomasse medidas para garantir o pleno acesso de pessoas trans às políticas públicas de saúde e consultas médicas, independentemente do sexo biológico registrado.
No entanto, com relação ao segundo pedido, que tratava do uso discriminatório das terminologias “mãe” e “pai” na DNV, não houve consenso entre os ministros.
O relator, ministro Gilmar Mendes, ainda no ambiente virtual, havia votado pela perda do objeto, pois, após o ajuizamento da ação, houve alteração administrativa que substituiu os termos “mãe” e “pai” por “parturiente” e “responsável legal” nas DNVs.
Por outro lado, ministro Edson Fachin defendeu que o pedido ainda deve ser analisado pela Corte, visando a consolidação do entendimento, já que a mudança foi feita via decisão administrativa, a qual poder ser revertida em futuras gestões.
Mãe ou parturiente?
Nesta tarde, ministros André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes e Flávio Dino, defenderam que os termos “mãe” e “pai” sejam também contemplados da DNV.
Embora Mendonça tenha reconhecido que “parturiente” atende à ideia de inclusão, ponderou acerca da necessidade de garantir que aqueles que preferem as designações tradicionais também sejam respeitados.
“Aqueles que querem uma designação mais genérica, como parturiente, têm todo o direito, mas há outras pessoas que querem uma designação que consideram mais pertinente, como maternidade ou paternidade.”
- Exa., então, sugeriu a inclusão das opções “pai” e “mãe” ao lado de “parturiente”, para atender às diferentes convicções pessoais, citando que a própria CF faz essa referência em casos de nacionalidade.
Ministro Nunes Marques, por sua vez, defendeu que o objetivo do STF sempre foi assegurar o direito à igualdade sem discriminação.
“Nossa preocupação no Supremo é trazer abaixo o direito à igualdade sem nenhuma discriminação.”
Argumentou que a inclusão do termo “parturiente” deve harmonizar, e não dividir, a sociedade brasileira, sendo fundamental preservar o direito das mães de serem reconhecidas como tal.
“As mães brasileiras também têm o direito subjetivo de serem reconhecidas como mães.”
O ministro enfatizou que a sociedade deve ter a opção de escolher a designação que melhor reflete suas convicções, sem que isso resulte em um conflito de direitos.
Ainda, destacou que, independentemente da língua ou da cultura, a palavra “mãe” é uma das mais constantes em seu significado e escrita ao redor do mundo:
“Talvez seja uma das expressões no planeta Terra que mais se escreve de forma idêntica. Mãe, no inglês, no francês, no espanhol, em russo.”
Chamou o argumento de “apelo romântico”, como tentativa de sensibilizar os demais ministros para a importância cultural e simbólica da palavra.
Veja o debate:
https://www.youtube.com/watch?v=MZVeNSuv7BU&source_ve_path=MjM4NTE
Terminologia para minorias
Em sentido diverso, ministro Edson Fachin, posicionou-se em defesa dos direitos das minorias, destacando o papel do Supremo em defender grupos historicamente discriminados.
- Exa. explicou que o uso do termo “parturiente” foi uma tentativa de criar denominação inclusiva, que abarcasse tanto as mulheres cisgênero quanto os homens trans gestantes, sem impor carga discriminatória.
“O vocábulo parturiente compreende, evidentemente, a mãe, como também o homem trans que vai ao parto e que, embora não se reconheça como mãe, biologicamente é parturiente.”
Fachin propôs, alternativamente, a inclusão dos termos “genitora” e “genitor”, evitando conotações culturais e religiosas associadas às designações tradicionais.
Tecnicamente incorreto
Ministro Flávio Dino, de forma descontraída, ilustrou a complexidade da questão com um relato pessoal.
“Hoje é aniversário da minha mãe, e se eu ligar para ela e disser ‘feliz aniversário, minha parturiente’, ela vai brigar comigo.”
Dino defendeu que a solução ideal talvez fosse delegar à autoridade administrativa a criação de um formulário inclusivo e a escolha das terminologias adequadas. No entanto, alertou que o termo “responsável legal” seria tecnicamente incorreto.
O julgamento foi novamente suspenso, após pedido do relator, ministro Gilmar Mendes. Os ministros devem decidir, oportunamente, se o formulário deve manter os termos “parturiente” e “responsável legal” ou se cabe mudança para “parturiente/mãe” e “responsável legal/pai”.
O caso
A ADPF foi ajuizada pelo PT, denunciando dificuldades enfrentadas por pessoas transgênero e travestis para acessar as políticas públicas de saúde e consultas médicas no SUS, considerando que, em muitos casos, a fisiologia não corresponde à identidade de gênero.
Além disso, o partido questionou a vinculação do sexo biológico à categoria “mãe” nas DNV – Declarações de Nascido Vivo, mesmo em casos envolvendo homens trans gestantes.
Processo: ADPF 787
Fonte: Migalhas
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