Se há cláusula contratual estabelecendo uma cidade de outro país como local da arbitragem e determinando o uso de idioma estrangeiro no processo arbitral, a sentença arbitral é considerada estrangeira, independentemente da nacionalidade dos árbitros e do local onde proferiram seus votos.

 

Este foi o entendimento adotado pela 21ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro ao reconhecer a incompetência da Justiça brasileira para julgar uma ação que pedia a anulação de uma sentença arbitral proferida por um tribunal arbitral de Londres. O processo foi extinto sem resolução de mérito.

 

O contrato previa a capital britânica como local de arbitragem, o inglês como o idioma a ser usado no procedimento e o Tribunal de Arbitragem Internacional de Londres (LCIA) como instituição responsável por administrar a arbitragem.

 

A sentença arbitral condenou uma das rés a pagar cerca de R$ 44 milhões à autora. A empresa derrotada ajuizou a ação anulatória na Justiça fluminense para pedir a suspensão da sentença arbitral e a reabertura da arbitragem.

 

A autora da ação judicial argumentou que todos os serviços do procedimento arbitral foram feitos e faturados no Brasil antes de serem enviados ao LCIA. Por isso, defendeu a competência da Justiça brasileira para analisar a ação.

 

Já uma outra empresa, que também era ré no procedimento arbitral mas não foi condenada, pediu a extinção do processo judicial, com o argumento de que o Judiciário brasileiro não tem competência para analisar o pedido de anulação.

 

A empresa argumentou que a sentença arbitral era estrangeira. Por isso, apontou que, no Brasil, a decisão do tribunal arbitral só poderia ser submetida ao Superior Tribunal de Justiça para homologação, de forma a possibilitar seu cumprimento em território nacional.

 

Já a ré da ação judicial (autora do procedimento arbitral) lembrou que não havia qualquer cidade brasileira designada no contrato.

 

Em primeira instância, a ação judicial foi extinta sem exame do mérito. O Juízo de primeiro grau ressaltou que todos os documentos estavam em inglês, destacou que a escolha de um tribunal arbitral de Londres produz uma sentença estrangeira e explicou que não é válida uma ação anulatória contra um documento do tipo.

 

Em seguida, a autora recorreu ao TJ-RJ e apontou que a sentença arbitral não indicou o local onde foi proferida, mas apenas a sede da arbitragem (Londres).

 

O desembargador Fábio Uchôa Pinto de Miranda Montenegro, relator do caso, explicou que os árbitros não poderiam proferir a sentença em um local diferente daquele estabelecido no termo de arbitragem, “sob pena de malferir o princípio da autonomia da vontade”.

 

Apesar da falta de indicação do local onde a sentença foi proferida, Montenegro explicou que há “presunção absoluta de se tratar de sentença estrangeira”, pois as partes convencionaram que a arbitragem seria em Londres.

 

Para ele, mesmo se os votos tivessem sido elaborados no Brasil (onde os árbitros moravam) e mais tarde encaminhados a Londres, a nacionalidade da sentença arbitral ainda seria inglesa. Isso porque as manifestações “não produzem qualquer efeito jurídico, senão depois de publicada pelo respectivo tribunal arbitral”.

 

Assim, os documentos apresentados pela autora para comprovar o local onde os árbitros estavam ao proferirem a sentença “são irrelevantes para se aferir a nacionalidade da sentença arbitral impugnada”.

 

O relator ainda explicou que a sentença arbitral estrangeira não tem eficácia no Brasil enquanto não homologada pelo STJ. Por isso, a ação que busca anular tal sentença “não guarda qualquer coerência com as regras jurídicas que cercam nosso sistema de Direito” e a Justiça brasileira não tem jurisdição para julgá-la.

 

Clique aqui para ler o acórdão

Processo 0158867-88.2020.8.19.0001

 

Fonte: Conjur

Deixe um comentário