Processo 1031239-25.2025.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1031239-25.2025.8.26.0100

Processo 1031239-25.2025.8.26.0100

Pedido de Providências – Vistos, Trata-se de pedido de providências instaurado a partir de comunicação pelo Sr. (…) Tabelião de Notas (…) de falsidade em procuração pública lavrada pela serventia de sua responsabilidade, sendo o instrumento público utilizado para assinar “Cessão de Créditos Derivados de Cota de Consorciado(a) Excluído(a) do Grupo”. Os autos foram instruídos com os documentos de fls. 02/53 e o Sr. Tabelião salientou ter instaurado sindicância interna para apurar os fatos. Em seu parecer, o Ministério Público opinou pelo arquivamento dos autos, ante a inexistência de incúria funcional por partes do Senhor Delegatário (fls. 57/58). É o breve relatório. DECIDO. Em síntese, cuida-se de pedido de providências formulado pelo Sr. (…) Tabelião de Notas (…) informando que falsários apresentaram documento de identidade falso à Serventia Extrajudicial para lavrar procurações públicas e reconhecer firma por autenticidade em cessão de créditos (selo digital nº 1133401RA1064AA0339264236). Segundo consta dos autos, em 13 de dezembro de 2024, a Sra. (…) , CPF 166.*.*-34, relatou ter sido vítima de fraude por meio de procuração lavrada pela serventia correicionada. Em 18 de dezembro de 2024 a serventia recebeu cópia do boletim de ocorrência e da CNH da interessada, além de traslado da procuração supostamente fraudada. Em posse dos documentos, o Sr. Notário identificou o cartão de assinatura aberto em nome da Sra. Ivani e instaurou sindicância interna para apurar os fatos e responsabilidades de seus prepostos. Em suas diligências, identificou que de fato os atos foram praticados pela Serventia, em data anterior à assunção da delegação pelo Sr. Titular. As telas do sistema interno, “Assina”, demonstram quatro pedidos de reconhecimento por autenticidade em nome de Ivani em 28 de julho de 2023 e um por semelhança em 08/08/2023. Na sindicância foram ouvidos os escreventes responsáveis pela abertura da ficha padrão, reconhecimento de firma e lavratura de duas procurações públicas, bem como a suposta vítima, a qual forneceu documentos pessoais e assinaturas para comparação. No relatório final se concluiu ser evidente o uso de documento de identidade falso (fl. 17) por pessoa inidônea para lavratura de atos na serventia, sendo que a falsária atuou de modo convincente perante serventuários com anos de experiência notarial. Apesar dos fatos serem anteriores à assunção da delegação pelo Sr. Notário, recomendou-se a admoestação verbal “a fim de destacar a seriedade do ocorrido e da necessidade de praticar uma cultura de prudência na análise documental e na coleta de dados durante os atendimentos”. Ao final, o Sr. Tabelião acolheu a conclusão, orientando os escreventes quanto à necessidade de atenção redobrada na lavratura de procurações, “recomendando a consulta do CPF dos solicitantes junto ao CCN (Cadastro Único de Clientes do Notariado) para verificação de eventuais fichas de firma abertas em outras serventias e validação da documentação apresentada”; sinalizou os atos notariais supostamente objeto das fraudes; comunicou suas equipes para reforçarem as medidas preventivas; e comunicou a este Juízo Corregedor Permanente “com a finalidade de publicação no diário oficial quanto ao bloqueio dos atos” (fls. 47/53). Pois bem. Rememoro que em relação aos documentos de identidade falsos, os locais de nascimento podem ser cotejados com os sequenciais finais dos CPFs, anteriores ao dígito. Além disso, os próprios dígitos verificadores do RG e do CPF podem ser contrastados com a numeração sequencial apresentada, uma vez que decorrem de função matemática da própria numeração. Outros sinais também são passíveis de verificação, como a existência da partícula “E” entre os nomes de pai e mãe indicados para RGs emitidos no Estado (…) após 1987. Ainda, para o RG emitido no Estado (…) , é possível analisar a assinatura do responsável pelo IIRGD à época de expedição, o posicionamento da foto em mesmo sentido da digital, a perfuração da sigla do Instituto junto ao papel de segurança, a vedação ao código impresso junto à identificação do Instituto ser o de nº. 101-7, o nome do pai em linha diversa do da mãe, e a naturalidade, para a Capital, como sendo grafada -S. Paulo-. Ademais, é possível a consulta a bases públicas como a da Polícia Civil (…) e a do Detran do Rio de Janeiro, as quais embora não forneçam maiores dados, confirmam a correção daqueles eventualmente imputados. Dessa forma, a segurança passível de verificação sem acesso a uma base originária de informações não é segura de proteger contra falsidades decorrentes da apropriação dos dados corretos por eventual falsário, sendo possível, todavia, o confronto dos dados fornecidos pelo próprio documento apresentado. Ainda, saliento ser possível a verificação da veracidade dos documentos que contenham QR Code, a exemplo da Carteira Nacional de Habilitação. Igualmente, é possível e recomendável que as Serventias Extrajudiciais previnam a ocorrência de fraudes realizando buscas no sistemas das demais serventias para conferir a igualdade dos documentos de identificação pessoal nelas arquivados, mormente do modo como recomendado pelo Sr. (…) Tabelião, isto é via Cadastro Único de Clientes do Notariado. Apesar da ausência de laudo pericial conclusivo a respeito da falsidade do documento de identidade apresentado à fl. 17, é prudente o bloqueio dos atos notariais, diante dos documentos apresentados pelo Sr. Tabelião e suas conclusões: os documentos pessoais da Sra. Ivani são divergentes daquele constante do acervo da Unidade, a interessada prontamente forneceu documentos e assinaturas que divergem daqueles arquivados juntos à Serventia, e procurou a autoridade policial, lavrando-se Boletim de Ocorrência (fls. 33/34), no qual alega ter sido vítima de estelionato, com prejuízo aproximado de R$ 260.000,00, vez que a cessão de créditos possibilitou a negociação de suas cotas em consórcio. Em vista do exposto, pode-se concluir serem suficientes as medidas adotadas pelo Sr. Tabelião para apuração dos fatos ocorridos nas dependências da Serventia, agindo corretamente ao implantar medidas preventivas. De fato, o documento de identidade de fl. 17 espelhava os dados do documento apresentado pela Sra. Ivani na sindicância, sendo os prepostos experientes como relatado. Não obstante, é mister que o Sr. Notário e seus prepostos permaneçam vigilantes, treinando-se estes para evitar que fatos assemelhados se repitam. Em vista dos indícios de falsidade na abertura da ficha de firma em nome da Sra. (…) que teve como fundamento o documento de identificação em tese forjado, bem como a ocorrência dos consequentes vícios nas procurações públicas posteriormente lavradas, determino o bloqueio do cartão de assinatura e dos atos notariais de fls. 17 e 22/25, vedando-se a expedição de certidões ou traslados sem a autorização desta Corregedoria Permanente, salvo expressa requisição judicial. Deve a interessada submeter eventual pleito à via jurisdicional em relação aos atos que sucederam a lavratura dos atos notariais, pois alheios à atribuição desta Corregedoria Permanente, assegurando-se a ampla defesa e o contraditório aos seus beneficiários. Não obstante a falha narrada nos autos, não há indícios de ilícito funcional por parte do Senhor Delegatário. Aliás, os fatos narrados são anteriores à assunção da Serventia, de modo que sequer poderia responder por eles. De todo modo, consigno que ao ter conhecimento dos fatos, o Sr. (…) Tabelião prontamente tomou as providências necessárias junto aos seus colaboradores e comunicou a esta Corregedoria Permanente, inclusive para o bloqueio dos atos notariais, inexistindo indícios de que a fraude relatada contou com a conivência da Serventia. Todavia, consigno ao Senhor Delegatário que se mantenha rigidamente atento e zeloso na orientação e fiscalização dos prepostos sob sua responsabilidade, inclusive se atentando às medidas de segurança e conferência para abertura de cartões de assinatura e prática de atos notariais, de modo a evitar a repetição de fatos semelhantes, mediante atuação preventiva. Em especial, saliento a importância da consulta ao CCN e a verificação dos QR Codes apostos nos documentos. Outrossim, reputo conveniente a extração de peças de todo o expediente para encaminhamento à d. Autoridade Policial do 27º D.P., (…) (fls. 33/34), em observância ao artigo 40 do Código de Processo Penal. Encaminhe-se cópia integral dos autos à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente sentença como ofício. À míngua de medida correcional a ser instaurada, determino o arquivamento dos autos. Publique-se para conhecimento acerca dos bloqueios dos atos notariais: procurações públicas lavradas no livro 3761, páginas 267/268 e 269/270 e cartão de firmas em nome de (…) , do acervo do (…) Tabelionato de Notas (…) . Ciência ao Senhor Tabelião e ao Ministério Público. P.I.C. (DJe de 25.03.2025 – SP)

Fonte: DJE

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