Talvez seja interessante, em termos de proteção e cuidado, pensar em uma forma de RENDA VITALÍCIA em favor de um ente querido. A instituição de uma renda vitalícia por meio de Testamento é um mecanismo jurídico com previsão legal (art. 1.926), plenamente válido e de grande importância no PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO. Trata-se de uma disposição de última vontade através da qual o Testador determina que um beneficiário específico (a quem chamamos de legatário) receba uma quantia periódica (mensal, por exemplo) até o fim da sua vida. Este legado de prestação continuada é uma forma eficaz de garantir o sustento, a moradia ou o bem-estar de uma pessoa querida, como um parente com necessidades especiais, um amigo ou um ex-empregado, assegurando seu amparo financeiro mesmo após o falecimento do autor da herança. Essa é a preocupação de muitas pessoas, que muitas vezes nem têm ideia de que isso possa ser colocado em Testamento.
Para que a renda vitalícia seja materializada o primeiro e indispensável passo é a elaboração de um TESTAMENTO (que pode ser particular mas que, sob a ótica da segurança jurídica, da prática advocatícia e principalmente da nossa expertise extrajudicial, recomendamos seja feito por um TESTAMENTO PÚBLICO, lavrado em um Tabelionato de Notas, com assistência de um Advogado Especialista). Este documento solene, lavrado por Tabelião e duas testemunhas, na forma do art. 1.864 e seguintes do CCB, é o instrumento que confere segurança e validade à disposição. Na cédula, o testador deverá detalhar as condições da renda: o valor exato da prestação ou a forma de seu cálculo (como por exemplo, um percentual sobre os aluguéis de um determinado imóvel), a periodicidade dos pagamentos e quem será o “onerado”, ou seja, quem terá a obrigação de cumprir o legado que ora se institui. A responsabilidade pelo pagamento pode ser atribuída a um determinado herdeiro ou ao Espólio como um todo, que deverá reservar bens suficientes para garantir a renda.
Com o falecimento do Testador, inicia-se o procedimento de inventário para a partilha dos bens. Uma excelente notícia é que, atualmente, a existência de um testamento não obriga mais que o inventário seja judicial. Desde que haja consenso é possível realizar o INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL em Cartório, mesmo com TESTAMENTO VÁLIDO. O procedimento exige uma autorização judicial prévia para a abertura do testamento, mas, uma vez cumprida essa etapa, todo o resto pode ser resolvido de forma muito mais célere e econômica no Tabelionato de Notas – inclusive quando estipulado o legado de renda vitalícia – onde a Escritura de Inventário sacramentará a obrigação de pagamento da renda vitalícia prevista na cédula testamentária.
Diante da complexidade, das consequências de longo prazo e da sua importância – principalmente visando evitar litígios – o planejamento sucessório não deve ser tratado como um mero ato burocrático. A consulta a um Advogado Especialista é fundamental. É este profissional é responsável por conhecer os detalhes do caso, da família e orientar sobre a melhor forma de estruturar o legado da renda, buscando garantir que a vontade do testador seja expressa de forma clara e juridicamente viável, respeitando os limites da legítima e prevenindo futuros conflitos entre os herdeiros e o beneficiário da pensão. Planejar a transmissão patrimonial é lidar com algo previsível e inevitável – como a morte – e a assessoria qualificada é o que garante a paz e a segurança para todos os envolvidos.
Sem prejuízo dos benefícios da via extrajudicial, é importante ressaltar que a via judicial para a solução de Inventários sempre permanecerá à disposição dos interessados. Ela se torna, inclusive, o único caminho possível quando existe LITÍGIO entre os herdeiros. Processos judiciais litigiosos podem se arrastar por anos, o que, no passado, deixava o beneficiário da renda em uma situação de grande vulnerabilidade, pois precisaria aguardar o fim do processo para começar a receber os pagamentos.
Felizmente, um recente e importante precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trouxe uma solução para este problema. A Corte Superior passou a admitir que, em inventários judiciais, o beneficiário da renda vitalícia possa requerer ao juiz o PAGAMENTO IMEDIATO DAS PRESTAÇÕES, em caráter de tutela de urgência. Isso significa que, mesmo que os herdeiros estejam em conflito, o juiz pode determinar que o Espólio comece a pagar a pensão ao legatário desde o início do processo, garantindo seu sustento e protegendo-o da morosidade da Justiça. Nesse sentido, decisão da relatoria da Ilustre Ministra Nancy Andrighi:
“REsp 2.163.919/PR. J. em 13/05/2025. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVENTÁRIO. (…) LEGADO DE RENDA VITALÍCIA. TERMO INICIAL PARA EXIGIBILIDADE DO PAGAMENTO. ARTS. 1.923 E 1.926 DO CC. DATA DA ABERTURA DA SUCESSÃO. (…) 2. O propósito recursal consiste em decidir se é possível exigir, aos herdeiros instituídos pelo testador, o pagamento de legado de renda vitalícia desde a abertura da sucessão, independentemente de conclusão do inventário. (…) 4. É prerrogativa do testador a eleição pelo termo inicial do pagamento do legado de renda vitalícia. No seu silêncio, considerar-se-á o seu início a data da abertura da sucessão, nos termos do art. 1.926 do CC. 5. Em regra, caberá ao legatário pedir aos herdeiros o legado após o julgamento da partilha. No entanto, o legatário de renda vitalícia não pode ficar à mercê do encerramento do inventário, considerada a costumeira morosidade e litigiosidade características desses processos. 6. A interpretação sistemática do instituto do legado de renda vitalícia, dada sua natureza assistencial aproximada ao legado de alimentos, permite concluir que o cumprimento do encargo caberá ao onerado desde o falecimento do testador, na proporção de seu quinhão hereditário, independentemente de conclusão do processo de inventário. (…) 10. Recurso especial conhecido e provido, para o fim de determinar o imediato restabelecimento do pagamento das prestações mensais de legado vitalício à viúva, devidas desde o falecimento do testador, devendo referidas parcelas ser pagas pelas herdeiras nos termos como instituídos no testamento, independentemente de conclusão do inventário. (…)”
Em conclusão, a renda vitalícia testamentária é uma ferramenta muito interessante, poderosa e flexível. Pode ser planejada e executada de forma ágil pela via extrajudicial em cenários de CONSENSO, ou ter sua eficácia garantida pela via judicial, quando o cenário for LITIGIOSO ou mesmo por pura opção dos interessados. Em qualquer dos cenários, a figura do Advogado Especialista é o pilar que assegura que a última vontade do testador seja cumprida com segurança, eficiência e, acima de tudo, justiça.
Fonte: Julio Martins


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