Descubra como a tokenização de imóveis está revolucionando o mercado global e conheça os desafios e oportunidades para o Direito brasileiro nesse cenário de inovação e transformação digital

Vamos falar sobre uma das inovações mais promissoras do setor imobiliário: a tokenização de imóveis. Por meio de blockchain, estes ativos reais podem ser fracionados em unidades digitais – os tokens – que passam a representar frações de propriedade ou de direitos relacionados ao bem. E, ainda, uma forma de democratizar o acesso ao investimento imobiliário, até então restrito a grandes investidores. Mas, também, aumentar a liquidez e facilitar a negociação.

A legislação vem avançando, no cenário internacional, quanto ao tratamento jurídico da tokenização. Apenas como exemplo, trazemos:

  • Os Estados Unidos, a SEC – Securities and Exchange Commission, já enquadram tokens vinculados a ativos como valores mobiliários, aplicando-lhes a legislação específica de securities.
  • Na União Europeia, com o MiCA – “Markets in Crypto-Assets Regulation”, se estabelece um marco regulatório para ativos criptográficos, ainda que a regulação de tokens atrelados a ativos reais continue sob análise caso a caso.
  • Já a Suíça desponta como um ambiente regulatório muito favorável e é referência mundial nesta regulação. O país reconhece legalmente os tokens como representações digitais de direitos reais ou obrigacionais, permitindo inclusive seu registro em blockchain com efeitos jurídicos.

No Brasil, ainda não temos uma regulamentação específica para a tokenização de imóveis. Mas o tema tem atraído atenção da CVM – Comissão de Valores Mobiliários, do Banco Central e do mercado jurídico-acadêmico. Desde 2022, a CVM vem se concentrando no tema e até publicou o parecer de orientação 40, que reconhece a possibilidade de certos criptoativos serem qualificados como valores mobiliários, dependendo da forma como são estruturados e ofertados.

O parecer 40/22 deixa claro que para a CVM “o token referenciado a ativo pode ou não ser um valor mobiliário e que sua caracterização como tal dependerá da essência econômica dos direitos conferidos a seus titulares, bem como poderá depender da função que assuma ao longo do desempenho do projeto a ele relacionado.”

Então, quando a tokenização de imóveis se transforma em um valor imobiliário?

Quando o imóvel (ou parte dele) é tokenizado e estes tokens serão ofertados ao público com uma promessa de retorno financeiro (este retorno poderá vir em forma de aluguel, valorização do bem, distribuição de lucros ou por exploração imobiliária). Ou seja, essa oferta se assemelha à venda de um valor imobiliário. Então, a competência da CVM se dá, nestes casos, porque o token deixa de ser apenas a representação digital do bem e passa a ser o instrumento de captação pública de um investimento.

Estes são chamados de security token, são ativos digitais que representam valores mobiliários. São instrumentos de investimento, que conferem ao detentor algum tipo de direito econômico.

Mas, também haverá imóveis tokenizados sem qualquer expectativa de lucros à terceiros. Quando o comprador adquire o token apenas para ter a posse fracionada de um imóvel, sem expectativas de rendimentos. Estes casos não se caracterizam como valor mobiliário e a CVM não intervém.

Nestes imóveis não há contrato de investimento coletivo, possui oferta restrita e privada, sem registros ou autorizações da CVM. Seu token representará apenas um direito real ou direito obrigacional privado, com foco regulatório no Direito Civil e imobiliário, não no mercado de capitais.

A tokenização imobiliária ainda enfrenta obstáculos relevantes no ordenamento brasileiro. Quero enumerar apenas alguns dos principais desafios jurídicos:

  • a ausência de previsão legal para o registro de frações tokenizadas em cartórios de registro de imóveis;
  • a segurança jurídica dos contratos inteligentes (smart contracts);
  • na necessidade de padronização dos direitos representados pelos tokens;
  • e, para concluir, a compatibilização com normas de proteção ao consumidor e à prevenção à lavagem de dinheiro.

Continuamos testando modelos inovadores, sobretudo por meio de startups e plataformas que utilizam blockchain para organizar ofertas públicas restritas de frações imobiliárias, com registro em sistemas paralelos ao oficial.

Tokenizar imóveis não é um fenômeno isolado. É parte de uma mudança geral no modo como nos relacionamos com o direito, com o mercado financeiro e com a tecnologia. Advogados, juízes e operadores do Direito deverão adotar postura mais propositiva, crítica e aberta ao diálogo interdisciplinar. Precisamos, não apenas entender a tecnologia, como também propor soluções que busquem segurança jurídica.

Para concluir, a tokenização de imóveis será a forma mais eficiente de registro imobiliário, porque:

  • desburocratiza e ainda resguarda a transparência, segurança e rapidez;
  • reduz custos ao reduzir as despesas cartorárias;
  • facilita a transferência da propriedade, com a simples transferência do token, com registro automático e auditável na blockchain;
  • permite a venda fracionada de imóveis, o que democratiza o acesso ao mercado imobiliário;
  • como integra tecnologias globais, o sistema é compatível com plataformas financeiras digitais e contratos inteligentes (smart contracts), o que agiliza financiamentos, garantias e pagamentos.

Fonte: Migalhas

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