Herança parece ser um daqueles assuntos inesgotáveis e embora os testamentos sejam muito populares em outros países, no Brasil ainda há certa dose de superstição. Contudo, volta e meia recebo em meu escritório herdeiros e “pretendentes” ao posto de herdeiro, ansiosos para entender os meandros legais que os aproximam – ou que os afastam – da herança.
 
Revendo esses processos, selecionei algumas dúvidas mais comuns, e que ainda não foram comentadas nesta coluna. Aqui estão elas. Aproveite para se informar.
 
O que acontece com a herança quando não há testamento?
 
Se uma pessoa morre sem deixar testamento, seu patrimônio será dividido entre os herdeiros de acordo com a ordem da vocação hereditária, isto é, a ordem sucessória estabelecida pelo Código Civil.
 
Os primeiros na ordem sucessória são os descendentes (filhos, netos e bisnetos) e o cônjuge do falecido. Se não houver descendentes, os próximos a serem chamados serão os ascendentes (pais ou, na ausência destes, avós e bisavós), e também o cônjuge. Não havendo descendentes nem ascendentes, a totalidade dos bens cabe somente ao cônjuge.
 
Na linguagem jurídica, este grupo é chamado de “herdeiros necessários”. Se não houver cônjuge, a herança caberá aos parentes colaterais, na seguinte ordem: irmãos, sobrinhos, tios e primos. No que diz respeito aos primos, estão incluídos apenas os colaterais de quarto grau, popularmente chamados de “primos-irmãos”.
 
É importante notar que uma classe de herdeiros exclui a outra. Por exemplo: se o falecido tiver esposa e filhos, os pais não recebem nada. Se tiver apenas esposa, a herança será dividida entre ela e os pais do falecido. Se tiver apenas pais, ou apenas esposa, os irmãos não têm direito à herança.
 
Se tiver apenas irmãos (e nenhum herdeiro necessário), os tios e sobrinhos não irão herdar coisa alguma, e assim por diante. Se o autor da herança quiser beneficiar algum parente que não seja herdeiro necessário, ele deverá fazer um testamento.
 
E se a pessoa não tem herdeiros, para onde vai a herança?
 
Se o falecido não tem herdeiros nem deixou testamento, a herança é considerada jacente, isto é, ficará em poder do Estado.
 
O regime de bens do casamento influencia a parte que cabe ao viúvo ou viúva?
 
Sim, e é muito importante dispor dessa informação ao optar pelo regime de bens (o que, convém lembrar, deve ser feito antes do casamento). Se, por exemplo, o regime escolhido for o da comunhão parcial de bens, o cônjuge sobrevivente tem direito à metade do que foi adquirido durante o casamento (meação) e à parte do que foi adquirido ou herdado antes do casamento (que é a herança propriamente dita).
 
Cada regime tem suas peculiaridades no que diz respeito à sucessão. A única exceção é quando o falecido não possui descendentes nem ascendentes. Nesse caso, só o cônjuge herda tudo, independentemente do regime de bens.
 
Quais são os direitos dos sogros, genros, noras e enteados?
 
Este grupo, que recebe o nome de “parentes por afinidade”, não está incluído na herança – a menos que o falecido tenha deixado um testamento no qual eles são beneficiados. Se não deixar, eles não recebem nada. Isso é válido inclusive nos casos em que o falecido não tem nenhum outro parente além dos enteados, por exemplo. A única forma de garantir que eles recebam alguma coisa é por meio de testamento.
 
Filhos adotivos são herdeiros?
 
A Constituição Federal de 1988 extinguiu toda e qualquer diferença entre filhos. Se a adoção foi feita conforme determina a lei, os adotivos possuem os mesmos direitos que os filhos biológicos no que diz respeito à herança.
 
Divorciada tem direito à herança do ex-marido?
 
Se a sentença do divórcio já foi publicada e a partilha dos bens do casal já foi feita, o ex-cônjuge não tem direito à herança.
 
E na união estável? O companheiro fica com alguma coisa?
 
Se a união estável for comprovada, o companheiro sobrevivente tem direito à parte do que foi adquirido durante a união. Porém, embora o artigo 1.725 do Código Civil estabeleça que na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se o regime da comunhão parcial de bens, o fato é que existem exceções no que diz respeito à sucessão.
 
No caso do regime da comunhão parcial de bens, na ausência de outros herdeiros necessários (descendentes e ascendentes), o cônjuge herda tudo. Mas o mesmo não se aplica à união estável.
 
Nesse caso, o companheiro sobrevivente só será o único herdeiro quando o falecido não tiver parentes sucessíveis (incisos III e IV do artigo 1.790), o que inclui, além dos herdeiros necessários, os colaterais até o quarto grau (irmãos, tios, sobrinhos ou primos). Se tiver, a herança será dividida entre eles e o companheiro sobrevivente.
 
Quem herda alguma coisa é obrigado a pagar imposto? Quanto?
 
O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de quaisquer Bens ou Direitos, ou ITCMD, é pago apenas quando a herança ultrapassa um determinado valor. Porém, como se trata de um tributo estadual, o valor a partir do qual é necessário pagá-lo pode variar de estado para estado. O mesmo ocorre com as regras usadas para calcular os valores a serem pagos.
 
No Estado de São Paulo, por exemplo, as isenções são calculadas com base na Ufesp, que é a unidade fiscal estadual. Estão isentos de impostos de transmissão causa mortis: o imóvel residencial cujo valor não ultrapassar 5 mil Ufesps, desde que os familiares beneficiados nele residam e não tenham outro imóvel; e o imóvel cujo valor não ultrapassar 2.500 Ufesps, desde que seja o único transmitido. O valor da Ufesp costuma ser reajustado. O deste ano, por exemplo, foi fixado em R$ 18,44. Faça as contas.
 
*Ivone Zeger é advogada especialista em Direito de Família e Sucessão. Membro efetivo da Comissão de Direito de Família do IASP, do IBDFAM e da OAB/SP, é autora dos livrosHerança: Perguntas e Respostas, Família: Perguntas e Respostas e Direito LGBTI: Perguntas e Respostas (Mescla Editorial). Fanpage: www.facebook.com/IvoneZegerAdvogada e blog: http://ivonezeger.com.br/