O crescente avanço tecnológico tem provocado na sociedade transformações sem precedentes. A transição do analógico para o digital não apenas alterou a forma como as informações são produzidas, compartilhadas e consumidas, mas também redefiniu as relações humanas, o acesso ao conhecimento e o trabalho.

Nesse cenário, a incorporação do digital no cotidiano tem gerado grandes desafios ao meio jurídico, incluindo, por exemplo, os métodos periciais que auxiliam o magistrado na formação de seu convencimento. Entre esses, destaca-se a perícia grafotécnica, tradicionalmente associada à análise de escritos em papel, também diretamente impactada pelo advento dos meios digitais.

O exame grafotécnico é uma das ferramentas utilizadas no contexto jurídico para verificar a autenticidade e autoria de um documento, com base nas características gráficas das assinaturas — razão pela qual a perícia deve ser, preferencialmente, realizada no documento original. Contudo, o artigo 424 do Código de Processo Civil prevê a possibilidade de a perícia ser na forma indireta, isto é, baseada em documentos que foram originalmente gerados na forma física e, então, submetidos à digitalização.

Portanto, na impossibilidade de se analisar a via física original, o Poder Judiciário autoriza a concretização da perícia grafotécnica em documentos no formato virtual, ressalvadas possíveis consequências e prejuízos na elaboração do laudo.

Adaptação de métodos periciais a novos formatos

Nesse contexto, com o aumento do uso de documentos eletrônicos, urge a necessidade de explorar como os métodos periciais podem ser aplicados e adaptados aos novos formatos, sobretudo porque o trabalho pericial pressupõe que determinados critérios sejam observados, como: adequabilidade, contemporaneidade, quantidade e autenticidade (PRETTI, Gleibe, Perícia Grafotécnica na Prática. São Paulo: Editora Icone, 2017).

Como consequência, a ausência do arquivo original resulta no desafio pericial sobre um novo tipo de suporte documental. Consequentemente, a perícia realizada em documentos digitalizados pode implicar o comprometimento de algumas técnicas, levantando questões complexas, sobretudo com relação à confiabilidade da conclusão do laudo.

Não há óbice, no âmbito jurídico, para que a perícia grafotécnica seja realizada em documento digitalizado. Contudo, o perito tem o dever de informar no parecer que a materialidade do documento foi alterada, ou seja, que foi digitalizado, e indicar quais elementos foram comprometidos ou prejudicados na análise. O expert deve, ainda, informar se a cópia apresenta elementos morfogenéticos adequados ao cotejo pericial, bem como a possibilidade de a estrutura do documento copiado ser ou não apta ao exame e à conclusão do laudo esclarecedor.

Fatores que interferem na qualidade do laudo

Ademais, é fundamental que o perito indique e justifique os fatores técnicos e específicos que possam implicar diretamente a qualidade do laudo referente ao documento fotocopiado. Isso não só para subsidiar o conhecimento e a convicção do magistrado, permitindo-lhe, se assim entender, dispensar a produção dessa prova pericial, mas também garantir o contraditório e ampla defesa à parte contrária.

Não obstante as reproduções digitais de documentos tenham, juridicamente, a mesma força probante que o original, é fato que, em virtude da impossibilidade de se aferir com exatidão todos os elementos morfogenéticos que constariam em assinatura pronada com caneta, a perícia nesse tipo de documento possa causar insegurança com relação às conclusões descritas no laudo, ainda que seja possível a averiguação de outros elementos que permitirão uma conclusão próxima da verdade.

Portanto, os documentos originais são os mais adequados para o exame pericial. No entanto, na impossibilidade de se obter a via original e havendo sua cópia digital, é permitida a realização da perícia, desde que no parecer constem todas as restrições do exame devidamente registradas, com a indicação dos obstáculos enfrentados pelo perito juntamente com suas causas e consequências.

Caso o documento questionado seja inapto para receber qualquer tipo de análise, o perito deverá informar ao juízo todos os impedimentos que tornaram aquele documento inadequado à avaliação pericial.

Fonte: Conjur

Deixe um comentário