A assinatura eletrônica promove agilidade e segurança nas transações digitais, sendo amplamente reconhecida pela legislação e pelo Judiciário, sem a necessidade de assinaturas físicas
Desde o final dos anos 90, iniciamos a jornada em busca de mecanismos que pudessem garantir mais transparência e segurança para as relações através de interfaces digitais, tendo em vista a popularização da própria Internet.
O resultado foi a profunda transformação da maneira como indivíduos e instituições passaram a manifestar sua vontade, com o suporte eletrônico assumindo o protagonismo no registro das transações.
Com isso, passamos para desenhar as bases legais de legitimação do uso de documentos eletrônicos, que contribuíram para trazer uma nova forma de contratação, independente do uso do suporte físico do papel ou de requisitos tradicionais de assinatura manuscrita.
Esta evolução permitiu viabilizar negócios jurídicos mais ágeis, consolidar o comércio eletrônico, além de atender metas públicas de inclusão e desburocratização, com um efeito positivo para toda sociedade.
Com toda certeza, em um país com população superior a 200 milhões de habitantes, segundo dados retirados do Censo de 2022, a concretização do uso da assinatura eletrônica tornou-se mais que uma solução técnica, mas uma solução social para o exercício de políticas públicas de diminuição das desigualdades.
Para que tudo isso fosse possível, contribuíram várias legislações, que reunidas passaram a formar um arcabouço jurídico sólido, reconhecido e confirmado pelo Judiciário brasileiro. Dentre elas, fazem parte a Lei Modelo da Uncitral (United Nations Commission On International Trade Law), a MP 2.200/21, Resolução CMN nº 4.480/2016, a Resolução CMN nº 4.949/2021, a Lei 14.062/2020, o Decreto 10.543/2020, a Lei 14.620/2023, dentre outras.
Importante destacar que os documentos e os contratos, para servirem como meio de prova, independem da forma que o negócio jurídico foi firmado, exceto se houver alguma determinação legal expressa que o exija, ou seja, não precisam estar materializados em papel. Esta liberdade é conferida pelos artigos 104 e 107 do Código Civil.
Desse modo, para todos os fins, prova é o conjunto de elementos de que se serve o juiz para formar a sua convicção sobre os fatos, e podem ser produzidas por qualquer meio, inclusive o eletrônico, assumindo valor de prova plena, segundo art. 225 do CC e art. 369 do CPC.
Mas, é fundamental deixar claro ao consumidor como é dada a atribuição de força probante aos contratos eletrônicos, considerando dois requisitos: o primeiro, da autenticidade, que se entende por ‘pressuposto da autoria’, ou seja, a necessidade de que a autoria seja identificável. E o segundo, da integridade que é o atributo da integridade que se refere à veracidade, ou à imutabilidade, compreendida esta como a certeza de que o documento não poderá ser alterado após pactuado e assinado.
Portanto, a aceitação pacífica da assinatura eletrônica pelos tribunais está diretamente relacionada à capacidade de conferir autenticidade e integridade ao documento. Como se observa no julgamento de 2018 do Recurso Especial 1.495.920/DF pela 3ª Turma do STJ, sob a relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino, o tribunal não apenas confirmou a validade jurídica dos documentos eletrônicos, mas também estabeleceu sua força executiva.
Neste sentido, a recente decisão de 2024, do Desembargador Domingos de Siqueira Frascin (TJSP 1000527-02.2024.8.26.0128), que ressalta a inexistência de qualquer ilegalidade em relação a contratos que se aperfeiçoam de forma digital, por meio de assinatura eletrônica, por força da ideia de informalidade das relações contratuais contida no artigo 107 do Código Civil, de modo que o contrato trazido, assinado eletronicamente, deve ser considerado como uma manifestação de vontade válida
Assim como se destaca a decisão do Desembargador José Ricardo Vidal Patrocínio (TJCE 0200453-04.2023.8.06.0053), também deste ano, que afirma que a assinatura eletrônica por meio da qual se utilizam combinações de códigos que permitem extrair o aceite entre o emissor e o receptor, a exemplo de senhas, ações específicas, e-mail ou número de telefone é válida e suficiente para comprovar que o consumidor concordou com o contrato. Além da desnecessidade de conhecimento técnico para assinatura de contrato eletrônico, e a rejeição do argumento de vulnerabilidade técnica do consumidor.
Vale ressaltar, que a adoção da autenticação eletrônica, especialmente através de uso de senha, token, biometria, tem sido essencial para atender a necessidade de combate à fraude. Neste sentido, o julgado da 1ª Turma Recursal do Estado do Amazonas de relatoria magistrado Luiz Pires de Carvalho Neto (0624530-28.2023.8.04.0001), ressalta de maneira clara a validade da contratação das cestas de serviços bancários tendo em vista o uso de assinatura eletrônica de reconhecimento de senha pessoal e intransferível, adotado pelas instituições financeiras, tanto em virtude do avanço tecnológico como em combate às possíveis fraudes em observância à resolução CMN 4.480.
Além disso, a legislação nacional cumpre seu papel para conferir a devida validade, alcançando a garantia de executividade, com a Lei 14.620/2023, que adicionou o § 4º ao art. 784 do Código de Processo Civil, com a seguinte redação: “§ 4º Nos títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, é admitida qualquer modalidade de assinatura eletrônica prevista em lei, dispensada a assinatura de testemunhas quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura.”
Tudo isso está alinhado com a visão internacional sobre a matéria, conforme o posicionamento da OMC – Organização Mundial do Comércio sobre o padrão de assinaturas eletrônicas recomendado para estimular livre comércio entre os países e economia digital, agenda MC12, e da OMS – Organização Mundial da Saúde que adotou como protocolo sanitário a priorização de uso dos meios eletrônicos, na agenda de Saúde Digital pós pandemia.
Por fim, é inevitável a evolução da tecnologia, e com ela do comportamento humano. Cabe ao Direito evoluir também, para acompanhar a mudança da sociedade. E é o que se tem observado, como exposto, com a validade ampla conferida pelo art. 10, § 2º da MP 2.200/21, que de maneira alguma exige apenas o uso de assinatura qualificada da ICP/Brasil, ao contrário, traz claramente que qualquer método de assinatura eletrônica, seja ela simples ou avançada, é hábil para manifestar vontade.
Afinal, tendo em vista os resultados do uso da assinatura avançada, que é mais acessível, utilizando o sistemaGov.br, amplamente divulgado pelo Governo Federal, que já somam mais de 63 milhões de pessoas segundo dados fornecidos pelo ITI – Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, não faz qualquer sentido retroceder aos avanços já alcançados, nem impor à população mudanças que impliquem um aumento de custo injustificado.
Fonte: Migalhas
Deixe um comentário