Muito se discute juridicamente quando uma propriedade perde parte de sua vista por meio de construção no terreno vizinho. É assim, por exemplo, quando um apartamento possui vista panorâmica sobre determinada área que, após uma reforma, é completamente perdida. Afinal, o que poderia ser feito?
 
A 3ª turma do STJ possibilitou o reconhecimento da chamada servidão de vista, através de um instrumento convencional pactuado entre as partes. Resolveu um conflito surgido pela construção de muro no limite entre duas propriedades, localizadas no bairro do Leblon, no Rio de Janeiro. O casal, dono de um dos imóveis, pretendia que o muro fosse derrubado, sob o argumento de que estaria atrapalhando a vista panorâmica para a Lagoa Rodrigo de Freitas.
 
No decorrer do processo, as partes celebraram acordo judicial, no qual fixaram condições para preservação da vista, iluminação e ventilação, a partir de um dos terrenos. A altura do muro foi reduzida. Entretanto, foram plantadas trepadeiras e árvores que acabaram tapando novamente a visão da lagoa.
 
No STJ, o relator do recurso especial, ministro Ari Pargendler, entendeu que o acordo havia sido integralmente cumprido e, além disso, que não havia proibição quanto ao plantio de árvores, “que é um direito assegurado ao proprietário, dentro de seu terreno”.
 
A ministra Nancy Andrighi divergiu do entendimento do relator. Quanto à alegada inexistência de servidão de vista, ela afirmou que o TJ/RJ fez confusão entre servidão predial legal e convencional. A turma acompanhou o voto da ministra.
 
“As servidões legais correspondem aos direitos de vizinhança, tendo como fonte direta a própria lei, incidindo independentemente da vontade das partes. Nascem para possibilitar a exploração integral do imóvel dominante ou evitar o surgimento de conflitos entre os respectivos proprietários”, explicou Andrighi.
 
Segundo a ministra, as servidões convencionais, ou servidões propriamente ditas, não estão previstas em lei, decorrendo do consentimento das partes.
 
Ela mencionou que, embora não houvesse informações no processo acerca do registro do acordo em cartório, a transação poderia ser equiparada a uma servidão convencional, que representa uma obrigação a ser respeitada pelas partes.
 
Ao considerar a obrigação assumida, de preservação da vista da paisagem a partir do terreno vizinho, Andrighi verificou que o direito ao plantio de árvores foi exercido de forma abusiva, pois houve o descumprimento, ainda que indiretamente, do acordo firmado. Para ela, os vizinhos foram sujeitos aos mesmos transtornos causados pelo antigo muro de alvenaria (REsp 935.474).
 
Ao contrário do que muitos pensam, é possível adquirir espaço aéreo aqui no Brasil. Existe uma legislação específica que permite a compra e venda do espaço aéreo sobre o imóvel, previsto na Lei 10.257/01 (Estatuto da Cidade).
 
Assim podemos observar no artigo 21, § 1º, do Estatuto da Cidade:
 
Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de imóveis.
 
§ 1º O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo, atendida a legislação urbanística.
 
É importante salientar que, obviamente, o espaço aéreo relativo ao terreno tem o campo projetado na vertical (nem pense em requerer negócio alegando ser trecho de rota de avião). Exemplo: quando uma residência térrea ou assobrada é vendida para que ali seja erguido um edifício, o espaço aéreo sobre ela está implícito na venda.
 
Há um tempo houve repercussão nacional o caso de um edifício de apartamentos situado no valorizado bairro de Ipanema, no Rio de Janeiro, cujo incorporador adquiriu diversos terrenos, sem, contudo, conseguir comprar o prédio de uma clínica, situada justamente na parte frontal.
 
Como a demolição deste imóvel, poderia resultar na construção de um futuro espigão. Utilizou-se, então, o instrumento legal para negociar a compra do espaço aéreo.
 
Após o fechamento da negociação, o vendedor transferiu o direito de propriedade da vista privilegiada aos compradores das unidades, cuja aquisição desta exclusividade representou uma valorização de 40% aos apartamentos, segundo os incorporadores.
 
Neste sentido, para ter validade, uma negociação deste gênero deve ter escritura pública registrada no Cartório de Imóveis. Assim sendo, este é um meio para evitar futuros problemas no qual o morador compra um apartamento com vista privilegiada e acaba perdendo-a pelo fato de construírem um prédio à frente.