A nova lei 14.973/24, que permite a atualização do valor de imóveis, pode gerar mais custos do que benefícios aos contribuintes desinformados

 

No último dia 16 de setembro o Governo Federal publicou a lei 14.973/24 que, dentre outras disposições, concedeu aos contribuintes a opção de atualizar o custo de aquisição de seus bens imóveis na declaração do imposto de renda, mediante a antecipação do imposto à alíquota de 4%.

 

Em uma leitura mais apressada da lei, os contribuintes – especialmente aqueles que possuem imóveis com valores muito defasados em suas declarações – podem acreditar que se trata de um efetivo benefício fiscal, com reais vantagens a quem optar pela atualização. Não é essa, porém, a verdade aplicável à maioria dos casos.

 

Antes, porém, de explicarmos nossa afirmação, vale lembrar que esse tema não é novo e já foi objeto de outros projetos de lei nos últimos anos. Falando dos mais relevantes, lembramos primeiramente do projeto de lei 458 de 2021, por meio do qual os contribuintes teriam a opção de atualizar o custo de aquisição de bens para os seus valores de mercado, tributando-se essa atualização à alíquota de 3%.

 

Para os bens imóveis, o PL estabelecia limitação temporal para a sua alienação pelo prazo de três anos (ressalvadas as hipóteses de transmissão causa mortis ou decorrente de dissolução da sociedade conjugal): Caso o imóvel fosse alienado antes do prazo previsto, a adesão ao benefício seria considerada sem efeitos, mas o IR antecipado à 3% seria dedutível do imposto apurado sobre o ganho de capital.

 

Outro projeto similar foi o PL 2.337 de 2021, que trazia a possibilidade de o contribuinte atualizar o custo de aquisição de bens imóveis para os seus valores de mercado, à alíquota de 4%. Diferentemente do primeiro PL, esse não estabelecia qualquer limitação temporal para a alienação do imóvel cujo custo de aquisição tivesse sido atualizado.

 

Ambos os PLs permanecem parados na Câmara dos Deputados até hoje. Mas apesar de a matéria estar razoavelmente maturada em ambos, entendeu o legislador federal que seria mais adequado aproveitar o recente projeto de lei 1.847/24, apresentado ao Senado apenas em maio de 2024 e que tinha objeto original absolutamente estranho, para nele inserir esse belo jabuti sobre a atualização do custo de aquisição de bens imóveis, tudo isso aprovado em tempo recorde.

 

O açodado processamento desse projeto em ambas as casas legislativas, sem a devida discussão sobre o seu texto, resultou em incongruências que certamente tornarão a opção pela atualização do custo de aquisição inconveniente para grande parcela dos contribuintes e, ainda por cima, poderá prejudicar incautos que aderirem a esse programa sem a devida reflexão. Explicamos.

 

Atualmente, para fins de definição da base de cálculo do IR sobre ganho de capital de bens imóveis, incidem crescentes fatores de redução em função do decurso de tempo desde a data de sua aquisição. Por exemplo, se o contribuinte adquiriu o imóvel há cinco anos, o fator de redução é da ordem de 20%; por sua vez, se o imóvel foi adquirido há 20 anos, então o fator de redução será de aproximadamente 60%. Nesses casos, a alíquota efetiva do IR para ganhos de até R$ 5 milhões será de 12% e 6%, respectivamente.

 

Já a nova lei prevê a possibilidade de atualização do custo de aquisição dos imóveis mediante a antecipação do IR à alíquota de 4%. Até aí, no que se refere à alíquota e forma de tributação, a lei 14.973/24 é consistente com os projetos de lei que a antecederam e aparentemente atrativa diante das alíquotas progressivas do imposto de renda que partem de 15% (ganhos de até R$ 5 milhões).

 

Todavia, ao tratar da limitação temporal para alienação de imóvel cujo custo foi atualizado, a nova lei estabeleceu extravagante métrica pela qual o custo de aquisição adicional (tributado a 4%) está sujeito a reduções em função do tempo e só poderá ser integralmente aproveitado após 180 meses contados da data da atualização. Por exemplo, se o imóvel é alienado em até 36 meses dessa data, o imposto pago é simplesmente desconsiderado e a venda será tributada normalmente: em resumo, pagou-se 4% no momento da atualização e serão pagos mais 15% no momento da venda, deduzidos os fatores de redução. E apesar de a lei não ser clara, na medida em que a Receita Federal equipara “alienação” a qualquer evento de transferência de titularidade jurídica de bens, o mesmo se aplicaria ainda que não houvesse efetiva venda, como por exemplo nas hipóteses de sucessão causa mortis ou dissolução da sociedade conjugal.

 

Por outro lado, ainda que o contribuinte permaneça com o imóvel por mais de 36 meses e passe a fazer jus a uma parcela do custo adicional, serão diminuídos os fatores de redução que incidem sobre o ganho de capital, pois a parcela do custo original, sobre a qual incide o maior fator de redução, será paulatinamente diluída em função do acréscimo do custo de aquisição mais recente decorrente da atualização.

 

Em resumo, o “benefício” concedido pela nova lei parece ser muito mais uma armadilha aos contribuintes desavisados que, se não considerarem todas as peculiaridades de seu caso, correm um sério risco de gastarem mais dinheiro do que gastariam se não optassem pela atualização prevista.

 

Fonte: Migalhas

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