Todos já passamos ou vivenciamos alguns conflitos gerados a partir da problemática do direito da herança, de quem é esse direito?
Nas primícias da civilização, o modo de vida e as relações de parentesco eram compartilhadas. Para se conseguir um alimento, os mais habilidosos saíam para a caça e, ao retornar, o alimento era dividido para todos os membros. A estrutura era coletiva e, com isso, as posses e as terras tinham essa característica de pertencer a todos, pois todos permaneciam no mesmo núcleo familiar.
Com o passar o tempo, o conceito de propriedade ganhou uma característica individual.
O modo de viver e os interesses mudaram e, isso impactou a estrutura da sociedade, começamos a delimitar a propriedade. O lar passou a ter uma natureza privada, e com isso, podemos dizer que surgiram os direitos relacionados a essas posses.
Direitos que estão disciplinados respectivamente nos incisos XXII e XXX do art. 5.º da nossa Constituição Federal: direito à propriedade e direito à herança.
Uma das características da propriedade é o seu caráter perpétuo.
Conforme os artigos 6.º e 1784 do Código Civil, a existência da pessoa natural termina com a morte e, nesse momento, abre-se a sucessão de modo que a herança transmite-se, instantaneamente, aos herdeiros legítimos e testamentários, ainda que eles não saibam.
Numa estrutura normal de família, a perda de um ente querido é um momento muito difícil. E quando há bens, por causa dos prazos que existem temos que dar andamento em processos de herança, partilha de bens, inventários.
O processo de herança pode se tornar mais demorado quando não há testamento. Essa disputa pode se arrastar um pouco mais se o valor do patrimônio for considerável.
Mesmo quando há testamento tem processos que perduram por anos devido a vários conflitos de interesses entre os membros da família e possíveis interessados.
Vou citar alguns casos no nosso País:
– O apresentador Gugu Liberato deixou seu patrimônio para os filhos e sobrinhos, mas Rose Miriam Di Matteo tenta comprovar uma união estável; Thiago Salvático afirma ter vivido 8 anos com o artista. O apresentador morreu no final de 2019 e essa disputa aparenta estar longe do fim.
– A herança de Agnaldo Timóteo gera confusão em família: A família do artista entrou em discussão sobre os bens que o cantor teria deixado para a filha, a adolescente que é adotiva Keyty Evelyn, de 14 anos, e recebeu 50% dos bens do cantor.
Ressalte-se que é um caso recente. O cantor Agnaldo morreu no dia 3/4/21, tendo como motivo da morte: complicações da covid-19.
Em nossas famílias, com mais ou menos posses, já passamos por isso, ou vivenciamos alguns conflitos gerados a partir da problemática do direito da herança, de quem é esse direito? Pelas minhas observações e experiências essa lide é resolvida, na maioria das vezes, na esfera judicial.
Na existência de um testamento seria muito mais fácil respeitar a vontade do falecido e, mesmo na falta deste instrumento, poderíamos reconhecer a vontade do finado.
Pois bem, não quero entrar no mérito de quem tem razão nos dois casos citados acima, mas quero iniciar uma reflexão.
Diante do momento de pandemia que estamos vivendo, num cenário incerto com tantas inseguranças, não será o momento de revermos os nossos conceitos?
Tendo em vista a problemática da herança, será que, até que tenhamos um veredicto, estaremos vivos para usufruirmos desse direito? Se não, o mesmo será disputado por outra pessoa? Ou na falta de herdeiros, os bens irão para o governo?
Pois bem, no mês passado, na cidade de Miguelópolis uma família inteira foi devastada pela covid-19, tudo isso ocorreu em um período de 11 dias. A primeira vítima da família foi um dos filhos (43 anos). Três dias depois, seu irmão (48 anos). Com apenas um dia de diferença, o pai (69 anos). Logo em seguida foi a vez da mãe (67 anos).
Imaginemos se um desses integrantes tivesse ingressado na justiça com o processo de herança, será que o processo seria finalizado? Com certeza, não. Pelo curto período de tempo que ocorreu toda essa tragédia, acredito que o processo nem teria sido autuado.
No meu ponto de vista, já que não batalhamos para a construção do bem, e vamos recebê-lo literalmente como “um presente”. Temos que fazer uso do nosso direito previsto nas leis específicas respeitando acima de tudo a vontade do nosso ente querido.