A pandemia da Covid-19 trouxe a reflexão sobre a finitude da vida, assunto até então evitado pelos brasileiros que, culturalmente, estão desacostumados a lidar com a morte.
Com isso, passou a ser frequente a lavratura de escritura de Testamento Vital, que nada mais é do que um documento que estabelece as formas em que o paciente estipula o tratamento que deseja receber para o prolongamento (ou não) da vida, excluindo, especialmente, os que considera invasivos.
Em diversos países já se tem inclusive legislação sobre o tema, mas embora no Brasil ainda não tenha, a demanda por Testamentos Vitais aumentou muito com a pandemia, ou seja, de 2020 para cá.
Isto porque tornou-se necessário, para não dizer indispensável, estabelecermos uma forma digna e condizente com a autonomia da vontade de quem está prestes a morrer. e que seja compatível com o princípio da dignidade humana.
Neste caminho, a Medicina e o Direito se encontraram, já que os cuidados paliativos se tornaram indispensáveis para que essa equação atendesse a ambos os interesses: promover “a qualidade da morte”, ou evitar o prolongamento artificial da vida dos pacientes e o sofrimento de seus familiares, por meio de prevenção e alívio do sofrimento dos mesmos.
A frase “faça tudo o que tiver que fazer”, dita muitas vezes para os médicos, foi mitigada na medida em que ao paciente cabe a escolha de morrer da forma que considera digna. Para isso, é nomeado um procurador de saúde que, na ausência de discernimento e capacidade de decisão do paciente, é quem por ele decide.
Neste diapasão, algumas cláusulas podem ser estabelecidas, como, por exemplo, as relativas aos cuidados proporcionais ao final da vida, onde o paciente estabelece quais são os procedimentos que considera indispensáveis e que não prolongariam a sua existência em detrimento da qualidade de sua vida.
É importante ressaltar que tais disposições são consideradas ortotanásia – ou seja, o não prolongamento artificial do processo natural de morte, o que não se confunde com eutanásia, que constitui crime no Brasil, já que não é considerada uma morte natural.
Visando regulamentar a questão, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou a Resolução 1.995/2012, intitulada “diretivas antecipadas de vontade” ou “testamento vital” do paciente acometido de doença em estado terminal de vida, apenas em relação à ortotásia, ou seja, morte natural. Isso significa afirmar que o paciente terá respeitada a sua vontade que, repita-se, poderá ser exercida através de um procurador de saúde.
Portanto, estabelecer diretrizes antecipadas de vontade não fere nenhum artigo da legislação brasileira e proporciona ao paciente o prolongamento artificial da vida até onde o mesmo considerar necessário e vital, sendo certo que tal fato, repita-se, não se caracterize como eutanásia.