Investimentos em fornos elétricos e captura de carbono contrastam com riscos econômicos da transição energética

Executivos do setor siderúrgico apontam o custo elevado como o principal obstáculo para a descarbonização da atividade, que de acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA) responde por cerca de 9% das emissões globais de CO2. Estimativas da IEA, da World Steel Association e da McKinsey apontam que descarbonizar uma única usina siderúrgica pode exigir entre US$ 1 bilhão e US$ 2 bilhões em investimentos.

No Brasil, como o setor já parte de uma base relativamente menos poluente, graças ao uso de carvão vegetal renovável e à matriz elétrica majoritariamente limpa, seriam necessários investimentos totais da ordem de US$ 1,3 trilhão, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Mas eles esbarram em crédito. “Como financiar esse movimento em um país onde os juros são de 15%?”, questionou Roberto Muniz, diretor de relações institucionais da entidade, durante o Congresso Aço Brasil, realizado no fim de agosto em São Paulo.

O setor avalia que são necessárias políticas públicas robustas, crédito e coordenação entre indústria, academia e governo. Ainda assim, há riscos como o de perda de competitividade devido ao encarecimento da produção. “Na Europa, o mercado de carbono reduziu emissões, mas ao custo do fechamento de fábricas e da perda de 35 mil empregos”, afirmou Titus Schaar, CEO da Ternium Brasil e conselheiro do Instituto Aço Brasil.

Estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) aponta que o Brasil precisa ampliar os incentivos financeiros e institucionais para acompanhar os principais mercados. A produção de aço com carvão mineral ainda responde por 70% da oferta global, gerando 2,32 toneladas de CO2 por tonelada de aço bruto. Já o uso de carvão vegetal e sucata reduz esse número para 0,7 e 0,4 tonelada, respectivamente. Fornos elétricos movidos a hidrogênio verde (H2 V) podem chegar a metade disso.

Entretanto, mesmo na Europa, onde há regulação e subsídios, projetos de descarbonização enfrentam dificuldades, lembrou, no congresso, o economista Germano Mendes de Paula, da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Ele citou o caso de uma siderúrgica alemã que investiu € 2,3 bilhões e recebeu € 1 bilhão em subsídios, mas reduziu apenas 30% das emissões, como um exemplo emblemático. “O valor de capitalização da empresa é de € 1,36 bilhões. Ou seja, o que o governo deu é praticamente o que ela vale no mercado”.

Além disso, subsídios para outros segmentos penalizam a siderurgia nacional e limitam investimentos, na avaliação de Paulo Pedrosa, presidente executivo da Associação Brasileira de Consumidores de Energia Elétrica (Abrace), que critica as facilidades para a importação de painéis solares e carros elétricos. “Não geramos emprego, não usamos aço, vidro ou plástico brasileiros e ainda criamos distorções que exigem energia de térmicas caras”, afirmou.

Para o deputado federal Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), é possível criar demanda para produção sustentável a partir de certificações confiáveis, acordos internacionais e políticas de financiamento verde. Porém, “sem crédito acessível, a transição não acontecerá”, disse. Rollemberg, que citou ainda a aprovação da Política Nacional do Hidrogênio, da regulação do mercado de carbono e do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões.

A indústria siderúrgica brasileira assumiu compromissos alinhados às metas globais de reduzir emissões em 10% até 2030 e alcançar a neutralidade de carbono até 2050. A transição envolve tecnologias como fornos elétricos a arco – capazes de reduzir as emissões em até 60%, segundo a Deloitte -, sistemas de captura e armazenamento de carbono e, sobretudo, o H2 V, em estudo.

Algumas empresas já avançam nesse sentido. A Aperam South America, por exemplo, opera altos-fornos exclusivamente com carvão vegetal desde 2011 e utiliza energia 98% renovável. A empresa investe em bio-óleo e planeja migrar do hidrogênio cinza para o verde. Outras iniciativas incluem o uso de sucata metálica e práticas de reciclagem, além de fornos elétricos. A impressão 3D também começa a ser explorada para reduzir desperdícios.

Fonte: Valor Econômico

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