No Brasil, em razão do implemento de políticas financiadas pelo sistema   governamental, milhares são os imóveis cujas construções foram realizadas com recursos de programas de habitação, e que se encontram vinculados à atuação de entidades paraestatais, tal como ocorre com a Caixa Econômica Federal. A discussão é se tais bens, quando abandonados pela entidade paraestatal, podem ser objeto de usucapião pelos particulares, eis que o Código Civil estabelece que a posse com a intenção de dono associada ao tempo de exercício – mansa, pacífica e ininterrupta – traduzem os requisitos para a aquisição da propriedade por usucapião. É sabido que os bens públicos, por possuírem o atributo da imprescritibilidade, qualquer que seja a sua finalidade, não podem ser usucapidos, nos termos do art. 183, §3º, da Constituição Federal, do art. 102 do Código Civil e da Súmula 340 do STF.
 
Bens públicos, em sentido amplo, são todas as coisas, corpóreas e incorpóreas, imóveis, móveis e semoventes, créditos, direitos e ações, que pertençam, a qualquer título, às entidades estatais, autárquicas, fundacionais e paraestatais. Os bens das entidades paraestatais (empresas públicas, sociedades de economia mista, serviços autônomos, etc) são também bens públicos com destinação especial e administração particular das instituições que foram transferidos para consecução de fins estatutários, em razão da preponderância dos princípios do interesse público e da continuidade dos serviços (cf. Benedito S. Ribeiro. Tratado de Usucapião. 6ª ed., São Paulo: RT, 2008, p. 541).
 
Levando-se em conta o caráter público dos recursos utilizados no SFH, possuem natureza pública os bens imóveis adquiridos com tais recursos, de sorte que o imóvel vinculado ao SFH deve ser tratado como equiparável a bem público (AgInt no REsp 1.700.681, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva). A Caixa, ao atuar como agente financeiro dos programas oficiais da habilitação e órgão de execução da política habitacional, explora serviço público, de relevante função social, a teor do art. 2º, inc. III, da Lei 4.380/1964 e do art. 2º, alínea “c”, do Decreto-lei 759/1969. Do contrário, caso se admita a hipótese de aquisição por usucapião de imóveis financiados com recursos do SFH, seria em tese possível o ocupante de imóvel financiado adquirir a propriedade, sem ter de adimplir o financiamento imobiliário, após o transcurso do prazo previsto em lei, o que ocasionaria irreparável prejuízo financeiro e social para o sistema público habitacional (RE 1.328.428, rel. Min. Luiz Fux).
 
Nem mesmo a eventual constatação de que teria havido abandono do bem serviria como fundamente para subsidiar o pedido de usucapião. É que o abandono de bem público não é hipótese que gera a extinção da propriedade pública, diferentemente do que ocorre com a propriedade privada em geral (REsp 1.874.632, rel. Min. Nancy Andrighi). De outro lado, sendo considerado por equiparação bem público, a sua ocupação realizada por particular não é, a rigor, tida sequer como posse, configurando mera detenção que é inapropriada também para fins de usucapião, sendo, ainda, inadmissível pedido de proteção de posse contra órgão público.
 
A rigor, os imóveis públicos, mesmo quando desocupados, possuem finalidade de atender eventuais necessidades da administração pública ou de poderem realizar planejamento urbano ou reforma agrária. Portanto, os negócios jurídicos de compra e venda de imóvel e de mútuo celebrados por tais agentes financeiros no âmbito do SFH apenas geram o direito à aquisição da propriedade imobiliária, quando se opera a quitação do preço/financiamento, não sendo o procedimento de usucapião via adequada para a aquisição da propriedade pelos ocupantes.