Apelação Cível nº 1007752-59.2023.8.26.0047

 

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1007752-59.2023.8.26.0047

Comarca: ASSIS

 

PODER JUDICIÁRIO

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

 

Apelação Cível nº 1007752-59.2023.8.26.0047

 

Registro: 2024.0000333269

 

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1007752-59.2023.8.26.0047, da Comarca de Assis, em que é apelante LUCAS AGUIAR GUIDO DE MORAES, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE ASSIS.

 

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

 

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

 

São Paulo, 11 de abril de 2024.

 

FRANCISCO LOUREIRO

 

Corregedor Geral da Justiça e Relator

 

APELAÇÃO CÍVEL nº 1007752-59.2023.8.26.0047

 

APELANTE: Lucas Aguiar Guido de Moraes

 

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Assis

 

VOTO Nº 43.312

 

Registro de imóveis – Dúvida registral julgada procedente – Recusa de ingresso de escritura de compra e venda – Bem em regime de enfiteuse – Domínio útil adquirido por um dos cônjuges casado sob o regime da comunhão parcial de bens por sucessão hereditária e domínio direto adquirido onerosamente na constância do casamento – Divórcio posterior do casal – Aplicabilidade do art. 1.660, I, do CC em relação à segunda aquisição – Aquisição do domínio direto tem natureza jurídica de aquesto e entra na comunhão – Preservação da continuidade depende da prévia inscrição do formal de partilha ou da retificação do título – Exigência mantida – Recurso não provido.

 

Trata-se de apelação interposta por Lucas Aguiar Guido de Moraes, contra a r. sentença de fls. 67/70, proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Assis, que, mantendo as exigências do Oficial, negou o acesso ao registro imobiliário da escritura de compra e venda do imóvel matriculado sob o nº 1.373 daquela serventia (fls. 31).

 

Alega o apelante, em resumo: que o bem transacionado, por ter sido adquirido por herança, não se comunica ao cônjuge casado sob o regime da comunhão parcial; que não há prova de que a ex-esposa do vendedor contribuiu para o resgate oneroso da enfiteuse; que o valor que caberia à ex-mulher pelo resgate da enfiteuse é irrisório; e que a ex-esposa não participou do ato notarial que extinguiu a enfiteuse. Pede, ao final, o provimento da apelação para determinar o registro do título. Subsidiariamente, requer a definição da extensão dos direitos que o cônjuge do vendedor possui sobre o bem (fls. 76/101).

 

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 133/142).

 

Após a decisão de fls. 144, a certidão da matrícula nº 1.373 do Registro de Imóveis de Assis foi acostada aos autos (fls. 150/154).

 

É o relatório.

 

Tratam os autos da negativa de registro de escritura de compra e venda, por meio da qual o apelante adquire o imóvel objeto da matrícula nº 1.373 do Registro de Imóveis de Assis. Entre os proprietários do bem, consta Mario Cesar Garcia Duarte, casado com Marília Pastorello Duarte sob o regime da comunhão parcial de bens, titular de parte ideal correspondente a 16,666% do imóvel. Ocorre que na escritura apresentada a registro, Mário, na condição de divorciado, vendeu sua parte no bem sem a participação de sua ex-esposa.

 

Considerando essa situação, o Oficial obstou o registro, exigindo, de forma alternativa, a inscrição de formal de partilha do divórcio ou a retificação da escritura para que nela passe a constar Marília como transmitente.

 

E a recusa à inscrição está correta.

 

Pela análise da matrícula nº 1.373 do Registro de Imóveis de Assis, constata-se que o Mario Cesar Garcia Duarte, casado com Marília Pastorello Duarte sob o regime da comunhão parcial de bens, recebeu, em virtude do falecimento de Cézar Garcia Duarte, o domínio útil de 16,666% do imóvel (cf. R.4 da matrícula nº 1.373 – fls. 151).

 

Na forma do art. 1.659, I, do Código Civil, não há comunhão desse bem, pois ele sobreveio, na constância do casamento, por sucessão.

 

No entanto, ainda de acordo com a matrícula nº 1.373 do Registro de Imóveis de Assis, os detentores do domínio útil do bem, por meio de escritura prenotada em novembro de 2011, adquiriram o domínio direto do imóvel da Mitra Diocesana de Assis, encerrando-se o regime de enfiteuse até então existente. E essa transferência onerosa do domínio direto ocorreu durante a constância do casamento de Mário e Marília (cf. R.10 da matrícula nº 1.373 – fls. 152/153).

 

Diferentemente do que ocorreu com a sucessão causa mortis, que o inciso I do art. 1.659 do Código Civil determina a exclusão da comunhão, no caso da aquisição do domínio útil na constância do casamento de Mário e Marília, aplicável o art. 1.660, I, do CC:

 

Art. 1.660. Entram na comunhão:

 

I – os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;

 

E em se tratando de bem adquirido onerosamente durante casamento regido pela comunhão parcial de bens, não há espaço para prova de que o esforço comum não ocorreu. Isso porque o esforço comum é presumido de forma absoluta, bastando a comprovação da aquisição onerosa, ainda que só em nome de um dos cônjuges, para que haja partilha.

 

Embora o encerramento do regime de enfiteuse pelo resgate e a comunhão de frutos sejam figuras completamente distintas, o inciso V do art. 1.660 prevê regra que aqui se aplica. Da mesma forma que os frutos dos bens particulares de cada cônjuge entram na comunhão, a aquisição do domínio útil de bem imóvel por sucessão, tornando-o particular (art. 1.659, I, do CC), não impede a partilha entre os cônjuges do domínio direto adquirido onerosamente na constância do casamento.

 

Isso o resgate da enfiteuse se dá a título oneroso, mediante pagamento ao nu proprietário. Essa a razão pela qual a consolidação da propriedade plena – mediante aquisição do domínio útil – se deu a título oneroso durante o casamento. Dizendo de outro modo, o valor proporcional do domínio direto em relação à propriedade plena tem a natureza de aquesto.

 

À evidência, não é a propriedade plena da parte ideal do bem que coube a Mário que se comunica. A comunhão se limita à diferença do valor da propriedade e do valor do domínio útil, esse último recebido por sucessão e, portanto, incomunicável. Ou, de modo modo, o valor proporcional do domínio direto, representado pelo valor do resgate é que tem a natureza de aquesto.

 

Assim, consoante nota devolutiva copiada a fls. 51, para que a continuidade seja respeitada (art. 237 da Lei nº 6.015/73), o registro da escritura depende da prévia inscrição do formal de partilha ou da retificação do título, com a inclusão de Marília na qualidade de transmitente.

 

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

 

FRANCISCO LOUREIRO

 

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 22.04.2024 – SP)

 

Fonte: DJE/SP

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