Os anúncios para venda de pequenas chácaras de lazer são os mais variados possíveis. Quem vende, é sempre muito criativo e geralmente promete pequenos pedaços do paraíso. Na realidade são pequenos, mesmo. Eles têm, no máximo 2,5 mil metros quadrados e nenhuma estrutura restante. Ainda assim, são tratados como chácaras e uma curiosidade chama atenção. A grande maioria é vendida com entrada de apenas 40% à vista, com saldo devedor parcelado em até 120 meses.
 
O que muitos compradores desconhecem é a legislação, orientada pelo Código Florestal Brasileiro. A lei estabelece, por exemplo, que cada propriedade precisa ter pelo menos 20% de sua área, destinada para reserva legal. Além dessa reserva o proprietário é obrigado a manter intocável uma faixa mínima de 30 metros de margem nos riachos e córregos que possuam até 10 metros de largura. As áreas de nascentes, banhados e lagoas também precisam ser preservadas sem intervenção em um raio de 50 metros.
 
O que ocorre, entretanto, é que diversos proprietários, principalmente especuladores imobiliários, desmembram o imóvel principal e vendem justamente a parte intocável da propriedade. Esses espaços “proibidos” encontram alvo fácil em compradores de classe média/baixa, sedentos por um lugar com bastante área verde e muita água.
 
A maioria dos interessados dá preferência por locais com riachos próximos e, sem saber, participam de um negócio bastante nebuloso. Pouca gente sabe, por exemplo, que o prazo longo para pagamento é dado pelos vendedores justamente para burlar a lei, e evitar cobranças do comprador. É que, caso pagasse a vista, o comprador passaria a exigir escritura imediata do imóvel. Com esse prazo longo tudo o que o comprador consegue não passa de um contrato de compra e venda.
 
Nossa equipe se fez passar como alguém interessado em vender uma área. Conversou com um suposto corretor imobiliário que passou a explicar detalhes.  Ele contou, em condição de anonimato que os “loteadores”, pegam o dinheiro da entrada, que é o que vale o valor integral do imóvel, e parcelam o restante a longo prazo.  “Tem gente que vende dois mil metros na barranca do riacho por 120 mil reais. Eles pegam R$ 50 mil de entrada, fazem um contrato e deixam o restante pendente justamente porque não podem oferecer a escritura. Assim eles ganham 10 ou 12 anos sem compromisso nenhum e passam o problema adiante”, explicou.
 
“Com essa entrada de R$ 50 mil eles conseguem vender um alqueire de terra na barranca de um riacho por até R$ 600 mil. É um grande negócio. Nessa mesma região a área mecanizada, altamente produtiva, está sendo vendida por cerca de R$ 350 mil”.
 
A reportagem procurou a chefia do escritório regional do Instituto Água e Terra (IAT), em Cascavel, responsável por operacionalizar licenças ambientais. Foi lá que confirmamos a expedição de um grande número multas por irregularidades. Marlise da Cruz, chefe regional do órgão, disse inclusive que em Cascavel há um suposto loteador “campeão de irregularidades”. Ela evitou falar nomes, mas assegurou que o assunto vem sendo tratado com o rigor da lei.
 
Marlise confidenciou que o órgão está preparando um dossiê e disse que nos próximos dias esse documento será entregue ao Ministério Público. O documento, segundo ela, contém fotos de fiscalizações feitas nos municípios atendidos pelo escritório regional de Cascavel. Além disso, a equipe de fiscalização do IAT tem trabalhado de forma intensa para impedir que o crime continue a ser praticado.
 
Marlise diz que os Municípios precisam agir com rigor, estabelecer critérios para a abertura de loteamentos rurais; definir critérios com regras claras e fiscalizar o cumprimento dessas regras. Ela disse, por outro lado, que a parte de reserva legal de uma propriedade pode sim ser vendida, mas há regras. Esclareceu que na reserva permanente, que é aquela faixa de proteção às margens dos riachos, não pode haver nenhuma intervenção humana, ou seja, é intocável.