Associações da família esclarecem os efeitos negativos que o divórcio unilateral pode trazer para a sociedade
 
Em maio deste ano, o TJ/PE aprovou provimento regulamentando o “divórcio unilateral”. A iniciativa, vista como pioneira e positiva para algumas pessoas sob o argumento de desburocratizar o divórcio, foi encarada como um ato ilegal por outras.
 
No debate, quem deu a palavra final foi o CNJ: pouco tempo depois, o ministro Humberto Martins determinou a revogação do provimento e expediu recomendação a todos os TJs do país para que se abstivessem de editar atos normativos no mesmo sentido.
 
Divórcio unilateral… o que é?
 
Também chamado de “divórcio impositivo”, este tipo de desenlace é uma forma administrativa de se formalizar o fim do casamento, quando há consenso entre o casal e quando não há filhos. Nesse caso, as dissoluções poderiam ser realizadas por somente um dos cônjuges, sem que fosse necessária a presença de ambas as partes no cartório.
 
De acordo com os tribunais que tentaram regulamentar esse procedimento, a CF afasta a exigência de quaisquer outros requisitos – objetivos ou subjetivos – para a decretação do divórcio, ou seja, sem restrições temporais ou causais, tornando-o sempre direto e imotivado; o que acarreta, “de forma iniludível e inexorável, a dispensabilidade de sua judicialização”.
 
Casamento não é mercadoria
 
A ADFAS – Associação de Direito de Família e das Sucessões tem outra visão sobre o provimento. A entidade é uma das que requereram no CNJ a revogação da norma. Para a associação, estas regulamentações pretenderam transformar o casamento em um mero contrato de consumo.
 
“Aliás, menos do que isto, porque quando há defeito na mercadoria, o Código de Defesa do Consumidor dá chance ao fornecedor de serviços ou de produtos de se defender”, afirmou Regina Beatriz Tavares da Silva, presidente Nacional da ADFAS.
 
A presidente explica que as iniciativas são ilegais, já que não é dado ao Judiciário o poder de legislar. A associação esclarece que o casamento é um processo solene que gera consequências jurídicas, não podendo ser admitido um desfeito numa penada unilateral e meramente cartorária.
 
“Como você se sentiria ao chegar em casa e saber que seu cônjuge foi ao cartório onde se casaram e “decretou” que você é agora divorciado(a)? Que seu cônjuge, por vontade unilateral, alterou o seu estado civil sem que lhe tivesse sido dada sequer a oportunidade de conversar a respeito? Pense nisso. Estamos falando de famílias. De casamento.”
 
Ao Migalhas, Regina da Silva explica quais as consequências maléficas que o divórcio impositivo traz para a sociedade. Clique aqui e assista.
 
Outra instituição que se posicionou contra o divórcio unilateral foi o Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam ), também interessado no processo no CNJ.
 
Bem-intencionado, mas…
 
Para Priscila Agapito, presidente da Comissão Notarial e Registral do Ibdfam, o provimento foi bem-intencionado, no entanto, atropelou pilares legais, “não podendo prosperar sem os indispensáveis ajustes”.
 
Apesar de concordar ser o divórcio um direito potestativo (ou seja, aquele que não admite contestações), a presidente enfatiza que a lei só prevê duas maneiras de se alcançá-lo: ou optativamente por escritura pública, se ambos os cônjuges estiverem de acordo, ou obrigatoriamente pela via judicial, se houver pretensão resistida.
 
“É imprescindível manterem-se as bases sólidas de cada instituição, para que não se fragilize a atuação de cada ente estatal, bem como a segurança jurídica social como um todo. A normal atual já é mais que suficiente para desburocratizar os procedimentos de divórcio, tanto que em 11 anos de sua existência, mais de dois milhões de processos deixaram de ser impetrados, com economia ao Erário de estimadamente dois bilhões de reais. Toda a sociedade já se acostumou com o papel do notário e do advogado na sistemática atual, modificar isso, sem base legal, poderia afetar uma estrutura já fortemente edificada”.
 
Processo: 0003601-77.2019.2.00.0000 e 0003491-78.2019.2.00.0000