O juiz auxiliar da equipe do extrajudicial da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo (CGJ/SP), Paulo Cesar Batista dos Santos, iniciou a carreira de magistrado em 2003, como juiz de Direito do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ/BA). Em 2007, ingressou no Tribunal da Justiça de São Paulo (TJ/SP) e após passar por diversas jurisdições, foi designado para a 1ª Vara de Registros Públicos da Capital, onde ficou até ser convocado para atuar como juiz auxiliar da CGJ/SP para o biênio 2018/2019.

Em entrevista exclusiva ao Jornal do Notário, o magistrado opina sobre avanços das NSCGJ/SP, aponta importância de estudos e discussões acerca de Direito Notarial, analisa o papel da usucapião extrajudicial hoje e faz ponderações sobre os novos núcleos familiares existentes. “Hoje em dia, estamos lidando com a socioafetividade, a multiparentalidade, dentre outras figuras que simplesmente existem, e que o Direito precisa regulamentá-las”, pontuou. “O desenvolvimento de estudos, de verdadeira doutrina notarial, possui uma importância invulgar no desempenho dessa tão relevante atividade”.

Leia abaixo a entrevista na íntegra:

Jornal do Notário: O senhor poderia nos contar um pouco sobre sua trajetória profissional?

Paulo Cesar Batista dos Santos: Sou natural de Brasília (DF), graduei-me no ano de 2001 e sempre quis a Magistratura. Fiz pós-graduação em Direito Constitucional na Escola Superior do Ministério Público Federal (DF) e fui aprovado para o cargo de analista judiciário do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2003. Em 2004, tomei posse como juiz de Direito do Tribunal de Justiça da Bahia, onde permaneci até ser aprovado no concurso de juiz da maior Corte do país, o Tribunal de Justiça de São Paulo, em janeiro de 2007.
Após passar por diversas jurisdições, desde 2013, fui designado Conheça o juiz auxiliar da CGJ/SP: Paulo Cesar Batista dos Santos para a 1ª Vara de Registros Públicos da Capital, onde fiquei até ser honrosamente convocado para atuar como juiz auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça, para o biênio 2018/2019. Atualmente, sou juiz titular da Vara de Família de Americana. Na área acadêmica, sou mestrando em Direito Comparado pela Universidade de Samford, nos Estados Unidos, e especialista em Direito Notarial e Registral pela Escola Paulista da Magistratura/SP. Sou coautor de livros, e autor de artigos em revistas especializadas em registros públicos. Ministrei aulas no Curso Damásio, na Uniregistral e na Associação Paulista de Magistrados (Apamagis).

Jornal do Notário: Como o senhor avalia as alterações das NSCGJ/SP e do novo Código do Processo Civil Brasileiro (CPC) para a atividade notarial? Acredita que outros avanços podem ser trazidos por esses diplomas?

Paulo Cesar Batista dos Santos: A legislação e as Normas são organismos vivos, em constante mutação e atualização, para que estejam sempre em total coerência com a realidade. Houve avanços no Código de Processo Civil, sem dúvida, como, por exemplo, nas disposições relativas à ata notarial, ou mesmo no grande avanço trazido com a usucapião extrajudicial. As Normas da Corregedoria Geral da Justiça também precisam estar em total harmonia com a legislação federal e estadual e, dentro do possível, também com a realidade prática, já que elas que servem de guia dos delegatários de atividades notariais e registrais.
Nós sabemos o quanto a atividade extrajudicial está ligada às Normas de Serviço, razão pela qual a preocupação dessa gestão em mantê-las atualizadas e cada vez mais modernizadas. Por outro lado, as Normas não podem sofrer mudanças a toda hora, já que também é importante haver previsibilidade e estabilidade nos regramentos da Corregedoria Geral, trazendo segurança aos delegatários e, consequentemente, aos usuários.
Também sempre haverá avanços necessários, já que, como dito, a lei sempre precisa avançar juntamente com a sociedade. Um tema que está sempre atual diz respeito aos meios eletrônicos de realização de atos notariais e registrais, além de centrais de compartilhamento de serviços. A prestação de atividade extrajudicial pela via eletrônica é um caminho sem volta, já que o mundo digital está aí, é uma realidade. E precisamos nos adaptar e regulamentar tudo isso.

Jornal do Notário: Qual é a importância do incentivo a discussões e estudos sobre a rotina dos notários e registradores no âmbito judicial?

Paulo Cesar Batista dos Santos: É de suma importância o incentivo a discussões e aos estudos na área notarial. A troca de experiências pode evitar a repetição de equívocos e melhorar a rotina no exercício da atividade que existe justamente para dar fé pública aos atos lavrados. O trabalho das notárias e dos notários, todos nós sabemos, é rodeada pelo risco de lavratura de atos passíveis de futuras impugnações. O dever de aconselhamento jurídico, de prudência, é uma tarefa espinhosa, ao contrário do que muitos possam pensar. E o desenvolvimento de estudos, de verdadeira doutrina notarial, possui uma importância invulgar no desempenho dessa tão relevante atividade. 

Jornal do Notário: O senhor escreveu um artigo que trata da defesa do titular do domínio em ações de usucapião. A usucapião extrajudicial se tornou uma forma de regularização dos territórios urbanos e rurais? 

Paulo Cesar Batista dos Santos: Sim. Não há dúvidas de que a morosidade da Administração Pública, ao longo de décadas, contribuiu sobremaneira para a desorganização da ocupação do solo urbano e rural, em todos os municípios espalhados pelo País. Nesse cenário, a usucapião acabou se tornando um instrumento muito eficaz na regularização dessa ocupação, já que, como se costuma dizer, a usucapião resolve tudo. Assim, para aquelas situações em que não há possibilidade de ingresso do título no registro imobiliário, seja por vícios do próprio título, seja por problemas de especialidade objetiva, continuidade, dentre tantos outros, a usucapião costuma ser a última trincheira ao jurisdicionado. E, para isso, a usucapião extrajudicial surge como uma solução mais rápida de declaração dessa propriedade, num procedimento que seguramente será muito mais célere do que a via jurisdicional, num campo em que não existe conflito, o que é genuinamente o cerne da atividade extrajudicial.

A lavratura da ata notarial e o procedimento no registro de imóveis são hoje uma importante ferramenta de regularização territorial urbana e também rural. A única ressalva é que a usucapião não substitui a importância de políticas públicas de regularização territorial, na medida em que ela traz solução individual, ou para um conjunto de indivíduos, mas não traz consigo a necessária infraestrutura, com equipamentos básicos de ordem ambiental, sanitárias e urbanísticas, o que somente ocorre quando há participação e atuação dos Poderes Executivo e Legislativo. 

Jornal do Notário: Como o senhor avalia a evolução do Direito de Família dentro dos novos modelos de família existentes e o papel do extrajudicial para a formalização da vontade das partes?

Paulo Cesar Batista dos Santos: A evolução do Direito de Família também é uma realidade para qual não é mais possível fechar os olhos. As relações familiares sempre estão em processo de mudança. Basta lembrarmos que, há poucos anos, a união estável ainda era uma “novidade”, a ponto de a companheira ser tratada como “concubina”. Também há pouco tempo ainda se falava em filhos legítimos e filhos ilegítimos. Hoje em dia, estamos lidando com a socioafetividade, a multiparentalidade, dentre outras figuras que simplesmente existem, e que o Direito precisa regulamentá-las. O serviço extrajudicial possui o papel de colher essas declarações de vontade e dar a elas fé pública notarial, para que elas produzam todos os efeitos jurídicos delas decorrentes. 

Jornal do Notário: Qual é o maior desafio para o futuro do notariado?

Paulo Cesar Batista dos Santos: O maior desafio do notariado é manter viva a importância que ele sempre teve ao longo de toda a história. Os notários possuem existência anterior ao próprio registro. Em Portugal, até meados do século XVII, os juízes podiam ser analfabetos, mas os notários não; esses profissionais já eram obrigados a saber ler e escrever, o que significa dizer que o notário foi obrigado a ser alfabetizado antes mesmo dos juízes.
Contudo, vez ou outra, surgem vozes desavisadas afirmando que não existe mais razão para a existência do notariado, o que não é verdade. É por isso que as Notas precisam evoluir sempre, acompanhar as relações jurídicas que surgem na sociedade, modernizando-se dia após dia, já que a sua existência é e continuará sendo imprescindível para a segurança jurídica em todas as atividades jurídicas humanas. Os países que mitigaram a função do notariado pagam seu preço, normalmente, fazendo com que a indústria dos seguros tome o espaço reservado à atividade notarial. Mas esse não é o caminho, já que a segurança e prevenção de conflitos será sempre a melhor decisão a ser tomada por uma sociedade que busque estabilidade nas suas relações jurídicas.