Registro de Imóveis – Pedido de providências – Cancelamento do registro de direito real de habitação constante de escritura pública de inventário e partilha – Art. 1.831 do CC – Direito real oriundo do direito sucessório – Art. 167, I, item 7, da Lei de Registros Públicos – Regularidade da cobrança dos emolumentos – Item 1.5. da tabela II da Lei Estadual nº 11.331/2002 – Desprovimento do recurso.
 
Número do processo: 0011489-19.2019.8.26.0309
 
Ano do processo: 2019
 
Número do parecer: 444
 
Ano do parecer: 2020
 
Parecer
 
PODER JUDICIÁRIO
 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
 
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
 
Processo CG n° 0011489-19.2019.8.26.0309
 
(444/2020-E)
 
Registro de Imóveis – Pedido de providências – Cancelamento do registro de direito real de habitação constante de escritura pública de inventário e partilha – Art. 1.831 do CC – Direito real oriundo do direito sucessório – Art. 167, I, item 7, da Lei de Registros Públicos – Regularidade da cobrança dos emolumentos – Item 1.5. da tabela II da Lei Estadual nº 11.331/2002 – Desprovimento do recurso.
 
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,
 
MARIA CÉLIA ZANOTI e outros interpõem recurso contra a r. sentença de fl. 53/54, que julgou improcedente o pedido de providências, que buscava o cancelamento do registro do direito real de habitação, bem como a restituição do décuplo da quantia irregularmente cobrada.
 
Em síntese, sustentam os recorrentes a impossibilidade de registro do direito real de habitação em favor da viúva meeira por ausência de previsão legal ou jurisprudencial, e por se tratar de direito de família, em consonância com o art. 167, inciso I, item 7, da Lei nº 6.015/73; a inaplicabilidade da cobrança de emolumentos relativos ao usufruto, por analogia, ante a inexistência de previsão da tabela de emolumentos e na ausência de autorização da Corregedoria Geral da Justiça.
 
A D. Procuradoria da Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fl. 131/134).
 
Por meio da decisão monocrática de fl. 136/137 reconheceu-se a incompetência do C. Conselho Superior da Magistratura, encaminhando-se os autos à Corregedoria Geral da Justiça.
 
Instada, a Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo – ARISP manifestou-se a fl. 157/158.
 
Opino.
 
Foi submetida à qualificação e registro a escritura pública de inventário e partilha de fl. 19/27 em que restou atribuído à viúva meeira, Maria Célia Zanoti, o direito real de habitação.
 
A escritura foi registrada em 3 de maio de 2019 com a prática dos seguintes atos: Av. 07 averbação do óbito de Osvaldo Zanoti; R. 08 registro da partilha do imóvel; R. 09 registro do direito real de habitação em favor da viúva meeira Maria Célia Zanoti.
 
Consoante esclarecido pelo Oficial, o registro foi efetivado consoante título apresentado, escritura pública de inventário e partilha, cujo item 15 atribuiu o direito real de habitação à viúva meeira.
 
Conforme dispõe o Art. 1.831 do Código Civil:
 
“Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar”.
 
Trata-se, pois, de direito real ex vi legis, isto é, nasce automaticamente com a abertura da sucessão e é conferido a favor do cônjuge sobrevivente, independentemente, para sua instituição, de ato lavrado e previsto em partilha de bens.
 
Contudo, conquanto despiciendo seu apontamento na escritura pública, certo é que, uma vez constante do título, o direito real de habitação com natureza sucessória, deveria, de fato, ter sido registrado.
 
A situação amolda-se ao disposto no Art. 167, I, item 7, da Lei de Registros Públicos:
 
“Art. 167. No Registro de imóveis, além da matrícula, serão feitos:
 
I – o registro:
 
(…)
 
7) do usufruto e do uso sobre imóveis e da habitação, quando não resultarem do direito de família”.
 
Da leitura do citado artigo verifica-se que não se submete ao registro o direito real de habitação quando proveniente do direito de família.
 
No entanto, o direito real de habitação telado não é oriundo do direito de família, mas sim do direito sucessório, de modo que correto o registro efetivado à vista do título apresentado.
 
Tampouco há se falar em cindibilidade do título.
 
Com efeito, vigora no Registro de Imóveis o princípio da rogação, ou da instância, com necessidade de solicitação do registro pelo apresentante do título ou pela autoridade competente.
 
E a existência de dois ou mais atos distintos no mesmo título impõe o registro de todos quando forem ligados entre si.
 
É, neste sentido, a lição de Afrânio de Carvalho (“Registro de Imóveis”, 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1988, p. 272):
 
“(…) Em suma, a atividade de ofício caberá:
 
(…)
 
C) quando, no mesmo título, se reunirem dois ou mais atos distintos, mas ligados entre si, caso em que se fará o registro de todos”.
 
Trata-se de norma protetiva dos titulares dos diferentes direitos reais que decorrerão do registro dos dois ou mais atos contidos no mesmo título e que não poderia ser afastada pela simples manifestação dos recorrentes no sentido de que não pretendiam a constituição do direito real de habitação.
 
Também não se vislumbra irregularidade quanto à cobrança dos emolumentos referentes ao registro do direito real de habitação.
 
Conquanto não conste expressamente das notas explicativas da Tabela II da Lei Estadual nº 11.331/2002, certo é que o registro do direito real de habitação assemelha-se ao registro do usufruto, sendo ambos direitos reais de fruição sobre coisa alheia, a autorizar a aplicação, por analogia, do item 1.4., atual 1.5. da mencionada tabela.
 
“No caso de usufruto, a base de cálculo será a terça parte do valor do imóvel, observando o disposto no item 1”.
 
É, nestes moldes, o Art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro:
 
“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.
 
Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submete-se à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de ser negado provimento ao recurso interposto.
 
Sub censura.
 
São Paulo, 14 de outubro de 2020.
 
LETICIA FRAGA BENITEZ
 
Juíza Assessora da Corregedoria
 
DECISÃO: Vistos. Aprovo o parecer da MM.ª Juíza Assessora da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso interposto. São Paulo, 15 de outubro de 2020. (a) RICARDO ANAFE, Corregedor Geral da Justiça – Advogado: GUSTAVO CASTIGLIONI TOLDO, OAB/SP 398.781.
 
Diário da Justiça Eletrônico de 21.10.2020
 
Decisão reproduzida na página 125 do Classificador II – 2020